A sala preenchida por troféus se projetava na minha frente. Um vidro que ia do mármore ao teto exibia todos eles. Dourados, pratas, acadêmicos, olímpicos, antigos e recentes. Uma quantidade que nem se minha escola começasse a implementar o modelo esportivo russo conseguiria alcançar.
Era impressionante, mas assim... O que eu tinha a ver com isso?
— Legal — falei, ainda encarando o vidro com os prêmios, ao lado de Mencia, que fazia o mesmo. — Mas, afinal, o que nós estamos fazendo aqui?
— Pesquisa de campo.
— Pesquisa de campo?
— É, pesquisa de campo. — Ela se virou na minha direção.
— E o que a gente está pesquisando? — indaguei, confusa.
Mencia estreitou a visão sobre mim, em um sorriso que exalava encrenca.
— Eva Sades — Ela quase dobrava a língua, tamanha eloquência que anunciava meu nome.
— Eu sou a pesquisa de campo?! — exclamei, perplexa.
— Corretíssimo. — Ela deu um sorriso cínico, por trás da prancheta que só agora eu percebi que ela segurava. E então, ajustou a postura, tentando mostrar seriedade.
— Eu tenho certeza que não é assim que funciona uma pesquisa de campo — ponderei.
— Não é você quem faz as perguntas. — disse. O cenho franzido, enquanto tamborilava a caneta na folha que não deixava eu espiar.
— Não foi uma pergunta. Foi uma constatação.
— Não é você quem faz as constatações. — Ela deu um toque com a ponta da caneta no meu nariz. A língua atrás dos dentes, emoldurando um sorriso.
Eu inevitavelmente revirei os olhos.
Em que momento ela aprendeu a ser tão irritante?
— Primeira pergunta. — Ela limpou a garganta. — Quem foi sua primeira obsessão platônica?
— A prima tatuada da Melina.
— E no cinema?
— Alice Braga.
— Desde quando?
— Cidade Baixa.
— A que ela faz a prostituta?! — Mencia ria.
— É... — assenti. — Que tipo de pesquisa de campo é essa?
— A minha. — Ela dava de ombros. — Qual seu livro favorito?
— O Sedutor do Sertão. E o seu?
— Todos.
— Impossível.
— Por que você foi embora do hospital quando eu te pedi para ficar? — indagou. Os olhos nos meus.
— Porque... — Eu sentia como se tivesse engolido todas as palavras. Uma sopa de letrinhas boiando no ácido estomacal. Tosco e humano. — Eu... — Malditas letras incapazes de formarem palavras. — É... que eu achei que se eu fosse embora, você não conseguiria fazer isso.
Ela suspirou.
— Eu não vou embora, Eva Sades.
— Promete? — Eu quase suplicava.
— Prometo.
Ninguém pode prometer algo assim.
Mas eu nem me importava.
— Última pergunta — Mencia disse. — O quanto você está animada para o show da Lena?
— Meu Deus! — exclamei com a mão na testa. — É hoje?!
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Sáfico | Cartas de Amor
RomanceEva Sades vive em plena monotonia na cidade de Vicência - o lugar onde nada acontece. Até que, para sua supresa, após décadas longe de Vicência, o circo Épicus decide retornar a cidade, agitando todos os moradores, que cresceram aos contos dos espe...