Reencontro

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O caminho foi tranquilo, até não ser mais. O uber foi até certo pedaço, dizendo que dali em diante o "padrinho" não permitia a circulação de uber, só de moto-táxi. QUEM ERA PADRINHO?!

Tentando passar por cima da minha própria frustação, agradeço e dou bom dia ao motorista, saindo do carro. Comecei a andar rua acima, passando por motoqueiros que ofereciam o seu trabalho de transporte e eu gentilmente negava. Não tinha cabimento eu subir numa moto usando a roupa que eu usava.

Fui abordada por um senhor usando uma camiseta social branca de manga curta que marcava sua barriga protusa. Muito gentil, ofereceu me levar até onde eu estava indo, dizendo que era melhor andar acompanhada quando não se sabia exatamente para onde ia. Aceitei, claro.  Andamos por algum tempo, conversamos sobre coisas básicas, descobri que seu nome era João e ele trabalhava com turismo ali. Quando chegamos ao grande prédio que eu imaginava que o meu novo trabalho estaria localizado, vi uma construção alta, com azulejos azuis e "CMS Dr. Albert Sabin" em letras grandes e prateadas sob a parede. Agradeci Seu João e após um tempo preenchido por um silêncio constrangedor, percebi que ele esperava um pagamento. No fim, ele não estava sendo apenas gentil. Ele estava trabalhando.

Me dirigi diretamente ao balcão da recepção para falar com a recepcionista que estava do outro lado do vidro, atrás do computador.

- Oi! É... Eu sou a Rafaela...

- Prazer, Rafaela. Pode pegar uma fichinha ali. - Ela respondeu de maneira desinteressada, sem tirar os olhos da tela do computador.

- Não! É... Eu sou a nova médica. - Dei um sorriso amarelo. Era constrangedor demais chegar em um lugar e ter que se apresentar dessa forma, dando carteirada, para quem já era da casa.

- Ah! Sim, sim. - Ela olhou pra mim pela primeira vez, olhando para o meu rosto, em seguida para o meu vestido e depois para o casaco fino que cobria meus braços, mesmo nesse calor.- Pode entrar ali naquela portinha. A sala da coordenadora é no final desse corredor, virando a direita. - Ela se referia à porta que separava a recepção do restante dos corredores.

- Obrigada. - Sorri gentilmente, dessa vez sem nenhum constrangimento.

Andei despretensiosamente pela unidade, vendo as portas, vendo a equipe trabalhando, vendo os pacientes... Eu podia quase me sentir em casa, por mais estranho que isso soasse. Quando cheguei na sala da coordenadora, que estava aberta, dei três batidinhas na porta para "anunciar" minha chegada à senhora que ali estava.

- Olá! Com lincença...

- Entra meu amor! No que posso te ajudar? - Disse a senhora com uma voz doce e entusiasmada, mas sem olhar pra mim. Aparentemente eles tinham esse costume de continuar trabalhando enquanto falavam com você.

A senhorinha que usava um óculos reto, fino e baixinho, era de uma doçura quase palpável. Seu cabelo com gel preso em um rabo de cavalo baixo que pela curvatura de seu cabelo se assemelhava à um coque, demonstrava o quanto ela se cuidava. Suas unhas que teclavam sem parar estavam curtinhas, bem pintadas. Em seu rosto, o vermelho de seu batom contrastava com o tom de pele escuro que ela tinha. Por mais velha que pudesse ser, a melatonina conservava a sua jovialidade, aparentando não ter mais que 50 anos, mesmo que suas roupas lembrassem as roupas que minha vó usava, por baixo de seu jaleco.

- Eu sou a nova médica da unidade, fui transferida do HPM... - Eu não sabia quantas vezes precisaria repetir isso hoje, então resolvi encurtar a história.

Sob a Farda, o Caos.Onde histórias criam vida. Descubra agora