Jantar

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POV: Rafaela Valença

Quinta-feira, Florianópolis.

Ataliba é um restaurante que desde criança frequento com meus pais. Foi lá que eu aprendi a comer javali com geléia de amora e carne de coelho (que minha mãe sempre me enganava dizendo que era a carne de outro animal). Quando a Gabriella me ligou pouco antes das 20h dizendo que escolheu este restaurante para nós irmos, senti que Deus estava tentando me falar alguma coisa, tentando me dar um sinal, algo assim.

Dizem que pessoas desesperadas começam a ver sinais em todos os lugares, e cá estou eu.

Já estávamos na estrada quando Gabriella me mandou uma foto de visualização única de uma taça de vinho branco numa mesa vazia. Esse era o modo dela silenciosamente me dizer que estávamos atrasados.

Mas como não estaríamos? O condomínio que os pais dela moram ficava muito próximo do restaurante, provavelmente três minutos de carro.

Roberto chegou na frente do restaurante que, à moda antiga, têm manobristas disponíveis. O homem simpático abriu a porta para mim, me ajudou a descer do carro e depois andou até Roberto, que deu a chave do carro e me encontrou na porta do restaurante.

- Boa noite! Os senhores têm alguma mesa reservada hoje a noite? - Perguntou a recepcionista que nos esperava na porta. Fiquei em silêncio, deixando Roberto responder por mim.

- Já temos uma pessoa nos esperando numa mesa.  - Respondeu ele rapidamente, sem dar a atenção devida à mulher simpática.

Comecei a olhar em volta do lugar luxuoso, cheio de mármore e vidros por toda a parte. Numa mesa distante, quase escondida, vejo o longo cabelo vermelho de Gabriella.

- Qual o nome dela? Ou a mesa? - Perguntou a recepcionista olhando para Roberto, pronta para nos levar até lá.

- Já achei a mesa, obrigada, amada. - Respondi e encerrei o assunto, pegando na mão de Roberto e caminhando, na medida do possível, de forma elegante.

O piso de mármore brilhante parecia escorregadio demais para os meus pés desacostumados a usar salto alto de bico fino.

Gabi, animada, ouviu o som ritmado que meu salto fazia no chão e se virou para nós dois, acenando e sorrindo. Meu coração se enche de alegria toda vez que a vejo desse jeito.

- Oi, meus amores! - Ela disse, animada, se levantando e me abraçando de forma apertada. Será que nos 10 minutos que demoramos para chegar ela já havia conseguido ficar bêbada?

Depois de me soltar, ela deu um beijo contido no rosto de Roberto, que não soube reagir e somente ficou estático. A cena foi cômica.

Eu sorri, observando a interação entre os dois. Gabi parecia ligeiramente mais animada do que o normal, mas talvez fosse só o efeito do reencontro. Ela sempre foi intensa nas emoções, especialmente depois de uma taça de vinho. Roberto, por outro lado, estava visivelmente desconfortável com o beijo contido que recebeu dela, o que me fez rir internamente. Ele parecia tão fora do lugar ali, mesmo estando impecavelmente vestido.

Eu sentei no meio, Roberto sentou a minha direita e Gabi a minha esquerda. A mesa era redonda, com um sofá estofado no lugar de cadeiras. Dei uma olhada ao redor, relembrando os tempos antigos. Ajeitei-me no estofado, a textura macia sob minhas pernas. Tudo ainda era como eu me lembrava: o piano no meio, o lustre impressionante no centro, e aquela música clássica suave que preenchia o ambiente. Era quase como voltar no tempo, exceto que agora, ao invés de estar acompanhada dos meus pais, estava acompanhada das duas pessoas mais importantes na minha vida, no momento.

Sob a Farda, o Caos.Onde histórias criam vida. Descubra agora