Capítulo 10- Mãe

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⚠️ AVISO DE GATILHO: o presente capítulo possui gatilho de intencionalidade suicida⚠️


"Então, segure-me, mamãe, em seus longos braços"
- O superman (Laurie Anderson)

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Foi no início de 1997 que Joaquim gritou pela primeira vez com o filho mais novo. Palavras baixas. Palavras que o garoto nem conseguia entender, mas sabia serem ruins.

José tinha saído mais uma vez de casa. Ele abandonava a pequena residência de três cômodos com cada vez mais frequência.

Aquela seria a primeira vez que Julian descobriria o significado da palavra solidão. Sem poder recorrer aos cuidados de sua mãe e à ajuda do irmão mais velho, Julian deu meia volta e saiu de casa bem a tempo de suas lágrimas caírem. Ouviu seu pai gritando atrás, mas não retornou. Enquanto caminhava pelas ruas mal iluminadas, desejou em seu coração que seu pai tivesse ido no lugar de sua mãe. Quando percebeu no que pensava, refreou sua mente e se deparou novamente com aquele sentimento tão familiar. Culpa. As lágrimas se intensificaram.

Pensou que poderia se juntar a sua mãe. Seria tão fácil. Ele nunca mais precisaria lidar com aqueles pensamentos ruins. Se houvesse um pós morte, poderia passar o resto da eternidade nos braços quentinhos da mulher. Sem dor. Sem sofrimento. Só alívio.

Não percebeu para onde suas pernas o levavam.

Por sorte, apenas Eduardo se encontrava na casa de dois andares. Ele sabia que a mãe do amigo recorria a medicamentos para dormir e o pai estava em uma viagem de trabalho.

"O que aconteceu?", Eduardo perguntou, uma expressão preocupada passando por seus olhos.

Julian abriu a boca para responder, mas nenhum som ousou sair. Ele se inclinou e colocou as mãos sobre os joelhos, cansado. Esgotado. Com um peso acima do que seus quase 13 anos podiam suportar.

"Vem, entra. Vou pegar um copo de água pra você"

Os dois subiram até o quarto do garoto de cabelos castanhos.

"O que aconteceu?"- perguntou outra vez, sentando na cama.

"Eu...", foi a única coisa que conseguiu dizer antes de engasgar. "Eu não sei. Tudo parece muito errado. Parece que só existe dor no mundo. A minha cabeça... minha cabeça tá errada. Eu não sei explicar. Eu não consigo pensar direito", falou, antes de explodir novamente.

A única coisa que Eduardo pôde fazer foi puxá-lo para um abraço. Naquele momento, ele desejou poder ficar ali pra sempre.

"Me desculpa, tá? Eu não queria te deixar preocupado", disse, se separando por um momento do amigo.

"Tá tudo bem, não precisa pedir desculpas"

"Às vezes eu... gostaria de não existir mais"

Eduardo abriu a boca, em choque.

"Não fala uma coisa dessas, nem de brincadeira. Tem muita coisa bonita que você ainda precisa viver. O mundo precisa de você, Julian"

O outro assentiu.

"Eu posso... posso ficar aqui? Hein? Por favor?", perguntou, se engasgando com as lágrimas.

"Claro. Você sempre pode ficar aqui, Julian"

Naquela noite, Julian dormiu ao lado de Eduardo. Acordou pela manhã, antes que o amigo levantasse e foi embora. Em casa, encontrou um pai esperando por ele, arrependido e chorando. Joaquim abraçou o menino, que retribuiu o abraço, acreditando que aquela poderia ser a última vez.

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Se você estiver enfrentando os mesmos pensamentos que Julian, não hesite em contatar o 188 (Centro de Valorização da Vida)

Não é fácil, mas é possível. Você não está só!

O amor tem sabor de amorasOnde histórias criam vida. Descubra agora