𝙲𝚊𝚙í𝚝𝚞𝚕𝚘 𝟸𝟸 ‒ 𝙰 𝚛𝚎𝚌𝚘𝚛𝚍𝚊çã𝚘 𝚍𝚊 𝚐𝚊𝚕𝚒𝚗𝚑𝚊 𝚗𝚘 𝚝𝚛𝚎𝚖

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28 de dezembro de 2021.

Era a mais fria das 4 estações: o inverno, que envolvia o mundo num abraço gélido nunca antes vivenciado por Catupi. Esta estava em um trem, observando pela janela a neve resvalar sobre as plantas coníferas, pintando a paisagem verde-escuro de branco brilhante, e assim envolvendo o chão em um manto reluzente.

Só conseguia pensar a quão grata era por estar aconchegada em um vagão de temperatura agradável, aquecida por sua jaqueta trucker vermelha forrada com sherpa. Com um chocolate quente em mãos e um livro aberto em seu colo, aguardava a chegada ao seu destino: a cidade de Floyd. 

A garota, de cabelos bagunçados e volumosos naquele tempo, trazia consigo uma mochila e uma gaiola com uma galinha, que havia batizado de Frangolina Jolie. Ao olhar para o pulso, percebeu que seu relógio marcava a hora errada.

— Que horas são? — indagou ela a um rapaz desconhecido, sentado no vagão ao lado.

Era Kyoto Ayame, que naquele tempo era ligeiramente rechonchudo como sempre foi quando pequeno; usava uma camisa branca por baixo de um colete, como um jovem rapaz do século passado.

Ele pôs a mão no bolso e de lá tirou um relógio.

— 5 e 55.

A garota abriu um suave sorriso, porque o rapaz tinha um jeito excêntrico que chamou sua atenção.

— Relógio de bolso, sério? Você não é um viajante do tempo, é?

O rapaz exibiu um sorriso tímido, parecendo desconcertado, enquanto endireitou os óculos.

Catupi voltou a ler o livro, mas após alguns segundos, o garoto rompeu o nevoeiro do silêncio, e disse, com seu sotaque britânico que combinava com suas vestes:

— Senhorita, com licença, não pude deixar de notar o livro que está lendo, é sobre...

A garota mostrou a capa do livro, era sobre buracos negros, do físico Stephen Hawking. Um dos poucos livros que ela fez questão de ler em toda sua vida.

— Fascinante! — ele exclamou.

— E você, o que tanto escreve?

— É... — começou ele, olhando para o seu caderno. — Um livro.

— Uou, temos um escritor! Qual gênero?

— Fantasia.

— Parece daora.

Ele balançou a cabeça afirmando e quebrou o contato visual, diferente de Catupi. 

— Boa escrita!

— Boa leitura!

Após cerca de 10 minutos, o rapaz se levantou para ir ao banheiro, mas acabou tropeçando e, desajeitadamente, caiu no chão. Catupi conteve o riso.

— Tudo bem aí?

O momento foi inesperado, mas algo na forma como ele se levantou, meio atrapalhado, com um sorriso envergonhado e um gracioso rubor de embaraço, fez com que Catupi gostasse dele e sentisse uma simpatia imediata.

Mas ela não conseguiu conter uma risada calorosa; não era como se risse dele, era como se risse de um amigo que conhece a anos. 

— Com essa saída memorável nunca vou me esquecer de você. 

Talvez fosse a risada contagiante, talvez o comentário engraçadinho ou a aura aconchegante dela, mas algo fez com que ele gostasse ainda mais daquela pessoa de cabelos bagunçado, mesmo antes dela parar de rir e perguntar se ele havia se machucado.

Intrépida: a relíquia do inventorOnde histórias criam vida. Descubra agora