Roberto Nascimento

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Na manhã daquele dia, levantei cedo como de costume, lavei o rosto, vesti-me e, ao olhar para o cabide no meu quarto, avistei o jaleco que a doutora havia deixado cair. Num impulso, peguei-o e, ao aproximá-lo do rosto, mergulhei no aroma inebriante que apenas ela possuía. Era algo que me cativava profundamente. Decidi levar o jaleco comigo. Já possuía o número dela; faltava apenas coragem para enviar uma mensagem.

Segui minha rotina matinal como de costume; tudo estava em ordem no batalhão. Os recrutas estavam em treinamento, enquanto eu os observava e emitia ordens, mantendo o controle que sempre apreciei. Contudo, algo me inquietava. Entrei na minha sala e avistei o jaleco dela sobre a mesa. Passei os dedos pelos bordados meticulosamente feitos à mão e, num ato impulsivo, enviei uma mensagem. Eram 9h30 da manhã; provavelmente, ela já estaria acordada. Quando recebi a resposta, informando que ela viria ao batalhão buscar o jaleco, meu coração acelerou. Senti-me como um adolescente de 16 anos novamente, completamente atordoado.

Enquanto retornava de um treinamento com os novos recrutas, percebi que um deles, o 23, estava sem a bandoleira. Irado, precisei repreendê-lo de maneira veemente para garantir que fosse mais atento da próxima vez. Nesse momento, avistei-a à distância, com uma expressão que demonstrava clara desaprovação em relação aos meus gritos . Com uma mão apoiada na têmpora e a outra sobre o abdômen, parecia imersa em pensamentos. Ao passar a mão pelos cabelos, fazendo-os cair sobre o rosto, senti meu coração acelerar. "Agora não é o momento para isso", pensei.

Aproximei-me dela com um olhar carregado de desejo. Ela era como uma droga; quanto mais eu tentava esquecê-la, mais ela invadia meus pensamentos. Quando cheguei perto, fiz um gesto de continência e apertei sua mão formalmente, mantendo o olhar fixo nos olhos dela, perdido em meus próprios pensamentos. Como uma mulher poderia ser tão bela?

Com uma voz melodiosa, ela falou:

— Estou em missão de resgatar meu jaleco, Capitão!

Sorri e respondi, claramente desconcertado:

— Eu imaginei, mas não pensei que viria agora... quer dizer... não tem problema! — cocei a nuca, ainda tentando encontrar as palavras adequadas, algo incomum para mim, que sempre fui direto em minhas conversas.

O silêncio que se seguiu foi desconfortável, até que ela o quebrou, perguntando sobre o Gouveia:

— Como está o Gouveia? Ele está bem, não é? Estou afastada do hospital há alguns dias e não tenho notícias dele.

Respondi com tristeza:

— Ele ainda não acordou. Está fraco e debilitado, mas, como você disse, está se recuperando aos poucos.

Gouveia era um excelente policial; a possibilidade de perdê-lo nos abatia profundamente. Tentando desviar o foco da tristeza, ela questionou:

— E vocês já capturaram quem o feriu?

— A essa altura, o criminoso já está tomando chá com o diabo! — respondi com um sorriso satisfeito, lembrando de como lidei com aquele indivíduo. A lembrança do estrago causado no rosto dele foi quase prazerosa.

Percebi que ela engoliu em seco e suspirou. Tentando me justificar, acrescentei:

— Quando algo assim acontece, não podemos deixar impune. Criminosos não perdoam policiais do BOPE! — disse, travando o maxilar.

Ela, então, respondeu:

— Eu entendo, Nascimento... Sei que o trabalho de vocês é extremamente arriscado e que são a linha de frente na segurança. Admiro muito isso... afinal, venho de uma família de militares.

Surpreso, não pude deixar de perguntar:

— Família de militares?

Ela explicou:

— Sim! Meu pai é Brigadeiro da FAB, minha mãe é Coronel, e meu irmão é tenente médico no Exército.

Ainda assimilando a informação, indaguei:

— E você? Por que não seguiu a carreira militar?

Ela me respondeu com um sorriso:

— Estudei em escola militar a vida inteira... mas não consegui passar no TAF da Polícia Rodoviária Federal. Eu era muito nova e imatura, mas, na verdade, nunca quis ser militar.

Minhas reflexões me levaram a pensar como alguém poderia não passar no TAF... No TAF! A incredulidade tomou conta, e não consegui conter o riso. Parei imediatamente ao perceber que ela se sentiu envergonhada.

— Eu já ouvi muito falar dos seus pais, e jamais imaginei que você fosse irmã do Gabriel! Mas nunca tive o prazer de conhecê-la. O Gabriel pouco fala sobre você nas nossas conversas.

Pensei em como ele havia mantido em segredo uma irmã tão impressionante. Ela esclareceu:

— Depois que não consegui passar no teste, fui estudar medicina no exterior. Faz três meses que voltei da Inglaterra e estou trabalhando no hospital como médica.

Minha mente estava a mil; havia muito a considerar e pesquisar a respeito dela. Convidei-a para entrar na minha sala, e ela me acompanhou, observando atentamente o ambiente. Entreguei o jaleco, e, quando nossos dedos se tocaram, novamente senti-me como um adolescente apaixonado.

— Não vou tomar mais do seu tempo! Preciso passar no hospital para pegar alguns documentos — disse ela, se preparando para partir.

Eu realmente desejava que ela ficasse o dia inteiro ao meu lado, apenas para continuar sentindo aquele aroma encantador. Agradeci por ela ter salvado o Gouveia, e, com aquela voz doce que sempre me cativa, ela disse que não precisava agradecer, que teria feito isso por qualquer um.

Refleti sobre como o destino havia colocado essa mulher no meu caminho só agora. Por que Deus não a trouxe antes? Nós somos o oposto um do outro, e, no entanto, estou completamente apaixonado. Quem diria que eu, conhecido por não demonstrar emoções, estaria tão envolvido pela doutora, que, além de tudo, é irmã de um amigo meu, que mal havia mencionado sua existência.

Eu queria questionar o Gabriel sobre ela, mas sabia que isso despertaria suspeitas; ele era inteligente demais para não perceber. Quando ela saiu da sala, não hesitei em admirar sua figura até que desaparecesse pela porta. Depois, sentei-me à minha mesa, passando a mão pelo rosto, questionando qual era o meu problema. Finalmente, percebi que estava completamente apaixonado pela doutora Ungaretti.

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