Capítulo 24: Morto

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- Você está com fome né ? - pergunto, tentando não soar ansiosa.

Ele me olha com uma mistura de surpresa e esperança, como se aquela simples pergunta pudesse resolver todos os problemas do mundo. Eu sorrio suavemente.

- Sim, bem... eu estou com muita fome... - ele admite, a voz quase se apagando de tão baixa.

- Pra quem você estava roubando comida? - Minha pergunta é direta.

- Como assim pra quem... ninguém... - Ele se enrola nas palavras, e percebo imediatamente que está mentindo.

Eu suspiro, tentando manter a calma e a paciência.

- Olha, se você me disser, eu posso te dar comida pra levar pra ele também - proponho, suavizando meu tom.

Ele fica em silêncio por um tempo, os olhos desviando para longe, como se estivesse ponderando se deve confiar em mim ou não. Finalmente, ele suspira, a derrota em seu semblante.

- Meu irmão... ele é como eu e está doente... e está me esperando do outro lado... - ele confessa, a voz cheia de medo e amor ao mesmo tempo.

Eu sorrio, porque entendo perfeitamente o propósito dele, o desespero e o sacrifício.

Eu faria o mesmo pelo max.

- Isso é muito nobre, sabia? Arriscar sua vida para ajudar seu irmão - digo, minha voz cheia de uma admiração genuína que não consigo esconder.

Me levanto da cama com determinação.

- Eu vou até a cozinha e já volto. Fique aqui e não faça barulho, está bem?

Ele acena com a cabeça, os olhos arregalados de surpresa. Saio do quarto e me dirijo à cozinha, o único lugar que conheço bem o suficiente para encontrar comida em qualquer hora da noite. É sempre um lugar vazio durante as madrugadas, graças ao bom Caldeirão. Começo a vasculhar os armários em busca de algo que ele possa levar.

Pego um saco de pano e encho-o com pães frescos, um punhado de uvas, queijo, e uma coxa gorda de Cervo-meu novo prato favorito desde que cheguei a este lugar. A cada item que coloco no saco, sinto uma estranha sensação de satisfação, como se cada gesto significasse mais do que apenas dar comida a uma criança faminta.

Volto ao quarto com o saco em mãos, tentando não fazer barulho. Ao abrir a porta, vejo Eamon ainda sentado na cama, olhando para mim com um brilho de esperança nos olhos. Coloco o saco na cama ao lado dele, sem dizer nada, apenas observando a reação dele.

- Isso... tudo isso é pra mim? - Ele pergunta, a voz quase se quebrando.

- Sim, pro seu irmão também. - Eu me sento ao lado dele novamente. - Espero que seja o suficiente para os dois.

Eamon olha para o saco, hesitando por um momento antes de abrir e ver o conteúdo. Quando vê a comida, seus olhos se arregalam, e ele olha para mim, como se não pudesse acreditar que alguém como eu pudesse fazer algo assim.

- Obrigado... - ele sussurra, e eu apenas aceno, sem saber o que dizer.

- Só come logo, tá ?

Ele não pensa duas vezes e começa a devorar um dos pães.

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- Preciso que você faça algo. - Digo assim que ele termina de comer, minha voz assumindo um tom mais sério.

- O que é? - Ele pergunta, a curiosidade se misturando ao medo em seus olhos.

- Você precisa gritar.

Corte de Sombras e Lembranças | AmaranthaOnde histórias criam vida. Descubra agora