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Ana Flávia povs

Gustavo caminhava ao meu lado me mostrando o caminho até os aposentos do seu pai.

Confesso que a cada passo meu coração palpitava ainda mais no peito. Não podia distinguir se era por causa da ansiedade ou por medo de estar diante de outro possível carrasco. Falando em carrasco, as recordações do dia anterior ainda rondam minha cabeça.
Acordei hoje sentindo um pouco de dor nas articulações e preferi ficar sentada na cama esperando-a passar. Naquele instante, ouvi um barulho vindo da porta. Olhei e encontrei o causador
do meu sofrimento entrando o quarto com aquele olhar intimidador.
Ele caminhou até a cama e confesso que temi quando se sentou ao meu lado. No entanto, ele permaneceu quieto e em silêncio e, quando falou, foi apenas para me informar de que conheceria seu
pai e que me arrumasse rápido.

O fato é que ver o homem que agora caminha ao meu lado rasgar em pedacinhos meu único e estimado bem material, foi o suficiente para entender que confrontá-lo só farão as coisas se
tornarem mais dolorosas.
Não sou boba o bastante para dizer que o ódio não me corrói só em pensar nas cenas ocorridas, do quanto doeu na alma me sentir solitária, vazia de sensações e perceber que a vida não
me pertencia mais. Relembrar cenas dele me pegando nos seus braços fortes, da minha cabeça recostada naquele peito de aço, do banho que me deu, dele tirar minhas roupas cuidadosamente, do chá delicioso que me ofereceu com delicadeza.
A verdade é que cansei de lamentar em vão. Vou deixar as coisas seguirem seu próprio rumo e, se a felicidade vier algum dia, vou agarrar-me a ela com unhas e dentes. Só me pergunto
porque ele é tão ruim e ao mesmo tempo tão... atencioso.

Minha divagação cessa quando ele segura meu cotovelo, pois, sem perceber que ele havia parado, continuei andando. Fico espantada pelo toque. Nossos olhares se cruzam e assim
permanecem até ele quebrar o contato e virar para bater com o punho fechado na porta.
— Entre! — escuto um rouco e abafado sussurro vindo do outro lado.
Ele abre a porta dando espaço para que eu entre primeiro e eu o faço um tanto receosa.
Meus pés grudam no chão quando meus olhos viajam pelo lugar que tem uma magnitude indescritível. O cômodo conseguiu tirar meu fôlego. Pensei que nada mais me surpreenderia depois
do exuberante quarto que tenho dormido, entretanto, se alguém os comparar, possivelmente descobrirá que aquele tem apenas dez porcento da beleza deste lugar que mais parece um salão com mobília.
O teto exibe uma sequência de lustres gigantes posicionados em um triângulo enriquecido de luminosidade o cômodo e, mesmo querendo, não consigo entender os traços do desenho talhado em ouro que se espalha por todo o teto.
Descendo um pouco o olhar, visualizo paredes também recobertas por ouro. Há quadros de homens naquelas roupas esquisitas, e é claro, há outras paredes completamente vazias.
— É um prazer receber em meus aposentos a minha futura nora! — me assusto com o som da voz que retumba por aquele espaço até então silencioso.
Procuro o dono dela e meus olhos recaem sob um senhor magro e pálido que descansa em cima da cama recheada de cobertores vermelhos. Seus olhos cruzam com os meus e ele sorri de lado.
Um sorriso que já deve ter sido a perdição de muitas mulheres, mas que hoje não passa de um gesto simpático vindo de um senhor.
— Você é muito bonita, minha filha. Devo admitir que meu filho tem bom gosto.
Talvez ele não saiba sob quais condições vim parar aqui e esteja querendo ser acolhedor como a Boo, por isso, me esforço para responder:
— Obrigado. — murmuro.
Ele quebra o nosso contato visual e procura o filho.
— Acomodem-se que o que tenho pra falar é rápido, porém, quero que estejam confortáveis para ouvir. — diz encarando Gustavo e aponta para duas cadeiras do lado direito da cama.
Caminho até o lugar apontado e sento cautelosa por saber que o assassino vai sentar-se ao meu lado. Entretanto ele não o faz. Observo os dois homens que se fitam com intensidade.
Após um olhar fulminante para o pai e um do qual não consegui destinguir pra mim, Gustavo caminha e afunda no acento ao meu lado.
Acomodado a centímetros de mim, sinto seu cheiro amadeirado, masculino, envolvente e perigoso. Um perfume incrivelmente perfeito para um homem como ele. Observo-o de relance e
visualizo seu maxilar cerrado, as veias do braço ressaltadas, pois suas mãos estão fechadas com força. Seu corpo rígido como um felino pronto para atacar.
— Se Vossa Majestade não tiver mais nenhuma condição e puder ser o mais breve possível, ficarei grato. — sua voz cortante enche meus tímpanos e eu franzo o cenho diante da frieza e sarcasmo que ele trata o próprio pai.
O pobre homem assente.
— Eu vou filho, eu vou... — o senhor limpa a garganta e sucessivamente tosse violentamente. — Sua irmã me disse que levou a... — volta a falar com dificuldade.
— Ana Flávia. — Gustavo completa.
— A Ana Flávia para o seu quarto e quero que isso mude. Por mais que você não siga as tradições e eu o respeite, porque sei que sua mãe o criou com ambas as culturas, seus súditos são
árabes e você sabe que é terminantemente proibido um casal dormir no mesmo quarto antes do
casamento. Enfim, eu os quero em quartos separados ao menos até o casamento, entendeu? — fala imperativamente e eu olho para o homem ao meu lado vendo-o afirmar com a cabeça.
— Era só isso? — questiona Gustavo.
— Não! Quero que se casem em três dias. — anuncia e Gustavo salta da cadeira ficando de pé.
Suas mãos continuam fechadas em punhos e seus olhos soltam faíscas.
— Eu não vou me casar em três dias. — Anuncia, porém poucos instantes depois, ele suspira e volta a sentar-se, ainda que visivelmente contrariado.
O que passou por seu semblante foi um misto de... recordações e isso o impediu de afrontar o pai de alguma maneira.
O senhor limpa a garganta também com o semblante confuso, reflexo do que deve ser o meu no momento.
— Bom, prosseguindo. Eu já providenciei tudo para cerimônia, contudo, há coisas em que devem pedir para a Bruna lhes ajudar. — Explica.
— Podemos ir? — Gustavo questiona ríspido.
— Podem sim. — ele levanta e eu o sigo. — Foi um prazer lhe conhecer, Ana Flávia. Seja bem vinda à família. — o senhor diz e eu lhe dou um sorriso amarelo, já passando pela porta que seu filho abria pra mim.
Já lá fora, fico sem saber pra onde ir ou o que vamos fazer. Aguardo que ele me informe.
— Vamos comer alguma coisa. — fala como se lesse meus pensamentos. — Está com fome?
Faço um gesto dizendo que sim e ele faz um sinal com as mãos me instruindo a ir na frente.
Sigo apressada pelo corredor — ou cômodo já que só a largura dele era do tamanho da casa onde morava.
Havia uma fila de vasos que eram quase da minha altura recostados nas paredes. Estava vivendo um filme de terror num cenário de contos de fadas. A cada passo ficava mais fascinada com a grandeza daquele lugar... No final do corredor tinha um corrimão que se prolongava até o topo de uma escada, — duas, na verdade — era como uma sacada que dividia as duas, uma de cada lado.
— Uau! — me ouvi exclamando ao olhar pra cima e ver varias sacadas laterais de vários e vários outros corredores.
— Impressionante, não?
— Sim. — Respondo mesmo após meu evidente deslumbramento. Inicio a descida dos degraus rapidamente.
Bastou um passo mal calculado para eu tropeçar nas minhas próprias pernas e fechar os olhos esperando rolar aquela imensidão de degraus abaixo. Aconteceu tudo tão rápido, que custou
cair a ficha e perceber que não estava caindo.
Permiti que o ar deixasse meus pulmões. A essa altura, meu coração batia com uma intensidade fora do comum contra minhas costelas. Só então senti as duas mãos que envolveram minha cintura, assim também como minhas costas apoiadas num peito duro.
— Cuidado! — Repreende-me com a respiração ofegante devido à adrenalina, reflexo da minha própria.
Então lentamente ele me vira para si pelo meu quadril, movimento que, ao contrário do anterior, parece demorar horas. Nossos olhares se cruzam e nos fitamos. Fico perdida em meio às
suas esferas negras como a noite.
De repente, o clima transforma-se e eu me pego admirando seus lábios bem desenhados. O mundo parece congelar e tudo que existe sou eu e ele, nós dois. Meu corpo estremece diante do seu
olhar e do seu contato, já que nossos corpos estão grudados.
Nossos rostos, que antes estavam próximos, passam a ficar a centímetros um do outro. Sua respiração aquecida em minha boca... Os meus olhos que já não suportam o êxtase do momento se
fecham delicadamente sem saber o que aguardar quando a reposta vem... O toque sutil dos lábios de
Gustavo. Lábios que apenas friccionam os meus, mas, em compensação, mãos que ganham vida nos meus quadris e velozes seguem seu destino: uma adentra as madeixas do meu cabelo e as seguram em punho fechado fundindo ainda mais nossos lábios que agora se esmagam e, a outra, se arrasta até o
meio das minha espinha e o braço másculo me surpreende ao passar pela minha cintura e eliminar qualquer espaço que poderia haver entre nossos corpos.
Lânguida, perdida em luxúria e desejo e, acima de tudo, sem fôlego, entreabro os lábios para tomar um gole de oxigênio. Quando consigo, ganho de brinde algo inigualável, formidável,
surprendente e indescritível que é o prazer de acomodar sua língua em minha boca.
Consumida, vejo-me agarrando seus cabelos sedosos e a camisa por entre os dedos. Sua língua varre cada cantinho da minha boca guerreando contra a minha loucamente. Uma quentura que
senti uma única vez e com a mesma pessoa, começa a se formar em meu ventre, assim como sinto líquidos quentes encharcarem minha calcinha.
Sua boca deixa a minha e varre meu pescoço deixando minha cabeça pender pra trás.
— Ah! — gemo ao receber duas pequenas mordidas.
E, então, escorando minha cabeça com a mão, ele retorna à minha boca.
Ávida por algo que não consigo entender, puxo mais sua cabeça e me aperto mais em seu corpo. Então sinto algo que me deixa receosa, temerosa e aflita: uma protuberância dura na minha barriga que me leva a ofegar. Em seguida, várias questões surgem: o que estou fazendo? Como pude esquecer do mau que ele me fez? É isso que faz quando ele te machuca?
Confusa, abro os olhos.
— Para! — murmuro empurrando-o. Ele me atende prontamente e me olha interrogativo. Entretanto, nada diz. Livre dele, tento me recompor expirando e inspirando profundamente e ele me acompanha.
Após um silêncio constrangedor que se instalou, limpando, a garganta ele diz:
— Então, vamos?
Envergonhada pelas minhas ações me concentro apenas em descer os degraus
cuidadosamente dessa vez sem limitar-me a olhar em sua direção.

Garota traficada-miotelaOnde histórias criam vida. Descubra agora