Anoiteceu no dia no qual respirei livre pela primeira vez. Eu estava com frio e faminto, mas nunca senti o ar tão puro e profundo. Malotl fez uma fogueira e me mandou procurar alimento. Durante a procura não obtive sucesso por um bom tempo, senti que minhas forças se esvaiam e que em breve eu desmaiaria, de repente resolvi olhar para o céu. Nesse momento olhei nos olhos do universo e percebi que jamais conheceria sua real grandeza e sabedoria. Pode parecer estranho, porém isso me trouxe uma estranha e desconhecida paz. Algo dentro de mim me acalmou e mandou que eu não desistisse de procurar pela comida, então reuni todas as minhas forças e continuei a minha busca.
Andei sem rumo até encontrar uma clareira que tinha um casebre. Sorri, porque dentro da choupana poderia ter comida. No entanto, eu deveria ser cauteloso, pois ele poderia estar sendo ocupado por pessoas que me entregariam a Sana. Então, tentei achar uma entrada por onde eu adentraria a casa sem ser descoberto, porém não consegui achar uma entrada sequer, por isso tive que abrir a porta de madeira para entrar na cabana.
Realmente adentrei a residência e fui atacado por alguém que era um mago de fogo. Felizmente, defendi-me e uma voz feminina perguntou quem eu era e o que eu fazia ali. Não respondi por medo de estar diante de uma aliada de Sana, mesmo assim não fugi, porque a fome não me permitiu. Eu só partiria dali com algum alimento ou morto: eu estava sem me alimentar havia três dias e a fome já havia devorado minha sanidade.
Iniciou-se uma luta e me agarrei à minha vontade de sobreviver para não fugir da batalha, porém eu estava fraco e fui derrotado. Vi o rosto de quem me venceu: era uma jovem miúda de longos cabelos negros. Ela deveria ser um pouco mais jovem do que eu e era dona de traços marcantes. No entanto, pouco me importava se ela era bela ou não, naquele momento eu não queria morrer.
De repente ela me chamou de ladrão imundo, filho de Sana e cuspiu no chão. Senti-me aliviado, porque ela também parecia ter os mesmos interesses que eu. Ela estranhou minha expressão aliviada e perguntou quem eu era. Respondi essa indagação e falei que eu estava naquele casebre atrás de alimento. A garota se apiedou, esclareceu que se eu desejava comida, eu deveria ter batido na porta; ao invés de ir entrando sem permissão; e lhe pedido alimento. Depois, ela me colocou em algum canto e me ofereceu raízes cozidas.
A jovem me contou que se chamava Yaiza e era uma escrava fugitiva, detestava Sana por todas as humilhações que a família dela passou nas mãos de terríveis senhores dessa detestável metrópole. Após uma pausa em sua apresentação, ela me prometeu toda ajuda possível e percebi que isso não era um juramento falso, pois havia um ardor profundo em sua voz e seu olhar estava em chamas.
Notei o sofrimento de Yaiza ao recordar de Sana, porque seus olhos negros pararam de luzir. Tudo nela se acabrunhava diante de semelhantes lembranças. Mortifiquei-me diante de tanta tristeza, porquanto ela era muito jovem para sofrer tanto. Entretanto, eu não lhe disse nada a respeito, apenas peguei algumas raízes cozidas para leva-las a Malotl e avisei que eu retornaria com um amigo. Até hoje, sinto certo remorso por esse momento de silêncio.
Quando cheguei até Malotl, ele me repreendeu por eu ter demorado muito e eu lhe contei que achei abrigo, alimentos e uma aliada. Como eu já esperava, ele ficou surpreso e disse que só acreditaria nisso vendo, então falei que depois de comer as raízes que eu trouxera ele poderia me acompanhar até o casebre que descobri. Vacilante, ele aceitou essas condições e ao chegar no novo abrigo entrou em choque de tão surpreso que ele estava. Depois da surpresa inicial, ele pediu para Yaiza se juntar a nós para ajudar a libertar as terras do leste de Taen do controle de Sana e ela aceitou ser nossa aliada.
O casebre de Yaiza se tornou a primeira base dos Libertadores de Danji. Dessa pequena cabana partíamos para ajudar muita gente a fugir da escravidão. Muitas dessas pessoas resolveram aderir aos Libertadores de Danji e em pouco tempo apenas essa base se tornou insuficiente para tantos membros.
Lembro-me dessa época com muito saudosismo, o olhar de uma alegria jamais vista por mim inundava os olhos de quem ajudávamos a libertar, isso fazia todos os riscos que eu corria valer a pena. Eu semeava esperança em muitos corações e ao vê-la vazar dos olhos de quem eu auxiliava, ela reacendia mais forte dentro de mim e me motivava a seguir adiante na minha missão de espalhar a liberdade para meu povo.
Também me recordo que eu sempre poderia contar com Yaiza. Era ela quem sempre esperava eu e Malotl no final do dia com um jantar pronto, cuidava das feridas dos corpos e das almas de todos, inclusive ela fez o máximo que pôde para tratar das minhas. Serei eternamente grato a ela por seus esforços.
Yaiza é e sempre será alguém intrigante. Atualmente, sua fama é controversa: alguns a acusam de trair a rebelião, outros a chamam de rainha sem coroa. Na realidade, todas as opiniões sobre Yaiza convergem em apenas um ponto indiscutível: ela fez história e seu legado será eterno. Quanto ao meu ponto de vista sobre essa importante mulher, eu vejo suas contradições não apenas como um misterioso charme: considero-a uma infinita incógnita e é impossível esquecê-la. Declaro-a dona de um carisma explosivo e merecedora de tal honraria. Porquanto, ela lutava pelo o que acreditava sem titubear, mas fazia isso com uma coragem irreverente e ardente. Talvez Yaiza até soubesse que suas mãos bordavam o destino enquanto nos ajudava na rebelião e com o passar do tempo eu ficava cada vez mais preso aos seus emaranhados de sutilezas e força. Em minha opinião, Yaiza sempre será a soberana rebelde eternamente disposta a abdicar do poder, pois nasceu para liderar e construir impérios, porém era ousada demais para se prender ao trono.
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A independência de Dai
FantasyZoco é um jovem bruxo escravizado de Dai. Não bastando as condições adversas ao qual ele é submetido, ele se apaixona por Pemi, a filha do representante da metrópole em Dai... Um amor proibido. Os deuses, principalmente o deus da guerra, não quisera...