O deus Lua

8 2 0
                                    

Fomos até o local desse acampamento e tudo parecia estranhamente preservado. Parecia que as últimas pessoas que passaram por ele o deixaram a menos de uma semana de tão bem cuidado que estava. Aquele lugar era realmente estranho apesar de ser um bom local para dormir, possivelmente era melhor que as geladas cavernas espalhadas por todo o vale cinzento.

Todos pareciam alarmados com a possibilidade de sermos visitados por almas penadas, porém estávamos exaustos da fuga e decidimos que mesmo assim descansaríamos. Meus irmãos fizeram uma prece pelos mortos, pedindo clemência e desejando-lhes a paz eterna. Inesperadamente, a mãe de Pemi juntou-se a eles e começou a orar convocando proteção para todos nós. Após terminar sua reza, o pai da minha amada propôs que houvesse vigílias intercaladas para não sermos surpreendidos pelos fantasmas. Todos concordaram com a proposta e decidimos que duas pessoas vigiariam enquanto o resto dormia até que os vigilantes se cansassem e fossem substituídos.

O primeiro turno era o do inicio da noite e ficou com a mãe de Pemi e Hualca. Porquanto, pensávamos que os piores ataques ocorreriam no meio da noite e na madrugada, resolvemos deixar Hualca e a mãe de Pemi nos vigiar após o pôr do sol com o intuito de poupar as energias dos mais fortes e experientes a fim de que estivessem descansados e prontos para enfrentar os possíveis perigos que ocorreriam mais tarde.

Quando fui acordado já era noite alta e a lua prateada resplandecia no céu mais escuro que já vi. Tudo estava muito quieto e parado, não havia brisa ou barulho algum. Senti naquele momento, que se houvesse assombração logo ela se manifestaria, isso estava iminente.

Fui despertado para fazer a vigília pelo o pai de Pemi, ele estava pálido e com grandes olheiras insones, seus olhos castanhos estavam fixos em algum canto do horizonte além da cordilheira. Pensei que ele estava sob o domínio de alguma entidade perversa e o empurrei. Depois disso ele me olhou surpreso e um pouco bravo, justifiquei-me, deixei claro meu objetivo de salvá-lo da dominação hipnótica das assombrações.

O progenitor da menina-sombra me relatou que um detalhe em Tla o intrigou, o colar com um símbolo desconhecido que a minha irmã usava brilhou forte e uma foice foi convocada antes de ela partir para enfrentar Malotl e ajudar Yaiza. Um misto de sentimentos me invadiu, fique preocupado por minha irmã por não querer perdê-la e ao mesmo tempo eu tinha fé em seu retorno.

Em minha mente, ouvi uma voz feminina imperiosa e um tanto suave me chamando, ela clamava por coragem e me convocava ao sacrifício, tentava me conduzir ao meu destino. Quando ouvi o estranho chamado em minha alma, tive certeza de que minha irmã estava bem e sua mestra nos guardava. Restou-me a árdua tarefa de tranquilizar o pai de Pemi.

Após tranquilizar meu companheiro de vigília e convocar seu senso de responsabilidade ao fazê-lo lembrar de que a segurança de sua família dependia de quão bem-sucedidos fossemos em vigiar e protege-los dos fantasmas, ele me contou que algo realmente prendera sua mente longe dali antes de me avisar sobre o estranho acontecimento envolvendo Tla. Os motivos por trás de sua súbita imersão em si mesmo eram as histórias de seu pai sobre o misterioso sumiço de seu avô, este serviu o exército de Sana naquela região e nunca mais retornou ao lar.

O pai de Pemi me contou que há muito tempo, durante um frio inverno, seu avô foi chamado para lutar naquele fim de mundo. Ele não desejava ir, porém não teve escolha, se não fosse iria preso por ser desleal a Sana. Então, ele foi e deixou a mulher com um filho pequeno. Entretanto, ele nunca mais voltou, a mulher morreu de saudades e o filho cresceu órfão e lutando para ter uma vida melhor. Esse menino se tornou o rígido avô de Pemi, um homem batalhador e amargurado.

Vi a dor nos olhos do pai de minha amada. Senti o sofrimento de filho que não foi suficientemente amado na voz daquele homem insensível e interesseiro. Percebi um garoto solitário naquele senhor tão inclemente, um menino de vida áspera e sem abraço algum. Tive vontade de consolá-lo e protegê-lo ao ver a fragilidade por trás de seu comportamento cruel. O progenitor de Pemi era apenas um homem sofrido que não soube lidar bem com suas dores, ele foi corrompido por suas aflições e isso aumentou seu sofrimento.

A independência de DaiOnde histórias criam vida. Descubra agora