Malotl mostra quem ele realmente é

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Resolvi terminar o namoro com Yaiza naquele dia, mesmo sabendo que seria muito difícil. Procurei-a e a encontrei na grande festa de independência. Recordo-me de sua proverbial beleza enquanto dançava bruxuleante diante da fogueira. A intensa menina bailava até quase acabar seu fôlego. No entanto, quando se pensava que ela pararia de dançar, ela ressurgia movimentando-se frenética e trôpega, a vida lhe voltava mais forte e explosiva. Dessa forma ela também vivia: nos momentos mais sombrios todos desistiam e ela defendia o que lhe era mais importante com a ardência infinita do sol.

Admirei-a muito naquele instante, porém nem assim eu cheguei a amá-la. Talvez não a amasse por ela ser tão exuberante a ponto de me sentir uma sombra diante dela. Indubitavelmente, ela era boa demais para mim e eu sempre soube disso. Eu não era o rapaz certo para ela. Decidi que o momento de terminar era aquele.

Yaiza estava muito bela, pois o luzir das chamas deixavam a pele morena dela igual ao bronze. A dona dos olhos mais quentes se assemelhava a uma divindade de tão linda. Porém, cheguei perto dela e terminei o namoro. Lembro-me de suas lágrimas e de todas as vezes nas quais ela me perguntou onde havia errado. Respondi-lhe que ela não errou, o erro estava comigo e por isso acabei o relacionamento. Yaiza insistiu em não compreender e continuou a chorar e implorar para não deixa-la. Entretanto, mantive-me firme à minha resolução mesmo a vendo sofrer tanto. Naquele dia minha alma morreu um pouco, porque eu não desejava causar tanta dor a uma pessoa tão maravilhosa.

Em pouco tempo muitos já sabiam do término do namoro que tive com Yaiza. Sem sombra de dúvidas, a maioria me julgou louco por deixa-la, alguns tentaram me fazer voltar para ela, mas me mantive firme nessa decisão. Saí da ilusão sem olhar para trás. Eu não reatei com ela perante a desaprovação de Malotl e de meus irmãos. Estes me desejavam o melhor e consideravam Yaiza a pessoa certa para eu compartilhar minha vida. Todavia, eu não era o rapaz certo para ela, porque ela merecia alguém que a amasse. Eu era um mentiroso e errava mesmo quando eu almejava o melhor. Além de tudo isso, a vida era minha e eu viveria de acordo com minha vontade. Eu tinha a liberdade de escolher o que eu queria e minhas decisões deveriam ser respeitadas.

Apesar de muitos reprovarem minha atitude em relação à Yaiza, vários ainda alimentavam certo respeito em relação a mim. Porquanto, eu continuava sendo considerado um dos líderes do movimento que conseguiu a independência das nossas terras e do nosso povo. Por conta desse mérito, fui convocado para a reunião na qual se decidiu o nome do novo país que se formava, onde seria sua capital e qual seria seu governo.

Durante a reunião tive que rever Yaiza. Minha ex-namorada estava glacial, quase congelei minha alma ao reencontrá-la. Eu esperava uma fúria arrebatadora cheia de pragas rogadas contra mim e nem sonhava com a indiferença dela. Para minha própria surpresa, ao mesmo tempo em que me senti gelando veio um alívio por ela não ter se afastado da revolução por conta do nosso término. Indubitavelmente, seria uma grande perda ao país se a mais intensa alma abandonasse seu sonho de ajudar a construí-lo.

Eu, Yaiza, Malotl e Tla fomos os mais ativos durante a reunião. Apesar de tudo, minha ex-namorada se mostrou madura e não levou nossas questões pessoais pendentes para a discussão sobre o destino de nosso povo. Nesse evento, minha antiga companheira se mostrou muito forte enquanto eu me sentia um garoto medroso perante ela.

Depois do venerável congresso ficou decidido que o tipo de governo seria uma república democrática, a capital seria Danji e o novo país se chamaria Dai.

Também, houve um acordo por um governo provisório e que a primeira eleição seria um ano depois do congresso. Certamente, eu não concordava com essas medidas, porque eu desejava eleições presidenciais imediatas. No entanto, não havia organização o suficiente para a ocorrência de eleições e era mais urgente um governo central para liderar o exército responsável pela defesa de Dai contra as investidas militares de outros países, principalmente as de Sana que certamente tentaria retomar o domínio da antiga colônia, isso realmente ocorreu depois.

O governo provisório foi liderado por Malotl, o qual era muito apoiado pela região de Danji e pelos mais poderosos bruxos da capital do país em formação. Meu amigo conseguiu realizar seu sonho de ser um homem muito poderoso. Na verdade, essa sempre foi sua real ambição e ela o motivou a lutar com muito afinco pela independência de nosso povo. Anteriormente, eu não prestara atenção nos semanais discursos emocionantes dele, mas depois de ele ser escolhido para ser o primeiro grande líder de Dai ficou claro que suas palestras não eram apenas para motivar muitos a permanecerem na luta. Na realidade, o intuito de palavras tão belas e inflamadas era recrutar seguidores que o apoiariam e viabilizariam o plano de Malotl governar.

Não aprovei essa atitude de Malotl. Eu não esperava isso dele e não sei o que me magoou mais: o jeito como ele conseguiu o poder ou o fato dele ter se mostrado mais inteligente do que eu supunha. Provavelmente, desde o início de nossa amizade ele já estivesse defendendo seus interesses. Infelizmente, eu já não sabia se ele era realmente meu amigo ou se eu era-lhe somente uma peça que ele manipulou para obter o poder. Eu preferia enxergar essas atitudes ambiciosas como partes de uma fase passageira e assustava-me a possibilidade de eu ter sido enganado por ele. Todavia, se o fui, todo mundo foi.

A independência de DaiOnde histórias criam vida. Descubra agora