Capítulo 29 - Não me resta nada aqui

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Quando finalmente cheguei, o que vi me fez parar em seco.

A casa, que uma vez fora cheia de lembranças amargas, agora estava reduzida a cinzas, como se o fogo houvesse consumido não apenas as paredes, mas também as memórias que ali estavam.

Charlene, irmã da minha mãe, sempre fora uma figura distante para mim.

Nunca nos demos bem, e as lembranças que tinha daquele lugar eram todas repletas de desentendimentos e da vez em que ela me expulsou de casa.

A raiva e a frustração que senti na época agora eram substituídas por uma estranha tristeza.

Olhei em volta, observando o que restava da casa, e um aperto se formou em meu peito.

Não havia alegria em ver aquele lugar assim, mas também não havia dor. O que eu sentia era uma mistura de alívio e perda.

Algo dentro de mim desejava que houvesse um jeito de me despedir, mas o destino havia sido implacável, reduzindo até mesmo as oportunidades de reconciliação a cinzas.

Uma vizinha idosa de minha tia parou ao meu lado, com sua expressão carregada de tristeza e preocupação.

Era uma mulher que sempre tinha uma palavra gentil quando eu passava por ali, mas agora seus olhos estavam embaçados.

— Lily! Há quanto tempo, não é? — ela disse, sua voz tremendo um pouco.

Eu limpei as lágrimas que escorriam pelo meu rosto, tentando absorver a realidade ao meu redor.

O calor das chamas ainda parecia ressoar no ar, como um eco distante de algo que uma vez foi familiar e seguro.

— O que aconteceu aqui? — perguntei, minha voz falhando, lutando para entender o que estava diante de mim. — E a minha tia? Onde está a Charlene?

A vizinha hesitou, como se as palavras que estavam prestes a sair de sua boca fossem um peso difícil de carregar.

Ela respirou fundo antes de responder, seu olhar fixo no chão coberto de cinzas.

— Ela... ela não está mais aqui, querida — disse a idosa, com a tristeza em sua voz.— Sua tia morreu no incêndio.

As palavras caíram sobre mim como uma pancada, fazendo meu mundo girar.

Morta? A tia que eu mal conhecia, que nunca havia sido carinhosa ou acolhedora, agora estava perdida para sempre.

A ideia de que eu nunca mais teria a chance de conhecê-la me deixou paralisada, uma onda de emoções me atingindo com força.

— Como isso aconteceu? — murmurei, a voz falhando enquanto tentava processar a informação. — Ninguém me contou nada.

— Foi um incêndio criminoso — a vizinha respondeu, seu olhar triste. — Acredita-se que foi causado por algo ligado ao tráfico. Não puderam fazer um enterro, o corpo ficou muito danificado.

As palavras dela cortaram como uma faca, e eu me senti sufocar. Não apenas a dor da perda, mas o peso de saber que minha tia havia morrido em circunstâncias tão trágicas e sem dignidade.

Eu nunca pensei que isso aconteceria, e agora era tarde demais para entender quem ela realmente era.

— Mas e os meus direitos? — perguntei, uma pitada de raiva começando a se formar. — Eu... eu deveria saber disso!

A vizinha olhou para mim com pena, mas não tinha respostas. O vazio dentro de mim só crescia, e eu queria gritar, chorar, fazer alguma coisa para liberar essa dor que me consumia. Minha tia não era perfeita, mas ela era minha família, e agora estava tudo acabado.

O Demônio do FarolOnde histórias criam vida. Descubra agora