Através de uma parede de vidro podia ver Enzo se debater em cima de uma mesa contra alguns médicos. O grito dele me dava náuseas. Sabia que ele não está me vendo do outro lado, mas ainda sim fiquei sussurrando baixinho frases como "Tudo bem meu amor." "A mamãe está bem aqui" "Já vai passar, você vai ver."
Vi os médicos tentarem colocar o sedativo nele, mas ele se debatia tanto que nem com quatro médicos o segurando eles conseguiram. Um dos médicos veio até mim do lado de fora e me chamou.
– Pode nos ajudar? – Assenti.Faria o que fosse para estar ao lado dele. Vesti uma dessas camisolas horrorosas, touca, luvas e uma proteção na boca e entrei.
– Oh meu amor, a mamãe está aqui. – Ele rapidamente saltou do colo de um dos médicos para o meu. – Tudo bem, tudo bem bebê. – Acariciei as costas dele o deixando de pé sobre a mesa gélida.Enzo estava apenas com uma camisola daquelas que é aberta na parte de trás e uma touca como a minha na cabeça. – Já vai passar, eu prometo. – O médico me entregou o aparelho e me instrui a segurá-lo na frente do rosto dele. Eu o fiz enquanto falava algumas frases de consolo pra ele e embora ele continuasse chorando chamando por Christopher, ou melhor, por seu papai, o que me deixava ainda pior.
Ele estava mais tranquilo, com os braços em volta do meu pescoço e a cabeça apoiada em meu ombro. – Shh. Já vai passar meu amor. – Sinto ele amolecer algumas vezes ameaçando cair, mas logo ele volta a se firmar resmungando algo. – Dorme meu amor, a mamãe está aqui. – Não demora muito para que em fim ele caia de vez comigo o segurando apenas com um dos meus braços. Um dos médicos pega Enzo e o aparelho de minhas mãos e pedem para que eu saia.
Quando estou de volta novamente do outro lado da janela, vejo que eles colocaram o aparelho preso à cabeça dele, para que ele não acorde. Minhas pernas amolecem quando vejo um outro médico se aproximar com uma agulha enorme e enfiá-la na coluna de Enzo.
Precisei sair dali para não ver, caso contrário eu desmaiaria. O caso de Enzo era tão delicado, que a o medicamento quimioterápico teria de ser aplicado diretamente em sua medula. Se eu tivesse descoberto quando ele era mais novo teria evitado isso.
Me sentei em um banco antes que eu pudesse cair no chão. Minha mente girava como se estivesse em um carrossel. Fechei os olhos e tentando me lembrar o dia em que ele nasceu.
Flash Back
– Dulce, está tudo bem? – O senhor Lewis perguntou enquanto entra no escritório. Acordei sentindo algumas dores mas não poderia faltar ao emprego. Sabia que era normal dores como essa no último trimestre de gestação.
– Sim. – Forcei um sorriso sentindo uma pontada na coluna e minha barriga se enrijecer. – Tenho alguns relatórios pronto para entregar ao senhor.
– Obrigada querida. – Ele agradeceu. — Pode levar em minha sala em alguns minutos? – Assenti. – Trouxe meu café hoje? – Assenti novamente mordendo o lábio inferior. Ele sorriu grato e entrou em sua sala.
– Tem certeza que está bem? – Stephany, a secretária que se senta do outro lado da sala perguntou. Fiz um movimento positivo com a cabeça e enquanto acaricio a região embaixo da minha barriga volto a olhar os papeis e a organizá-los para entregar tudo em perfeita ordem ao senhor Lewis.Depois que verifiquei mais duas vezes se estava tudo certo, me levantei e fui em direção à sua sala. Senti uma pontada bem forte, mas segui firme meus passos. Ainda faltava um mês para que meu filho nascesse e me recusava que aquilo já estivesse acontecendo, talvez fosse apenas contrações de treinamento, já tinha tido algumas vezes.
– Entre. – Pediu o senhor Lewis depois de me ouvir bater na porta.Abri a porta e caminhei até ele colocando a pilha de papeis perfeitamente organizada em sua mesa. Geralmente entregava tudo na mão dele, mas uma pontada mais forte me impediu de fazer isso. Me curvei para frente pressionando a parte de baixo da barriga e foi nesse exato momento que senti um líquido quente escorrer por minhas pernas.
– Droga! – Falei entredentes e então gritei de dor. O senhor Lewis se levantou rapidamente e me ajudou a me sentar.
– Stephany, pode chamar uma ambulância, por favor? – Ele gritou indo até a porta depois voltou até mim. – Calma querida, está tudo bem. – Ele pegou um copo com água e me entregou, depois pegou uma revista e começou a me abanar como se eu estivesse sentindo calor. – Respira com calma, está tudo bem.
– Eu estou respirando. – Falei brava e ele riu. – Droga, droga, droga, tá vindo de novo. – Falei sei lá quantas vezes essas palavras me segurando para não deixar escapar palavrões de minha boca em local de trabalho. – Está doendo muito!
– A ambulância já está vindo. – Stephany vem ao meu encontro. – Deveria ter ficado em casa Dulce.
– Eu tinha que trabalhar.
– Ela tem razão, olha só pra você.
– Eu comecei não tem nem quatro meses não podia faltar. – Fechei meus olhos sentindo outra contração e quando dei por mim estava apertando a mão do senhor Lewis com tanta força que elas ficaram intensamente vermelhas, mas ele não se importou, apenas me abanava e me dizia para respirar e ter calma.
No hospital me levaram direto para a sala de parto. Eu já estava com oito de dilatação e achava que era apenas um alarme falso. Fizeram uma ultrassom em mim para verificar a posição do bebê e se tinha condições de ser parto normal. O Senhor Lewis me acompanhou na ambulância e eu pedi que Stephany fosse ao meu apartamento buscar as coisas de Enzo que já estavam arrumadas. Pressentimento materno nunca falha.
– Eu quero tomar um banho. – Pedi, ou praticamente gritei para a enfermeira, mas ela não me deu ouvidos. – Por favor. – Implorei.
– Agora não dá mais tempo menina, não seja tão dramática, toda mulher passa por isso. – Ela falou rude. Tive vontade de jogá-la na parede por me tratar assim. Reclamei com o senhor Lewis que entrou na sala de parto instantes depois e ele não deixou assim.A enfermeira foi logo transferida para outro departamento e substituída por um enfermeiro muito legal e compreensivo.
– Infelizmente não dá mais tempo. – Explicou ele. – O banho iria dilatar o que falta e o bebê escorregaria. Seria perigoso, mas olha, depois do parto eu mesma ajudo você a escapulir para um banho, prometo. – Ele sorriu. O obstetra mediu novamente a dilatação.
– Dulce, quando sentir vontade de empurrar, faça. – Ele instruiu.Não demorou muito para me agarrar à grade de proteção da maca e empurrar. Doía tanto. – Isso, você consegue. – O senhor Lewis me abanava mas ele mesmo parecia que ia desmaiar a qualquer instante. Resultado disso que um enfermeiro o levou para fora da sala.
– Eu não consigo. – Falei já sem forças depois de empurrar tantas vezes.
– Consegue sim. – O enfermeiro segurou minha mão. – Vamos lá, um dois três e força. – Eu o fiz.
– Isso Dulce, já estou vendo a cabecinha dele. – O obstetra falou apenas observando.
– Ah, eu não posso, dói muito. – Deixei meu corpo esmorecer, já não tinha mais forças.
– Pensa que em alguns minutos você terá seu bebê nos braços. – O enfermeiro me olhava. Ele era lindo, tinha os olhos azuis, e apesar de usar touca podia ver ser cabelo negro embaixo dela. – Eu vou ajudar você, tudo bem? – Assenti. Ele me deu uma toalha para eu morder. – Vamos lá, um, dois, três e de novo. – Fiz força enquanto ele pressionava minha barriga para baixo sem fazer muita força para não machucar o bebê.
– Está coroando Dulce, continua! – Eu continuei, mais e mais vezes.
– Arde, arde. – Gritei sentindo as lágrimas escorrerem.
– Já vai passar, você consegue. – O enfermeiro insistiu.
– Só mais uma vez e acho que já posso puxá-lo Dulce. – Insistiu o obstetra. Eu assenti e empurrei. Senti um alívio imenso quando ele puxou Enzo de dentro de mim. Minhas mãos tremiam, e eu quase não sentia meu corpo.O vi mexer em Enzo até que o chorinho fino começou. – Isso campeão! – Ergui minha cabeça para olhá-lo. Ele era tão pequeno, e estava muito branco, muito mesmo. O enfermeiro bonitão pegou Enzo e o levou para pesá-lo e limpá-lo. Fiquei observando tudo de longe e então ele me trouxe enrolado apenas em um lençol azul.
– Fala oi pra mamãe, garotão. – Ele falou enquanto me passava Enzo.
– Oi meu amor. – Falei baixinho enquanto ele berrava em meus ouvidos. – É a mamãe filho. – Beijei a cabeça dele. Ele era tão lindo, mesmo ainda pálido e enrugado como todos os outros recém-nascidos. Ele era perfeito. – Como está meu amor? Hum? – Eu não sabia se ria ou se chorava. Enzo se calou quando reconheceu minha voz.
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The Last Hope - Vondy
FanfictionÀs vezes, por mais que a gente tente fugir daquilo que um dia nos fez mal, o destino insiste em nos levar de volta ao ponto inicial. A gente se esconde, foge para lugares desconhecidos, tenta começar uma vida nova, apagar o passado e seguir em fren...