Capítulo 39 - O fim (1-2)

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(Segunda - e última - parte do final 1)

Tudo que eu havia estudado sobre Fisiologia não me permitiu ter nenhum fio de esperança a que eu pudesse me agarrar. Tudo havia acabado naquele maldito acidente e eu nem sequer me lembro da ultima coisa que dissemos um ao outro. E era inevitável pensar que ele estava assim por minha culpa, pois tentou fazer com que o impacto do acidente recaísse todo sobre ele.

Maldição, Louis. Por que?

Eu pude ver quando Rosa se levantou e foi em direção ao quarto, se debruçando sobre o peito de Louis e chorando, enquanto Geraldo afagava suas costas, também visivelmente emocionado. Eu estava sozinha ali. Tudo se desenrolava à minha frente e eu não conseguia me mover. Não conseguia nem ao menos ouvir minha respiração. Eu estava dormente.

Um buraco negro havia me sugado, onde eu não conseguia fazer mais nada além de olhar para Louis. Medir cada pedacinho livre dele e tentar absorver o máximo dele enquanto eu ainda podia. Pude sentir minha cadeira sendo empurrada, mas eu não conseguia esboçar nenhuma emoção. Não conseguia pedir que parassem. Eu não queria entrar naquele quarto, faria com que tudo fosse muito real.

Minha cadeira foi parada ao lado dele, enquanto Geraldo gentilmente puxou Rosa para se sentar na poltrona que ficava próxima à entrada.

- Vou buscar um copo de água para ela - sussurrou Geraldo para a enfermeira que nos acompanhava.

Mas nada mais me importava. Eu levei minha mão até minha barriga, me lembrando daquele pedacinho dele que esteve ali dentro e que também foi tirado de mim. Não restaria nada dele. E nada de mim. Uma grande parte do meu coração - senão todo ele - estava indo embora com ele. Apertei minha barriga, eu sentia ódio daquele bêbado estúpido que levou toda minha felicidade. Subi minhas mãos até a mão sem reação de Louis. Acariciei cada um de seus dedos grossos, me demorei seguindo as linhas de sua palma e apertei sua mão na minha.

- Você não pode me deixar aqui - minha voz saiu mais baixa que um sussurro. Ele não poderia me ouvir, isso não faria diferença. Nada mais importava. Me levantei de minha cadeira e me aconcheguei ao seu lado na cama, como havia feito nos últimos dias. Ninguém contestou, e a enfermeira inclusive me ajudou a me acomodar melhor. O cobertor nos envolvia e eu precisava ficar ali. Só precisava ficar com ele o máximo de tempo que fosse possível. Havia movimentação no quarto, mas nada me importava. Eu cerrei meus olhos e apenas fiquei ali. Meu garoto grande, meu menino, meu homem - meu amor. Ele agora não seria nada meu mais, além da mais agridoce lembrança.

Fiquei apreensiva quando precisei me separar alguns quilometros dele e agora eu precisaria literalmente reaprender a viver sem ele. Em ausência total. Sem sua voz, sem seu sorriso, sem mensagens de boa noite, sem seu calor. Nada mais daquilo que me mantinha forte e feliz.

Os momentos seguintes foram tão confusos que é difícil me lembrar com clareza se parar para pensar.

Eu estava sempre adormecida ou sonolenta, pois provavelmente me deram algum remédio para conseguir enfrentar toda essa situação. Eu sabia que Rosa e Geraldo já tinha decidido desligar os aparelhos, e doar os órgãos de Louis - uma atitude que eu tenho certeza de que ele ficaria feliz. Davi apareceu em algum momento e eu tive que dividir Louis com ele. Eu não saí mais daquela cama. Só me convenciam a sair de lá para tomar banho. Eles não iriam conseguir me separar de Louis. Não até o último momento.

O dia de desligar os aparelhos foi caótico. Houveram gritos, choros excruciantes e inconformados. E a maioria deles partiam de mim. Eu não poderia aceitar nada daquilo. Jamais entenderia ou perdoaria o que aconteceu. Fiquei com ele até o último segundo, até seu coração, forte como um cavalo, finalmente parar de bater. Foi o meu calor que ele teve até o final. Fui eu quem estive com ele até o final, pois era assim que tinha que ser.

Resplandecente - CompletaOnde histórias criam vida. Descubra agora