Capítulo 29 - A visita

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O ponto alto das férias e um dos momentos mais esperados por mim chegou: minha sobrinha viria passar uns dias comigo. Seria a primeira vez que ela iria ficar hospedada na minha casa e eu estava ansiosa para aquilo.
Julieta tem 6 anos e é a criança mais adorável e inteligente que eu conheço (apesar de eu não ter lá muita afinidade com crianças - exceto Julieta).
Posso dizer que ela é a minha (mini)pessoa favorita no mundo inteiro.
Ela chegou sexta a noite e ficaria a semana inteira comigo. Patrick ja tinha autorizado que eu a levasse  comigo para a Universidade nos dias em que ela estivesse aqui e ela adorou a ideia, claro.
Agora tínhamos um fim de semana inteiro para fazer muita bagunça. Brincamos de boneca, ela usou minha maquiagem para pintar nossos rostos de uma maneira um tanto curiosa, dançamos nossas músicas favoritas (ela gosta de muitas das músicas que eu ouço,  não é ótimo?). A noite eu a levei para brincar na pracinha e tomar sorvete.
Desde que a Julieta surgiu na minha vida eu venho tendo dúvidas quanto ao fato de ser tão obstinada a nunca ter filhos. Talvez pudesse dar certo, afinal. Eu me dava bem com a Julieta,  ela estava se tornando uma mocinha educada e aprendia muito rápido.  Ficar com ela faz parecer que não é um bicho de sete cabeças ter um filho no final das contas.
Mas daí eu me lembro de tudo que pode dar errado em uma gravidez, de todos os fantasmas que povoam criar outro ser humano nos dias de hoje, e minha convicção retorna.
Eu vou aproveitar o quase escasso lado materno que há em mim para fazer de Julieta uma boa pessoa.
Estávamos sentadas na sorveteria quando ela me surpreendeu
- Eu quero ir ver o tio Louis e os cachorrinhos dele.
Pude sentir meu coração disparando. Lembro como se fosse hoje quando Louis e Julieta se conheceram.

Minha mãe havia vindo passar um fim de semana na minha casa e trouxe Julieta.  Elas finalmente iam conhecer Louis e todos estavam ansiosos.
Ao chegar e ver Louis, Julieta ficou tímida, como sempre ficava ao conhecer alguém pela primeira vez. Logo depois ela se acostumou a presença dele e, quando me dei conta, ela já estava no colo dele, trocando sorrisos de cumplicidade que demonstravam que eles seriam bons amigos.
Não é necessário pensar demais para saber que naquele momento meu coração estava explodindo, vendo aquele homem enorme segurando aquela menininha magrelinha no colo.  Meu instinto materno (que eu nem lembrava que tinha) gritava dentro de mim, imaginando que Louis seria um ótimo pai algum dia.
Esse tipo de pensamento me deixava extremamente confusa.
Naquele fim de semana Louis dormiu em sua casa, pois acima de tudo ele queria respeitar a presença da minha mãe e aquilo só me fez amá-lo ainda mais. No domingo ele levou Julieta para conhecer seu dois cachorros, pois ela adorava bichos de estimação. E, mesmo que tenha sido só uma visita, o fato de ela ter lembrado dele e dos cachorrinhos dele me fez feliz
- O tio Louis não está aqui na cidade, meu amor - ela fez um biquinho com a noticia - mas eu posso te levar pra ver os bagunceiros amanhã, pode ser? - pude ver seus olhinhos brilhando.
- Ebaaaa - ela gritou fazendo uma dancinha da vitória.
Louis me deixou uma cópia da chave da casa dele exatamente para que eu cuidasse de Lock e Thor, seus dois enormes cães de estimação. E agora teria Julieta para me ajudar nessa tarefa.
- Mas o tio Louis vai demorar pra voltar? - ela me perguntou e o fato de eu não saber responder a aquela pergunta com certeza, fez um curto silêncio se instalar.
- Eu espero que não, mas eu não sei. Uma hora ele volta... - tentei parecer positiva e sorrir pra ela que, demorou mas retribuiu.
Aqueles olhos cor de mel podiam pertencer a uma criatura que viveu pouco e sabe quase nada sobre a vida, mas ela não deixava nada passar desapercebido.
- Ele vai mesmo voltar, né, tia Jesy?
- Claro que vai - respondi rapidamente e voltei minha atenção ao meu sorvete. Não queria que ela visse a tristeza que se instalou em meus olhos quando lembrei que já fazia duas semanas que não via Louis.
- Esse sorvete ta uma delícia,  né? - resolvi mudar o assunto antes que eu me engasgasse com o nó que se formou em minha garganta.
- Tá sim. Uma delícia.  Se eu pudesse eu tomava sorvete todo dia. Pena que não pode, ne? Eu queria ser dona de uma sorveteria! - ela falava tão rapidamente e tao séria que eu não me aguentei e estava gargalhando no meio da sorveteria.
Ela enrugou a testa, cerrou os olhos, colocou as mãos na cintura e me fitou muito séria
- Do que você ta rindo?
- De você,  pequena. Tô rindo de você! 
- Ruuuuum - ela reclamou, mas acabou liberando um sorriso e voltando a meleca que havia se transformado o sorvete a sua frente.  Era impressionante a capacidade que Julieta tinha em transformar seu sorvete em meleca. Sempre foi assim.

Saquei meu celular, tirei uma foto dela toda concentrada no sorvete e enviei pra Louis
"Olha quem acabou de dizer que está com saudade de você, tio Louis"
Enviei sabendo que a resposta iria demorar a chegar. Louis só vinha conseguindo me responder uma vez ao dia, pois o estágio estava puxado. Ele estava fazendo plantão e era o segundo fim de semana seguido que ficava incomunicável. Por isso eu nem me preocupava em mandar muitas mensagens. Eu apenas esperava estar online ao mesmo tempo que ele quando finalmente ele me chamasse.

No domingo logo pela manhã fomos cuidar de Lock, um enorme Pastor Belga que o que tem de grande tem de sem vergonha. E Thor, um Border Collie preto e branco que é pura carência, educação e fofura. Julieta se apaixonou por Thor, assim como eu, que já o adorava. Ele era mais manso, mais amoroso e mais calmo. Lock parecia-se com uma força da natureza e aquilo era perigoso,  já que ele era muito maior que Julieta. Sorte que ele resolveu obedecer e ficou quieto comendo enquanto Thor recebia muitos carinhos no pescoço. Tive que ficar de guarda enquanto vigiava para que Lock não atrapalhasse o momento de carinho entre Julieta e Thor. Naquele momento, olhando a carinha alegre dela enquanto Thor se deitava de barriga pra cima esperando as mãozinhas dela fazerem mais carinho, eu senti um tipo de plenitude que não sentia há tempos.  Esse momento só era interrompido quando precisava afastar o monstro Lock. Ê, cachorro indecente!

Louis só me respondeu domingo a noite. Julieta já estava dormindo e nem pôde conversar com ele. Ela havia lhe mandado um áudio perguntando "Onde você está? Quando você volta?"
E Louis havia mandado um audio com ordens expressas de que eu o mostrasse a ela quando ela acordasse.
Ele disse "Eu estou num lugar muito bonito que chama Rio de Janeiro, mas não posso ir embora ainda. Por isso, você precisa cuidar da tia Jesy pra mim, ta? Quando eu chegar eu vou te visitar, viu? Prometo!"
Louis nunca havia ido até a cidade onde minha mãe morava com Julieta. Mesmo eu odiando aquela cidade eu sentia algo estranho ao pensar em ir até la com Louis.  E o fato de ele ter proposto essa visita por conta própria me deixou um tanto contente,  pois significava que ele ainda fazia planos que me incluiam em sua vida. Conversamos por longos minutos, contei a ele nosso amor por Thor e ele riu dizendo que ele é mesmo o mais carente.
Ele me contou sobre os plantões,  os casos que apareciam e as emergências. Eu ouvia tudo que ele dizia com devoção,  aproveitando cada palavra.
Conforme o tempo passava, a saudade ia criando raízes mais profundas e serão necessárias muitas doses de Louis para dissolvê-las. Eu só espero não ser sufocada por elas antes que ele volte.

Segunda feira foi um dia relativamente tranquilo na universidade. Julieta me ajudou a cuidar dos animais do canil e ficou sentada, comportada e em silêncio durante os atendimentos. Todos a adoraram, dos professores aos funcionários, e eu me sentia orgulhosa como uma mãe vendo como ela se dava bem com todos e encantava por onde passava.
Quando mostrei o áudio de Louis para Julieta, ela teve duas reações ótimas: deu pulinhos de alegria repetindo "o tio Louis vai me visitar" e pegou o celular da minha mão pra responder que ia tomar conta de mim direitinho.
Essa menina é uma fofura ambulante!

No fim da tarde fomos à academia. Pedi autorização e pude levar Julieta comigo. Não podia perder o ritmo logo agora que os resultados estavam pipocando.
Além disso, ela adorou o ambiente. Andava na esteira,   pulava na frente do espelho, brincava com as bolas especiais de exercícios e nem víamos a hora passar.

Ao cair da noite ja estávamos as duas jogadas na cama, com os cabelos recém lavados, relaxadas e assistindo pela enésima vez a algum dos filmes sobre as Crônicas de Nárnia. Cochilei no meio do filme e nem vi quando Louis me mandou uma mensagem.
Só fui ver no dia seguinte. 

E agora me odiava por não ter ouvido o celular...

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