Quando deu o horário de sair desci as escadas saltitante, avistei a Tati de longe, corri, pulei nela, e olhei para a pessoa com quem ela estava conversando, que para minha surpresa era a Joyce.
Cumprimentei ela com a cabeça e falei:
- Tá pronta?
- Tô sim, só vim avisar a Joyce. - Ela se despediu e fomos saindo da escola.
- Porque tinha que avisar a novata? - Questionei-a.
- Porque a novata é minha prima por parte de pai.
- Oi? Hahahah, sério isso?
- Sim Madu, onde ela morava o ensino era bem fraquinho, meu pai ofereceu a nossa casa e indicou a escola, agora ela tá morando com a gente.
- Nossa eu nunca iria imaginar.
- Eu sei, a genética não foi tão bondosa comigo.
- Pois eu acho bem mais legal esses seus olhinhos minúsculos. - Fiz ela se corar toda. - Eai, vamos tomar um sorvete? Tem uma sorveteria bem perto daqui.
- Pode ser. - Fomos em direção à sorveteria. Quando chegamos lá me acabei no chocolate com menta e ela me seguiu no sabor. Sentamos pra comer e voltamos a conversar.
- Mas eai como foi o final de semana? - Perguntei.
- Ah foi normal. Só sai para uma festa com a Joyce, pra ela se entrosar mais. E o seu Madu, como foi?
- Pra ser sincera, foi bem maluco.
- Opa, quero saber. Torne minha vida mais emocionante. - Olhei pra ela e ri. Tava toda desinibida, gostei bastante.
- Bom, pra começar, eu fui para o sítio com as meninas. E eu bebi demais. Conheci um carinha. Falei várias merdas como de costume, cê sabe né? - Ela deu risada.
- Não, me conta melhor sobre isso.
- Ah sou eu né, mais intrometida que tudo, sempre gosto de saber demais, de falar demais...
- É Madu, você é uma louquinha tagarela mesmo. - Ela disse comendo uma colher do soverte e sujando levemente seu queixo. Mas como não sou clichê e não iria ceder ao fato/tentação de limpar para fazê-la olhar pra mim, só a alertei.
- Parece criança comendo, tá toda suja. - Ela viu sem graça e limpou.
- Meu Deus você é muito direta, me ensina?
- Não, só profissionais da área podem atuar. - Nos duas rimos e terminamos o sorvete.
Resolvemos sentar na praça até a fome bater e irmos pra casa.
- Maria, sabe porque te olhei tanto quando chegou na escola? - Ela me disse daquele jeito todo contido.
- Não, e eu sempre me questionei sobre isso. - Falei olhando nos olhinhos dela.
- Porque você chegou tão diferente das outras meninas. Tão cheia de si, parecia tão madura e firme. Me levantou uma pulguinha atras da orelha.
- Eu madura? - Dei risada. - Não Tati, não mesmo. Mas você também me deixou com uma pulguinha atras da orelha. Afinal, seus olhinhos conseguem devorar um vivo. Tão peculiar. Sua singularidade transborda quando se olha nos olhos.
- Sua intenção é me deixar mais sem graça do que geralmente sou?
- Sempre, isso é um dom.
- Você é tão palhaça.
- E você é tão mistério. Sério que às vezes fico tentando te desvendar quando tá perto.
- Não sou mistério, só sou muito comum.
- Comum? Menina, você é tão quieta que dá até medo às vezes, e do nada abre esse sorriso, me faz rir, transparece alguém a ser desvendada.
- O que vai desvendar de alguém que não faz nada, que não tem nada de tão único.
- Quem te disse essa asneira? Olha pra você menina. O jeito que mexe no cabelo, que se veste, que sorri, que fala. É única. - Falei. Ela abaixou a cabeça e colocou o cabelo atras da orelha.
- Aí Madu, você é muito besta.
- E você gosta de falar isso...
- Claro, você gosta de me deixar sem graça.
- Pagou pelo show, agora aguenta.
- Ah paguei?
- Já disse. Quem mandou ser toda cheia de mistérios.
- Queria me achar assim tão peculiar, me sinto e sou tão comum.
- To vendo que pra te situar da real vou levar mais de uma tarde... Mas afinal, fiz cair por terra o seu interesse pela garota madura do primeiro dia?
- Eu estou aqui ainda, não estou... - E dessa vez ela que me fez sorrir.
- Deixa então eu te contar sobre meu final de semana mágico... - Passamos a tarde lá falando sobre.
Eu contei pra ela tudo que rolou. Afinal, ela me transpareceu alguém de muita confiança desde o começo e eu sabia que podia contar com ela. E dito e feito, ela conseguiu me confortar de maneira única, escutou calmamente tudo o que eu tinha pra falar e me aconselhou de maneira mais sutil possível.
Disse que era legal eu estar interessada em alguém mas pra tomar cuidado pra não me machucar. Tão cautelosa. Ela também me contou sobre a tal festa que foi. Disse que nem ficou muito e que na real não curte muito festas, algo que eu já tinha notado, mas a Joyce gosta bastante então ela foi pra acompanhar.
Contou dos irmãos dela, da casa dela e de como tá se matando de estudar pro vestibular. E eu me encantei mais ainda com tamanha dedicação e entusiasmo. Ela era maravilhosa, daquelas que te fazem ficar cuidadosamente escutando sem dar um pio para não estragar a forma majestosa que se coloca. Eu tava perdidinha, mas ainda assim adorando ter alguém ali tão diferente de mim. Depois de tudo, ela conseguiu deixar meu coração bem tranquilo. Foi uma tarde ótima.
Quando já estava anoitecendo levei ela até em casa e fui para a minha. Cheguei e jantei com meus pais. Minha mãe reclamou de dor, o que me deixou meio assustada, afinal vai que aquela criança cisma de nascer agora, do nada.
Enfim, fui para o meu quarto e sorri de orelha a orelha quando peguei no celular.Ficamos conversando a noite toda. Falando das merdas que havíamos feito naquele final de semana e outras coisas mais, como o fato dele vir pra cá me ver e me trazer bastantes docinhos.
A saudade aumentou ainda mais.
Sim, aquele menino estava me deixando abalada. Assim como a Tati ainda me deixava abobada.
Eita confusão.
E pra variar um pouco, mandei mensagem para o Marcos. Estava com saudades de rir das merdas dele. Contei pra ele que tinha ficado com o Pietro e ele aparentemente curtiu a ideia de eu estar feliz e empolgada por alguém novo. Conversamos durante toda a madrugada também. Estava me sentindo acolhida de maneira geral. Aquela tarde com a Tati, essa sensação gostosa de ter realmente interessado o Pietro e ainda tendo o meu melhor amigo do lado. O que mais eu iria querer?
Dormi sorrindo, afinal não são todos os dias que se encaixam perfeitamente como o dia que passei, e isso era maravilhoso.
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A vida de uma pré-adulta reclamona, nariguda e emergente.
Ficção AdolescenteMadu. Dezessete anos. Cidade pequena, sonhos grandes. Entre tropeços e apresso na escada da vida. Paixões, pressões e emoções. O que esperar de uma quase vida adulta logo a frente? Um tombo maior ainda!!