A Cara de Coruja havia passado por mim no corredor acerca de cinco horas e, para a minha surpresa, em vez de mostrar aqueles dentes – agora um pouco menos tortos – apenas abaixou a cabeça e virou à direita, abraçada à sua habitual montanha de livros. É sério, ela acabaria com um problema de coluna daqueles se não desistisse de arrastar aquelas porcarias para tudo que é canto, para cima e para baixo.
Era evidente que ainda estava brava comigo. Assim como era evidente que não tinha compreendido que eu estava apenas tentando protegê-la, evitar o pior. Arran não bateria nela, por mais imbecil que fosse nunca encostaria a mão em uma garota. Mas existem coisas que podem machucar tanto ou mais que um soco na cara; palavras, por exemplo. Preferia nem pensar no que ele teria dito a ela caso não tivesse intervindo. Arran a teria massacrado.
─ A senhora vai me ajudar ou não? ─ perguntei com as mãos cravadas no tampo da mesa, um pouco inclinado para frente, enquanto esperava por uma resposta.
Não estava em um dos meus melhores dias e, para completar, a sra. Dolittle não cooperava. Em vez de me ajudar a encontrar o livro que o professor indicara, ela continuava com os olhos grudados em um romance, O Duque de Alguma Coisa, não dava para ver direito porque seus dedos gorduchos escondiam boa parte das letras vermelhas. Mas também não importava, a única coisa que importava era pegar Noite de Reis e dar o fora dali antes de começar a espirrar.
─ Eu já disse. Quinta estante, entre Macbeth e Sonhos de Uma Noite de Verão.
Bufei impaciente.
─ O que custa à senhora levantar daí e trazê-lo para mim?
Ela abaixou o livro e respirou profundamente, me olhando de cima abaixo com aquela cara de fuinha retorcida. Desgrudei as mãos do tampo da mesa e estiquei a coluna.
Apesar do que possa parecer, eu simpatizava com a sra. Dolittle. Ao contrário da maioria dos funcionários do Madison, ela não ficava me bajulando, era franca e não abaixava a cabeça quando provocada. Uma vez ela me disse que seus valores não estavam à venda. Aprendi a admirá-la por isso, não conhecia muitas pessoas cujos valores não pudessem ser barganhados. A sra. Dolittle era um espécime em extinção.
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Viola e Rigel - Opostos 1
Teen FictionSe Viola Beene fosse um cheiro, Rigel Stantford taparia o nariz. Se ela fosse uma cor, ele com certeza não a usaria. Se fosse um programa de TV, ele desligaria o aparelho. Mas ela era apenas uma maluca expansiva e sorridente que infernizava a sua vi...