Leinad pediu a pizza, como havia dito que faria. De repente eu já não me sentia mais tão segura naquela casa. Não com ele. Fingir que estava tudo bem foi mais difícil que eu esperava, eu simplesmente não sabia mentir. Quer dizer, mentir era fácil, o difícil era lidar com a culpa que aumentava a cada sorriso falso e forçado que eu cedia a ele.
Enquanto comíamos em silêncio, deixei que meus pensamentos navegassem até Dominic... Ele estaria me procurando nesse momento? Mary talvez o tivesse pego. Ou quem sabe, John e ele estivessem em perigo... e eu ali. Sem fazer nada para ajudar.
- Quero procurar meus amigos. - falei no tom mais casual possível.
- Como?
- Quero ir atrás de Dominic e John. Agora.
- Eles não sabem com o quê estão lidando, é mais seguro que você fique comigo... Mas não se preocupe, eles estão bem.
- Desde quando passou a decidir o que é mais seguro para mim ou não é? Eu já sou grandinha, sei me cuidar.
Dizendo isso me levantei, Leinad me encarou, sua expressão indecifrável.
- Para que lado fica a cidade? - peguntei.
- Você não vai sair daqui, Analu.
- Não estou pedindo permissão.
Leinad suspirou pesadamente e se levantou.
- Eu sei que ouviu o que eu estava falando ao telefone. Sei que está assustada e confusa, mas você precisa confiar em mim.
- Confiar em você? Nunca.
- Não tem motivos para isso, eu sei, sei que desde que entrei na sua vida só lhe causei problemas... Sei que seria melhor para você se nunca tivesse me conhecido... Mas precisa confiar em mim uma ultima vez, me deixe salvar você.
Leinad se aproximou e tocou o meu rosto com a ponta dos dedos. Meu corpo se aqueceu com o toque suave, e como resposta, fechei os olhos, e as mãos de Leinad percorreram o caminho até as pontas do meu cabelo. Senti que ele brincava com meus cachos, exatamente como... Daniel.
- Eu fiz um acordo com os arcanjos, mas mentiram para mim... Quebraram a promessa, e isso significa que eu não vou seguir as regras. Olhe para mim Analu.
Abri o meus olhos no momento em que as palavras saíram da boca dele. Leinad me fitava, os olhos marcantes, já não pareciam mais tão claros como da primeira vez que eu os havia visto.
- Eu não sei o que vai acontecer agora, não sei como vamos ficar... Não faço ideia do que eles farão comigo, mas eu prefiro enfrentar tudo isso, do que perder você. - ele disse, a voz grave e tensa, e foi a primeira vez que vi uma sombra de preocupação em seus olhos - Você é a unica coisa certa, dentro das infinitas coisas erradas que existem dentro de mim.
Eu não conseguia responder, não conseguia me mover... Meu coração pulsava, movido por um sentimento estranho. Meu Daniel estava ali, bem na minha frente. E esteve ali o tempo todo, cuidando de mim, quando pensei que ele tivesse me abandonado para sempre. Eu havia fantasiado a volta de Daniel milhares de vezes desde sua partida, mas nunca, nem por um segundo sequer... imaginei que seria daquela forma. Sim, eu tinha minhas dúvidas, meio que já desconfiava dessa possibilidade. Mas com ele ali, sólido e firme, era muito mais real e importante do que era a algumas horas atrás.
- Por favor, me diga alguma coisa... - Daniel falou gravemente - Não sei quanto tempo temos, e eu preciso saber o que está sentindo... preciso ouvir ao menos mais uma vez que você me ama, preciso que... me veja, não como Leinad, mas como Daniel... a pessoa que eu nunca devia ter deixado de ser... Preciso que, olhe para este corpo, e me veja, aqui dentro.
Toquei seu rosto, dessa vez ele fechou os olhos, e tentei imaginar o rosto de Daniel ali, e me dei conta de que... eu já não sabia ao certo qual era o rosto de Daniel... Os olhos escuros, cabelos negros... era tudo de que eu conseguia me lembrar. E embora eu não conseguisse olhar para aqueles olhos azuis e cabelos loiros e chamá-lo de Daniel, eu sabia que era ele.
- Ei, não chore...
E só então percebi que estava chorando, e quando ele me abraçou, os grandes braços em volta de mim, me senti inteira novamente.
- Daniel, eu... eu...
- shh... tudo bem, meu Anjo. - Ele suspirou - Eu te amo.
Assim que essas palavras saíram da boca dele, o clima na sala mudou. Era uma força ruim, muito, muito ruim. E eu a sentia como um cubo de gelo escorrendo por minhas costas.
Nicole passou pela porta, séria, não disse uma palavra até se aproximar de nós. Logo em seguida Mary apareceu, seguida por vários demônios, soube disso porque todos possuíam uma característica unica: cabelos e olhos negros como uma noite sem estrelas.
Estávamos cercados, não tínhamos para onde ir, nem para onde correr... O que quer que fosse que estivessem planejando, conseguiriam.
- Parabéns Nate. - Disse Mary - Conseguiu.
- O quê? - perguntei - O que ela está dizendo Daniel?
Ele fitou meus olhos, e percebi que pedia desculpas.
- Eu não vou voltar para o inferno, sou um Anjo agora.
- Você era um anjo, não é mais.
- Só se conseguirem me pegar. - Daniel disse, a voz ameaçadora.
- Viemos levar você, e vamos levar você. Lúcifer está ansioso para te encontrar novamente. Traidor. - dessa vez foi Nicole quem respondeu.
Um sentimento de raiva me perfurou como uma flecha. Um anjo, não é?
- E se eu me recusar a ir?
- Levamos ela.
E nesse exato momento cai no chão sem forças, estavam com algum tipo de controle sobre mim, e eu não fazia ideia de como... Meu peito queimava, como se eu estivesse sendo engolida pelas chamas de dentro para fora. Vi meu cabelo caído em meus ombros, literalmente, mudar de cor, ele estava se tornando negro. Negro como uma noite sem estrelas.
- Eu vou...
E foi tudo o que ouvi Daniel dizer, antes que eu perdesse a consciência.
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Anjos na escuridão
FantasyA vida de Analu parece perfeita, um namorado que a ama, um trabalho de que gosta, realizando finalmente a meta de tirar sua carteira de motorista... E principalmente, os anjos e demônios em paz entre si. Mas o que ela não contava era que uma revira...