"22"

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Era como se eu o tivesse perdido outra vez, e foi insuportável, cada segundo que se passou após isso... Só conseguia pensar em ligar para ele, mas eu já havia tentado meses antes, e muito provavelmente ele havia mudado de numero.

Meu coração batia com dificuldade, lutando para sobreviver ao espancamento que levara da vida... O que me fez pensar, quanto tempo mais eu aguentaria? O quanto o meu coração aguentaria?


Dei um breve sorriso amarelo para Edwart ao sentar, estávamos todos à mesa prontos para tomar o café da manhã e ir cada um para um lado.

- Bom dia Analu... - ele disse retribuindo o sorriso.

Não respondi e mordisquei um pedaço da panqueca que estava em meu prato.

- Teve um pesadelo ontem a noite? - Edwart perguntou tentando puxar assunto.

- Muito pelo contrário. - falei friamente só para magoa-lo - Sonhei com meu pai.

Dessa vez foi ele quem deu um sorriso amarelo.

- é mesmo? e como ele estava no sonho? estava bem?

Encarei o por alguns segundos antes de respirar fundo e colocar outro pedaço de panqueca na boca.

- não está com vontade de conversar não é?

Continuei o encarando sem dizer nada.

- Ana! - Edwart chamou.

- O que foi amor? - ela respondeu descendo as escadas com a bolsa nas mãos.

- o que houve com Analu? - ele perguntou me olhando assustado.

- Analu... respeite Edwart por favor! - mamãe disse num tom destraido.

Eu continuava a encara-lo.

- Ela parece meio... tem certeza que está bem? - ele tocou minha mão que estava na mesa, a puxei de imediato.

- Filha, ele está falando com você. - mamãe tocou meu ombro.

Mal me movi, os olhos ainda fixados em Edwart.

- Amor... - ele falou - é melhor deixar ela quieta, só está tentando chamar atenção.

Aquelas palavras despertaram em mim um ódio imenso, coisa que eu jamais havia sentido até aquele momento. As luzes da cozinha se apagaram quando me levantei, e Edwart foi arremessado para trás de um modo muito estranho, nada o havia empurrado. Mamãe soltou um grito quando as luzes se acenderam.

- Analu! - ela gritou - Filha... o que está havendo? seus olhos...

Ela me olhava aterrorizada. Mas naquele momento eu já não a amava como antes, ela era só uma mulher ajoelhada no chão ao lado de Edwart.

As luzes piscaram, e todas as portas e janelas da casa se fecharam num mesmo momento, fazendo um baque estridente que fez mamãe gritar.

Sorri.

Aquilo era tão divertido, tão incrível... eu podia sentir o medo exalando dos dois, e era perfeito. Aqueles olhares assustados me encarando, os gritos de pavor etc...

- Filha! - minha mãe gritou - seus olhos... eles estão negros... estão totalmente negros.

- Ana vamos sair daqui! - Edwart disse a puxando pelo pulso - vamos...

- Mãe... - falei - desculpa.

Eu lembrava de tudo, de ter jogado Edwart para trás, das luzes apagando e acendendo, das portas e janelas se fechando sozinhas... mas eu não fazia a menor ideia de como havia feito aquilo, e o pior, por quê eu havia feito? e como não senti nenhuma culpa?

Edwart segurou mamãe pelos ombros, eles estavam com medo de mim, e eu me odiei por ter feito aquilo.

- Os olhos dela! - mamãe disse - voltaram ao normal...

- O que tinha meus olhos mãe? - perguntei já chorando.

Ela abriu os braços me convidando para um abraço, corri até ela que me apertou e começou a chorar também. Edwart nos envolveu com seus grandes braços. E ficamos ali, abraçados por um longo tempo.


Nem mamãe e nem Edwart foram trabalhar naquele dia, eles ficaram em casa, o tempo todo juntos, e percebi que evitavam ficar sozinhos comigo... O que havia acontecido? Quem eu sou afinal de contas?

Liguei para Mariana e pedi que ela viesse até minha casa, e que entrasse pela janela, pois mamãe não a deixaria entrar depois do ocorrido. Minutos depois, Mariana estava sentada me olhando na expectativa.

- vamos... pode dizer - ela sorriu - como foi o encontro?

- foi péssimo, - falei - mas não é por isso que pedi que viesse aqui.

- ai meu Deus... o que houve?

- Hoje de manhã aconteceu uma coisa muito estranha Maria... - falei - eu não sei como, mas... acho que sou um demônio.

- por quê acha isso?

- Por quê eu machuquei o Edwart, e minha mãe disse que meus olhos estavam completamente negros... E agora os dois estão com medo de mim.

Ela baixou os olhos para o chão e suspirou profundamente.

- você é uma meio sangue... e acho que isso é normal, afinal, você é metade demônio também - ela sorriu - vamos conversar com John, ele vai saber te explicar melhor...

- não posso sair, mamãe e Edwart estão na sala... não vão me deixar sair depois do que aconteceu.

- está na hora de aprender a usar suas asas Analu!

- Asas? - perguntei - eu tenho asas?

- sério isso? você não sabia?

fiz que não.

- Por quê não posso vê-las? - perguntei.

- por quê ainda não as usou.. elas só podem ser vistas depois da "inauguração". - ela deu um sorrisinho.

- Você pode vê-las?

- não... do mesmo jeito que você não vê as minhas. - ela suspirou - só você pode ver suas asas, só eu posso ver as minhas, só John pode ver as dele etc...

- é sério? e como vocês voam por ai? as pessoas nunca viram vocês...

- enquanto voamos ficamos "invisíveis" aos olhos de alguns.

- quem pode vê-los?

- Os que realmente acreditam...

- acho que são bem poucas pessoas então, - sorri - e os anjos...

ela assentiu.

- então... vamos tentar? estou ansiosa por saber como são suas asas, se são negras ou brancas... - Mariana perguntou na expectativa.

- ah não... talvez outro dia... já tive muitas surpresas por hoje Maria, não sei se aguento mais uma. Pode dizer a John que preciso falar com ele?

- ok né... - ela balbuciou.

- e... antes, posso te fazer uma pergunta?

- claro!

- suas asas? como são? - perguntei.

Um grande sorriso se formou no rosto dela.

- Tão brancas quanto uma nuvem num dia de verão... - seus olhos brilharam.

- e são grandes?

- tão grandes que quando ando elas arrastam no chão.

Sorri ao imaginar.

- E como é? voar quero dizer...

- vai saber logo, vamos há um lugar afastado para testá-las qualquer dia desses... mas saiba - ela deu uma piscadela - Suas asas nunca vão falhar.



Anjos na escuridãoOnde histórias criam vida. Descubra agora