18. Sisnora

96 9 3
                                        

Pouco depois, os guerreiros desmontaram as barracas e voltaram à marchar. Kira e o rapaz atacado pela sisnora, cujo nome descobriu que era Blemvit, conversaram pouco antes de partir. O jovem ferreiro fez boms reparos na armadura, deixando-a quase nova e ficando até orgulhoso de si, embora os furos criados pelo veneno corrosivo ainda estivessem visíveis.


Cerca de quatro minutos passaram até o momento que Bak trotou até os cavaleiros com sua espada longa já em mãos.


- Vamos na frente, investigar as margens da estrada à procura de algo que possa oferecer algum perigo. - Avisou, pegando a maioria de surpresa. - Aposto um Escudo de Ouro que há alguma Sisnora espreitando por aí. Rapazes, avante!


E galopou. Alguns se entreolharam, Kira e outros logo sacaram suas espadas ou ergueram suas lanças. Fizeram seus cavalos acelerarem e, surpreendentemente, Feroz, o menor dentre eles, mas sem metal sobre o corpo, despontou na dianteira. Kira sorriu e apertou os dedos ao redor do cabo da espada longa. Era sua primeira tarefa, e mesmo sendo apenas para reconhecimento, ficou anormalmente empolgado.


Olhava para os lados totalmente atento, indo tão rápido que faltava pouco para alcançar Bak. O centauro estranhou, e quando o jovem percebeu, ordenou que Feroz reduzisse. Não era bom cansá-lo, mas, aparentemente, o cavalo castanho galopava quase tão animado quanto o dono.


Passaram um minuto inteiro correndo, até o animano na frente do grupo dar outra ordem.


- Saltem para as árvores! Matem qualquer ser que encontrarem! - E com um grande pulo atlético e perfeito, embrenhou-se na floresta à sua direita.


Kira obedeceu quase sem pensar, indo para a esquerda. Os demais se dividiram desigualmente e continuaram a corrida. Feroz, mais uma vez, tomava distância dos outros animais, vez ou outra raspando em alguns troncos.


Mais um minutos passou até Kira e aqueles que seguiam-no ouvirem um grito humano seguido por outro, mais agudo, raivoso e bestial.


O rapaz até assustou-se. Olhou por cima do ombro e viu todos com o mesmo semblante.


Puxou Feroz de volta para a estrada, apressado. Os cascos do cavalo tocaram o pavimento de pedras cinzentas por breves dois segundos, e entrou no lado oposto.


- Ei! - O rapaz gritou por qualquer um que pudesse responder.


Ainda perto das árvores, conseguiu discernir sombras de dois cavaleiros acompanhando-o pela estrada real, além de outros três atrás dele.


- Sisnora! - Ouviu um berro angustiado. - Socorro!


Outro grito monstruoso em seguida.


Kira apontou seu cavalo para a direção que vieram os sons. Já tenso, apertou os dedos em volta do punho da espada longa e se inclinou, pronto para um ataque em movimento.


E, de repente, encontrou um companheiro caído, fitando algo de olhos arregalados e arrastando-se, apressado, para afastar-se.


Seu cavalo, também no chão, relinchava em agonia e desespero, debatendo-se de dor: A sisnora esverdeada cravava garras e presas em seu estômago, comendo sua carne, sorvendo seu sangue e ao mesmo tempo inoculando veneno para dentro do animal.


Kira não se intimidou, manteve-se em posição. Mas Feroz, sim. O cavalo relinchou e empinou, atraindo a atenção da animana.


Três cavaleiros passaram por ele em seguida, e o ser meio-cobra, meio gente, escancarou a boca ensanguentada e gritou.


Feroz tocou o chão novamente. Kira guardou a espada e puxou com toda sua força o rapaz para trás de si. Deu meia volta e retornou para a estrada o mais rápido que pôde. Ao sair de debaixo das árvores, viu Bak e o restante do grupo.


- Senhor! - Ele chamou. Parou perto do centauro. - Aquela sisnora atacou novamente, perdemos um cavalo!


- Sim, eles me informaram. - Apontou para os rapazes ao redor, igualmente preocupados, mas que deixaram o companheiro para trás. - Devíamos ter matado aquela maldita quando tivemos a chance. - Pensou consigo mesmo por três segundos. - E agora não deixarei passar. - Brandiu sua espada longa. - Voltem para o acampamento.


- O quê?! - Foi a pergunta comum entre todos.


- Voltem e avisem Endrik. Vou cuidar disso.


E correu para as árvores.


Kira pensou um pouco.


- Desça. - Ordenou para o rapaz atrás dele.


- Ahn? - Estranhou, choramingando.


- Desça! - Falou mais alto. Impaciente, fez Feroz disparar e o empurrou, derrubando-o.


Decidiu que não deixaria Bak para trás, nem aqueles que distraíram a sisnora para que conseguisse fugir.


Mancharia a lâmina de sua espada com sangue verde, ou teria sua armadura muito pior que a de Blemvit.




Fazia parte de seu teste, mas enquanto cavalgava, Bak arrependeu-se um pouco de ter tomado a decisão de lutar sozinho contra a sisnora. Principalmente quando lembrou que ela matara um cavalo.


Ficou surpreso ao ver Kira aproximando-se.


- Senhor!


- Rapaz, eu mandei...


- Deseja mesmo lutar sozinho contra aquilo? - Estranhou. - Deve ser mesmo muito habilidoso, mas ainda é arriscado.


- Mas...


Um grito histérico e agudo fez tanto seu corpo humanoide quanto equídeo tremelicar. O centauro se encontrou à menos de cinco metros da animana, que banqueteava-se com o cadáver do cavalo. Ao notá-lo, ergueu-se sobre a enorme cauda e abriu as longas garras.


Sem poder frear, Bak pulou em cima dela de espada erguida. A sisnora conseguiu esquivar da lâmina, mas ainda foi atropelada.


Kira saltou de seu cavalo puxando rapidamente seu escudo circular preso ao lado da sela. Deu uma cambalhota para aliviar o impacto da queda e correu até ela, desnorteada, levantando a pesada espada longa apenas com a mão esquerda.



O instinto de auto-preservação sentiu a aproximação e ela recobrou-se rapidamente. Girou e agitou a cauda, descendo-a como um grosso chicote verde de seis metros de extensão.


O membro atingiu Kira no peito e o arrastou consigo para o lado. Feroz fugiu. Bak deu a volta para o segundo ataque.


O jovem cavaleiro, arremessado, rolou três vezes no chão. Por sorte, não se chocou contra nenhuma árvore. Levantou-se com dificuldade, erguendo o escudo. Sua inimiga serpenteava em sua direção lenta e assustadoramente, rastejando em ziguezague, sibilante, usando os braços como apoio. Os olhos amarelos estavam arregalados e as pupilas verticais, vidradas.


Bak passou por ela como um raio, pisoteou sua cauda, e com um movimento de espada, cortou fora boa parte do membro. A sisnora berrou e mirou sua atenção para ele.


Kira não perdeu a oportunidade. Avançou e cravou a espada longa, pesada e péssima para o tipo de combate, na cabeça da animana.


Ela gritou histericamente, muito mais alto que antes, um som esganiçado de pura dor e fúria. Se contorceu completamente, tentou se virar para o rapaz, movendo as garras, arranhando-o, mas o pescoço torto não permitiu. A lâmina foi afundando ainda mais.


Em poucos segundos de agonia, seus braços descansaram e ela desabou.


O Bastardo da RainhaOnde histórias criam vida. Descubra agora