"Parte 8"

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 À medida que os encarnados iam chegando, tomavam o seu lugar, ao derredor da mesa, e entravam em preparação, mergulhando na meditação e na prece.

Eram exatamente vinte horas, presentes todos os tarefeiros encarnados, quando o sr José abriu o trabalho, com comovedora prece em benefício daqueles que sofrem,especialmente sob a espada impiedosa, e quase sempre traiçoeira, dos processos de vingança, que resultam nos casos de obsessão. Orlando, seu protetor, estava ao seu lado, e lhe inspirava as palavras, que fluíam carregadas de forte emotividade, atraindo a resposta do Alto, pois, suave melodia encheu o ambiente e flores de luz despejavam-se sobre os presentes, formando uma festa de claridades e vibrações sublimes

.Estavam presentes entidades de elevada hierarquia, algumas com tarefas a desempenhar no programa de assistência, outras interessadas na solução de casos particulares,relativos a processos dolorosos com pessoas queridas, constantes da pauta.Finda aprece, e transcorridos alguns minutos, após o êxtase que a chuva de luz provocou em todos, percebi que o sr José tinha as suas faculdades em fase d e intensa ampliação, vendo e ouvindo o plano espiritual coexistente. Orlando, expressando a direção espiritual dos trabalhos, falava-lhe, baixinho, junto ao ouvido, dando-lhe as instruções iniciais.orlando postou-se junto à médium inconsciente, a fim de assisti-la, nos momentos do transe, ajudando-a no controle da instrumentação física, que seria cedida aos comunicantes. Permaneci ao seu lado, observando.

Nisso, dois integrantes da equipe espiritual, mantendo fortemente presa,tomando-a pelos braços, aproximaram uma senhora, de expressão dura e em agitado estado de revolta, para o contato inicial com um dos médiuns conscientes presentes, um jovem de cerca de vinte e cinco anos. Colocaram a mulher ao seu lado, do lado esquerdo,e, enquanto um mantinha o médium sob a sua ação magnética a fim de adequar-lhe o campo vibratório ao estado da comunicante, o outro atuava sobre esta de modo a acalmá-la e ajustá-la melhor para o intercâmbio.Em breves minutos, parecia que o perispírito do médium e do Espírito se interpenetravam parcialmente, com destaque para a região das espáduas, onde se notava uma ligação mais forte, e a cabeça do medianeiro.

- Deixem-me em paz! Que querem de mim? - gritou o Espírito, pela boca do médium.

- Seja bem-vinda, minha irmã - falou o sr José , com suavidade, creio que já nos conhecemos da casa da nossa desventurada amiga Carmem, que você mantém sob terrível processo de vingança, aniquilando-lhe as forças e provocando-lhe os mais incríveis contratempos. Por que isso, minha irmã? Não sabe, você, que o mal que semeamos se abaterá, mais cedo ou mais tarde, sobre nós mesmos? Se essa irmã lhe ofendeu,perdoa, e, com isso, você será bem mais feliz, desfrutará de um prazer mais legítimo e suave, que vem do amor.

- Como você disse, ela semeou e está colhendo. É a lei que está se cumprindo -redarguiu a senhora opressora, firme e impassível.

Mas, a lei, para se cumprir, não necessita que nos vinguemos. A Justiça Divina,que acompanha os nossos atos, tem recursos para punir os culpados, sem as chamas do ódio que não resolvem o processo. Aí está o seu equívoco, minha irmã -sentenciou o doutrinador.

- Balela. Ninguém vinha castigá-la e, por isso, resolvi eu mesma infligir-lhe o castigo.

- Mas, na verdade, quem está sendo mais castigada é você. Veja, que, mesmo sendo Espírito, com o Universo à frente, ainda está arraigada à carne, presa à nossa irmã infeliz, talvez mais infeliz do que ela, pois, enquanto aquela resgata uma provável dívida, você está contraindo outro pesado débito. E esse estado de ânimo, essa angústia, essa tristeza em que você se consome, sem a mais ligeira fresta para entrada de luz e alegria, que a reduz, praticamente, a um estado de animalidade,pode ser chamado de felicidade? Vamos, minha amiga, liberte-se...

-Esse é um problema meu. O ódio, hoje, me alimenta, é a minha motivação e o meu universo. Nada mais quero do que fazer justiça e, como disse, uso as minhas próprias mãos porque não apareceu, em meu socorro, a justiça de Deus.

- Não diga isso, minha irmã. A justiça de Deus é perfeita. Discuta comigo o seu caso. Vamos examiná-lo com serenidade e, garanto, você vai mudar de idéia. Diga-me,como nasceu esse ódio.

- Pois bem! Você vai ver que tenho motivos de sobra para a cobrança de faço.Essa víbora, era minha irmã, dez anos mais nova do que eu. Quando morreram os nossos pais, e ficamos órfãos, eu fiquei no lugar deles e acabei de criar essa ingrata,como se lhe fora mãe. Quando casei, levei-a comigo, para o meu lar, junto ao meu marido. Pois veja que essa ingrata se enamorou dele e passou a envolvê-lo de mil maneiras sem que eu percebesse, e sem que ele se dispusesse à infidelidade. Essa serpente trabalhava num hospital, no setor de enfermagem, e se aproveitando da oportunidade de fazer-me curativos na cabeça, em razão de um corte profundo, que ganhei em uma queda, aplicou-me uma gaze impregnada de material contaminado com puz. A infecção se manifestou violentamente e, quando meu marido procurou o médico, era tarde demais. Deixei-lhe o campo livre e, é fácil imaginar, estando os dois sozinhos, acabaram se casando. Quando vim a descobrir a trama, brotou em mim este ódio imenso e, desde então, me agarrei a ela, e não a deixarei até que desencarne...

- Esse tipo de conflito, minha irmã, sempre tem ligação com o passado. Vou pedir aos nossos Amigos Espirituais para que levantem o véu do passado, e mostrem os fatos que estejam relacionados com esse drama atual.O sr José recomendou ao grupo de apoio que fornecesse material, mentalizando,diante do Espírito comunicante, uma tela fluídica.

Dentro em pouco, cada um passou a expelir matéria esbranquiçada, que era recolhida pelos Espíritos instrutores que manipularam uma tela de mais ou menos, um metro por um metro e vinte centímetros.

A senhora comunicante acompanhava tudo com muito interesse e algum espanto,quando, de repente, a tela se transformou num quadro vivo, como se fora cinema,onde ela se movimentava, dentro da noite, acompanhada de um homem, de condição inferior e olhar sinistro. Chegaram a uma casa de vastas proporções e abrindo aporta,deu entrada ao homem, que se esgueirou, sorrateiramente, entrando no quarto onde dormia uma jovem de seus quinze anos. Acercou-se dela e, num golpe ultrarrápido,envolveu-lhe no pescoço um cordel que levava em mãos, e estrangulou-a sem que pudesse esboçar qualquer defesa, ou proferir qualquer palavra. Dir-se-ia que morreu dormindo. 

Enrolou a menina num lençol, jogou o fardo no ombro e, passando pela senhora, que lhe entregou uma bolsa, saiu dentro da noite, enterrando o cadáver distante da casa, em pequeno capão de mato, onde ninguém iria descobrir.A senhora era tia da jovem, e amante de seu pai, desde que lhe morrera a esposa.Apesar de viúvo, recusava a casar-se por causa da filha, que adorava a mãe e tinham a lembrança sempre viva. A tia pensava, também, na fortuna que adviria da herança e que lhe escaparia como amante. Removido o empecilho, depois de algum tempo do desaparecimento inexplicado da filha, e de longas e exaustivas buscas, acabou se casando com a assassina.Quando a tela se apagou, o sr José que acompanhava o seu desenrolar pela vidência, diante da senhora comunicante, fortemente emocionada, argumentou:

- Viu, minha irmã, onde está a raiz de seu drama? Ambiciosa, para satisfação de seus planos, você não titubeou em cortar a vida de uma criança que o destino lhe colocou em mãos.


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