Capítulo 6

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Alexia

Não. Não. Não. Não pode ser. Não pode ser. Não pode ser. Não agora. Não desta forma. Não dele. O Destino já foi ruim o suficiente comigo. Isso já seria demais.

Mesmo depois de semanas, minha menstruação não vem.

É só mais um atraso, Alexia., digo a mim mesma, Só mais um atraso.

***

Às vezes, ser amiga de alguém pode significar ignorar algumas coisas que não devem ser ignoradas, pelo simples fato de que a outra pessoa não quer falar sobre o assunto. Isso é (mentira) o que repito mentalmente todos os dias.

Laura, Jessica e eu ignoramos coisas todos os dias.

Todas nós ignoramos o pouco que as outras comem – quando comem –, todas ignoramos o fato do banheiro cheirar a vômito com mais frequência do que deveria – isso, na verdade, é oficialmente atribuído às ressacas –, eu ignoro como elas bebem demais e eventualmente se drogam, elas ignoram o fato de eu não ter fotos nos porta-retratos do meu quarto na casa dos meus pais, o fato de eu ter pesadelos quase sempre que durmo lá e algumas cicatrizes discretas que às vezes acham que devem explorar a pele fora do limite da minha roupa. Nós ignoramos cada sorriso falso que as outras dão quando sabemos que é algo sério – sim, nós sabemos e ignoramos este saber, também –, e tantas outras coisas.

Elas são minhas amigas, certo? São elas que planejam festas de aniversário para mim, elas que me abraçam quando eu choro, elas que riem comigo. É para elas que conto segredos bobos, é com elas que saio e mais converso.

Isso é amizade, certo?

***

Eu tenho uma gargalhada muito feia.

Sei que ninguém gosta. Até eu detesto. Não que eu goste de muitas coisas em mim, de qualquer forma.

Mas ainda assim a solto com frequência. Ela é tão mais alta e forçada do que deveria ser... Esconde tantas coisas.

Olho ao meu redor.

Ninguém nota nada que está escondido.

Rio mais uma vez, tão alto quanto da primeira. A história que um amigo do Josh está contando nem é tão engraçada assim, mas todos riem. Eu rio mais alto.

Rio mais alto na esperança de que alguém me note, na esperança de alguém olhe para mim por tempo suficiente para enxergar o fundo dos meus olhos e ver em quantos cacos estou. Rio mais alto na esperança de que alguém note que esse som é o de um vendaval em uma caverna oca e cheia de cacos de vidro, que, com o vento, voam, colidem e se quebram ainda mais. Rio mais alto para alguém ver que isso é um grito de desespero.

Mas as pessoas estão ocupadas demais com suas vidas; estão ocupadas demais se sentindo incomodadas pelo som que emito. Eu entendo este incômodo.

***

Meu reflexo não me agrada nem um pouco.

Um dia já foi algo que eu amava e do qual tinha orgulho. Mas isso mudou depois que aquele filho da puta...

CALE A BOCA!, grito comigo mesma.

Tenho vontade de cobrir todos os espelhos do mundo e proibir tudo o que reflete de se apossar da minha imagem, roubá-la de mim. Não quero nunca mais ter que ver a garota que me olha por este quadrado de vidro preso na parede. Ela parece morta.

Palavras e "Riscos"Onde histórias criam vida. Descubra agora