Alex:
Não consigo fazer isso.
A foto está na minha mão direita; o isqueiro, na esquerda. Mas eu não consigo.
Sentada nessa merda de quarto dessa merda de casa, eu só consigo encarar essa maldita fotografia e tremer e querer chorar.
Uma lágrima escorre.
Talvez eu devesse parar de tentar.
Mas talvez queimar todas as lembranças que eu tento me fazer acreditar que foram apenas criações da minha cabeça seja apenas o comando que eu uso de disfarce para observar como era quando o flautista hippie e a pessoa mais espírito livre da Terra me ensinaram boa parte do que eu já conheci de bom da vida. Não é a primeira vez que acontece. E, puta merda!, como eles fazem falta!
Aqui e agora, sozinha nesse quarto frio e sem cor ou vida, eu me permito admitir: Sim, eles foram reais. Não sei se ainda são. Não sei se ainda serão de novo. Mas foram. Certamente foram uma parcela do que eu já conheci de mais real no mundo. E só eu sei como preciso deles agora. Como eu daria tudo para tê-los comigo. Para ter o perdão deles. Mas o que eu fiz não tem perdão. E eu não tenho nada sequer perto de ter metade do valor da companhia deles. Nem minha própria vida vale isso tudo.
Por favor, estejam felizes... Por favor... Me desculpem e estejam felizes. Por favor.
O ar me falta. Nem em pensamento consigo ir além de sussurros.
O pedaço de papel cintilante na minha mão congelou o meio de três gargalhadas; a minha, porque eu estava sendo carregada de surpresa nas costas dele, que segurava minhas pernas, e por causa do cabelo loiro que lhe batia até os ombros e voava no meu rosto, fazendo cócegas; a da outra moça (também de 16 anos, na época), que tinha o cabelo bem curtinho, com uma franja mais solta e cheia de movimento, foi porque eu dei um berro e o rapaz gordinho que estava atrás da câmera lembrou algum caso engraçado que tinha acontecido na aula do dia anterior. Ou talvez fosse porque esse rapaz estava feliz por estarmos chegando à barraca de doces do píer. Ele era bem divertido. Não tinha como não rir.
A gente sempre ia a Brighton no último sábado do mês.
Lembrar disso e ver aquelas expressões me faz rir por um segundo. A alegria quase pula da foto e me abraça. Três pares de olhos praticamente fechados para que os sorrisos tivessem espaço. O som daquelas gargalhadas, pairando mudo no ar, mas ecoando com barulho dentro da minha cabeça.
A realidade bate como um tornado na minha cara.
Eles não podem ser reais. Não mais. Não para você.
Aciono o isqueiro, liberando uma faísca. Minhas mãos não param de tremer, MAS QUE DROGA DE MÃOS QUE NÃO PARAM DE TREMER, MERDA!
Meus olhos prendem nos óculos muito cafonas levantados pela contração das maçãs do seu rosto e naqueles olhos que eu lembro que eram algo entre verde e mel, do cabelo que voa irregular e parcialmente no meu rosto. Ele ria porque eu estava rindo, segundo o próprio. Nunca foi de usar roupas legais, mas ninguém ligava; a gente até achava divertido.
A mão esquerda fraqueja. A faísca já há muito sumiu. O objeto de plástico que poderia levar essas lembranças às cinzas simplesmente cai no carpete sem causar qualquer dano.
Não seria ruim se causasse um incêndio.
A saudade fica demais para mim, mais uma vez.
Saudade... Não existe maior putaria no Universo. É simplesmente a pior coisa que já surgiu. Ela não tem dó ou piedade e vem cada vez mais forte, como se só a sua dor não fosse suficiente. Vem do que passou, do que poderia ter passado, do que você queria que estivesse acontecendo ou tivesse acontecido. Ela vem sem medo de te derrubar totalmente.
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Palavras e "Riscos"
RomanceDe diferentes cantos da Inglaterra, vêm duas garotas. Pamella é sempre feliz. Alexia é sempre o que se espera que uma adolescente seja. Ambas camuflando todo o resto de todo mundo, cada uma com sua forma de lidar com seus sentimentos. As duas...