Capítulo 1

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Allegra estava trabalhando na padaria de seus avós como todos os outros dias. E vez ou outra, olhava as horas no relógio na esperança de que assim elas passassem mais rapidamente.

O dia estava ensolarado. Ao mesmo tempo que o sol estava alto no céu, também se sentia a presença de um clima agradável. O movimento estava fraco no estabelecimento, afinal poucas pessoas acordavam as sete da manhã para comprar pães ou guloseimas.

Ela suspirou, saindo detrás do balcão. Sentou numa mesinha de ferro, pôs os cotovelos ali descansando o rosto nas mãos. Não demorou muito para avistar uma figura conhecida parado na porta.

Afonso acabara de estacionar sua moto quase totalmente suja de terra e lama na calçada, para logo em seguida tirar o capacete e adentrar no estabelecimento.

— Ei! — Allegra gritou, se levantando o mais rápido que podia para impedir que seu amigo sujasse todo o piso.

— O que foi? — Ele sorriu.

— Você nem ouse pôr o pé aqui. — Ela pediu, balançando a suas duas trancinhas em cada lateral da cabeça.

— Qual é, Alegria! — Ele gargalhou.

— Não!

O garoto cruzou os braços, ainda não contendo um sorriso. Allegra o imitou, tentando manter uma pose séria. Porém, era difícil a levar a sério com aquele penteado visto que ela já era bem crescidinha.

— Então você poderia me dar um pedaço de bolo?

— A sua conta já está muita alta aqui na padaria, sabia?

Ela sorriu, indo para detrás do balcão novamente e tirando um pedaço de bolo de chocolate com um recheio de coco. O pôs em um pratinho, o entregando ao amigo.

— Eu já posso entrar?

— Não!

Ela falou de repente. Levou o pedaço de bolo até ele, e sentou na calçada para enfim não se afundar no completo tédio. Afonso sentou-se ao seu lado, tentando seguir o olhar distante da amiga.

— Você está calada...

— Eu estou cansada, isso sim. — Murmurou.

— Onde estão os seus avós?

— Acho que devem estar cuidando da plantação.

— Hum. — Ele pôs mais um pedaço da sobremesa na boca. — Isso está ótimo! Foi você que fez?

— Você sabe que os bolos são feitos pela vovó, não é?

— Mas e o pão?

Ela rolou os olhos. O loiro respirou fundo, deixando o prato vazio de lado. De repente, um clima pesado pairou no ar. Allegra deixou os ombros caírem e uma expressão triste habitou em seu rosto.

— O que foi? — Ele tocou sem ombro.

— Eu... eu estava me lembrando de umas coisas...

— Que coisas?

Ela virou o rosto em sua direção, sentindo um nó em sua garganta se formar. Uma angustia tomou conta de seu coração.

— Ei, Alegria...

Ela fechou os olhos na esperança de conter as lágrimas. A garota não sabia ao certo o porquê estava chorando. Principalmente pelo fato de eles mal terem se importado quando a deixaram com os avós. Não que os avós fossem ruins com ela, mas ela sentia essa falta do amor dos pais às vezes.

Afonso a olhou, desejando que aquela dor que Allegra estava sentindo — e que sentia desde quando se conheceram — passasse para ele. Ele não suportava a ver se sentir assim.

Por mais que tentasse, ela não conseguia. Sempre, em qualquer momento do dia, essa sensação ruim de desprezo ou abandono por parte dos pais, a atormentava.

Ele segurou as mãos dela, e ela deitou a cabeça em seu ombro. Deixou que as lágrimas rolassem pelo seu rosto e soluçasse baixinho... O garoto acariciou seus cabelos castanhos, demonstrando que ela não estava sozinha.

— Eu não sei porque ainda choro...

— É melhor do que você guardar isso para si.

— Eu simplesmente queria esquecer deles.

— Não fala isso. — Ele a fez encara-lo nos olhos. Allegra passou as mãos pelo rosto vermelho e molhado pelas lágrimas. — Sabe, mesmo que seus pais não sejam os melhores, eles ainda são seus pais.

— Eu já aceitei isso.

— E você tem de entender que... — Ele suspirou. — Eles não estão mais aqui. Mas eu sei que onde quer que eles estejam, eles se arrependem por tudo.

— Será?

— E alguma vez eu já menti para você? — Allegra lançou um olhar provocativo e ao mesmo tempo divertido. — Ok. Talvez eu tenha mentido algumas vezes...

— Algumas?

— Sim.

Ela se desvencilhou de seu abraço sorrindo ainda fraco. Todo aquele clima ruim estava sumindo em um piscar de olhos.

A garota recolheu o pratinho largado no chão, seguindo para dentro do estabelecimento. Ele não a seguiu, mas ficou sorrindo consigo mesmo ao observa-la mais calma.

— Você vai voltar a se aventurar nessas coisas aí? — Ela perguntou sem o fitar.

— Você sabe a resposta, não é? — Sorriu, colocando o capacete. — Tchau!

— Tchau! — Acenou.

Apesar de estar sorrindo, ela não conseguia ficar feliz sabendo que seu melhor amigo gostava tanto de se arriscar. Mas ela devia já ter se acostumado. Principalmente com o fato de ele tentar convence-la a fazer essas loucuras também.

Allegra voltou ao seu posto na padaria, mas uma mensagem a fez correr porta a fora sem pensar duas vezes no que estava fazendo.


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881 palavras


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