Jess não parava de chorar na sala de espera do hospital. As preocupações corroíam qualquer intenção de positividade.
Léo precisou ir para casa. Desde a última vez em que Babi tinha falado com ele pelo celular, o rapaz contara que o pai levou um choque ao descobrir que um dos seus funcionários mais antigos morrera em um acidente de carro e que o amigo do filho perdeu a consciência e foi parar na sala de emergência.
– Babi, você precisa me ajudar a entrar no quarto de Manu – murmurou Jess.
– Quer que eu distraia a enfermeira, enquanto você passa?
– Chegar até o quarto não é o problema. Preciso que você tire a mãe dele de lá por tempo suficiente. Meu coração só vai ficar em paz quando eu tiver certeza de que ele vai se recuperar.
Babi imaginava como Jess estava sentindo. Quando ela viu uma enfermeira se aproximando, Babi se jogou no chão entre lágrimas e pediu para que a moça buscasse Jasmine. Ela repetia sem parar que Manu era como um irmão e que a tia era como uma mãe. Jess assentiu para Babi ao notar que o plano da amiga estava dando certo.
A ruiva correra para abraçar Jasmine e pediu para que dessem uma volta ali fora. Babi precisava respirar, mas não queria deixar Jess mais preocupada do que já estava. Não era tão difícil mentir quando havia certa verdade por trás de suas palavras, pensou Babi.
Enquanto andavam, Jasmine ofereceu um comprimido de calmante para Babi. Ela fez um sinal para que Jess visse que ela também poderia pedir um caso precisasse. Babi piscou para Jess e nem mesmo precisou desejar boa sorte para a amiga – não foi necessário que Jess tentasse ler a mente da outra. Jess retribuiu a piscada e quando Babi virou para trás antes de sair do hospital, Jess havia desaparecido.
Manter a mente concentrada quando as emoções reviravam Jess não era algo fácil, mas ela não tinha tempo a perder. Mesmo que passasse pela enfermeira, Jess ainda tinha um problema. A porta estava trancada.
Jess não queria provocar nenhum mal a ninguém, mas já estava agoniada de ficar longe de Manu. Ela passou pela enfermeira. Sua presença perto da mulher provocou arrepios pelo corpo dela. Ela olhava de um lado para o outro, como se estivesse sendo observada. Aquele nervosismo fez com que ela sentisse uma vontade súbita de usar o banheiro. Jess puxou o cartão da outra sem que ela notasse – estava tão apressada e quanto mais notava a presença invisível por perto, mais a mulher sentia como se estivesse perdendo a cabeça.
Quando percebeu que ninguém estava perto da porta, Jess atravessou. Não foi difícil encontrar Manu. Mesmo inconsciente, ela podia sentir a energia dele a guiando, como se o vínculo deles permanecesse forte.
Ela abriu a porta e ao vê-lo deitado com aqueles aparelhos foi uma das piores cenas que Jess já presenciara. Quanto mais eventos negativos aconteciam com pessoas importantes para ela, velhas cicatrizes voltavam a arder e o coração rasgava cada vez mais. Não era como se suas perdas se subtraíssem.
– Me perdoa, Manu... Eu prometo que isso não vai ficar assim. Eles vão me pagar.
Jess segurou as mãos de Manu e tentou sincronizar suas energias. Se não podia falar com ele naquele plano, só havia um jeito de se encontrarem.
Que nossas almas se encontrem
No outro plano, neste instante
Este é o meu desejo, este é o seu desejo
Que os deuses possam abençoá-lo
Quando Jess abriu os olhos, ela se viu transportada para uma floresta. O coração bateu mais forte, quando ela viu que estava tudo escuro. Não era o que Jess esperava. Algo naquele lugar, dava a impressão de que ali era sempre noite.
– Manu? – a voz de Jess ecoou.
Ela escutou um barulho vindo de trás das árvores. O coração congelou por um instante.
– Ele não está aqui no momento... Tente novamente!
Aquela voz. De todas as pessoas com quem Jess imaginava encontrando ali, aquela era a única que ela jamais queria que o seu caminho cruzasse novamente.
– Sempre me perguntei onde você estava apodrecendo – Jess cuspiu as palavras.
– Que bonitinha! Então, você tem pensado em mim... – Anna fez um bico e encenou um choro tão fácil, que ela mesma começou a rir em seguida. – Fica tranquila, que se você continuar desse jeito, logo vai garantir o seu lugarzinho aqui também, fofa.
Anna continuou provocando Jess, até que os olhos da menina escureceram.
– Isso... É assim que eu gosto de você! Não resista. Deixe a magia negra entrar no seu coração.
– Sua maldita... – Uma aura escura se movimentou ao redor de Jess, como uma cortina de fumaça. Ela apertou o pescoço de Anna e desejou silenciar de vez aquela bruxa insuportável.
– Por favor, pare! Você está me matando... – a imagem de Anna se transformou em um borrão e, em questão de segundos, Manu surgiu.
Uma luz dourada começou a brilhar ao redor de Manu, transformando o cenário.
– Eu... Poderia jurar que era Anna! O que está acontecendo Manu?
– Eu não sei, mas acho que você está sendo testada.
– Por que eu tenho a sensação de que estou sempre falhando? – A voz de Jess era fraca, como um sussurro.
Manu abraçou Jess e foi como se as energias negativas dela tivessem descarregado no chão, como um raio e neutralizado pela terra. Ele era como uma raiz que a mantinha estável diante das turbulências da vida.
– Eu não sei por onde começar me desculpando... Eu estava tão cega pela raiva, que não me dei conta de que estava nos colocando em perigo. Se eu pudesse, trocaria de lugar com você neste exato instante. Você não merece estar em uma cama de hospital, Manu. Volte para nós...
– Não se culpe pelo que já passou. Você melhor do que ninguém sabe que não podemos mudar o passado. Eu estou bem. Não se preocupe comigo. Agora, me escute. Não seja teimosa. Não temos muito tempo.
O ambiente começou a ficar translúcido. Jess viu as árvores desvanecerem. Tudo o que ela queria era aproveitar cada segundo a presença de Manu.
– Como eu posso ter certeza de que posso confiar em você?
– Você não pode.
– Algumas respostas que você procura... – as palavras de Manu começaram a falhar, como se eles estivessem em uma ligação e o sinal estivesse ruim. – o livro... Petrus... Combater o mal... Tome cuidado... – os olhos do rapaz arregalaram de medo, ao notar que a voz estava sumindo.
– Eu sei que preciso terminar de ler aquele livro maldito... – respondeu Jess.
Jess viu a boca de Manu se mexendo, mas já não podia distinguir o que ele dizia. Ela queria abraçá-lo por uma última vez e não soltá-lo mais, até que o corpo de Manu se transformara em folhas marrons e foi arrastado pelo vento. Jess olhou para os próprios pés se liquefazendo.
Ela escutou o som de água borbulhando e derreteu completamente.
***
De volta ao quarto do hospital, Jess se sentia sem energias. Quando a porta se abriu, Jasmine foi até ela e a abraçou.
– Desculpe ter entrado... – choramingou Jess. – Eu só queria ter certeza...
– Não chore, querida. Eu já tive sua idade, mas não posso imaginar como o seu coração está devastado de tantas perdas. Os médicos disseram que podem levar alguns dias até que ele acorde. Quem sabe ao ouvir sua voz não o ajude a voltar mais rápido?
– Espero que sim...
– Babi está te esperando. Vá antes que a enfermeira venha me incomodar.
Jess assentiu. Antes de Jasmine fechar a porta, Jess olhou para Manu e prometeu que o traria de volta logo.
Ao pisar fora do quarto, foi como se todas as agulhas tivessem sido colocadas de volta no seu peito e a esperança sangrasse mais uma vez dentro dela.
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O Livro - Os Bruxos de São Cipriano Livro 2
FantasiLivro 2 da série Os Bruxos de São Cipriano. Uma vez iniciados no caminho da magia, a amizade fortalecida dentro do círculo se vê mais uma vez ameaçada diante dos segredos e do desconhecido. Assim como os laços de energia se transformaram e poderes...