O Livro - Os Bruxos de São Cipriano Livro 2

Capítulo 34

Petrus olhou para a bagunça de corpos no chão. O ritual não dizia nada sobre o que fariam com os restos e a preocupação dele era com Sylvanus. Na época em que São Cipriano vivia, ele morava cercado de ossos, fetos, animais empalhados. Não havia propósito em esconder a maldade. As aves já estavam sobrevoando o parque por causa do cheiro de morte, mesmo com os pingos caindo do céu, elas não se incomodavam.

– Eu não acredito que você deixou Sylvanus escapar... – resmungou Petrus. – Ele não faz a mínima ideia do que está acontecendo. Você não sabe o quanto isso pode ser perigoso. Cumpra sua parte do acordo e saia já de São Cipriano.

– Não vou abandonar Natasha. É o mínimo que eu devo à minha irmã. Se não fosse por ela, eu não estaria com o amor da minha vida... – respondeu Lónan, segurando a mão de Anna.

A loira o observou com cautela. Era como se ela ainda estivesse com dúvidas sobre as intenções de Lónan, tentando entender o que estava fazendo de volta ali, após passar um período desconectada daquela realidade.

– Não precisa se preocupar. Eu jamais te traria de volta para te fazer qualquer mal. Eu sei que nós podemos ser felizes juntos – Os olhos de Lónan brilhavam como os de um cachorrinho que recebia carinho do dono.

– Lónan, Lónan. Você tem certeza de que vai conseguir manter Anna sob controle? Devo me preocupar e avisar ao círculo?

– Nem pensar. Nós temos um acordo. Eu te ajudei a levantar o seu namoradinho dos mortos e você fez o mesmo por mim. Assim que Natasha acordar, darei o pé da cidade. Só preciso dar um jeito de fazer Natasha esquecer tudo isso e não enxergar Anna, pelo menos até estarmos bem distantes de São Cipriano. Conhecendo minha irmã, ela seria capaz de tentar destruir Anna. Minha amada ainda não recuperou as energias e a luta não seria justa.

Anna assentiu com a cabeça. Ela abriu um sorriso ao observar os corpos e se abaixou. Antes que os dois se dessem conta, ela rasgou com os dentes um pedaço do braço de um dos cadáveres e começou a mastigá-lo. O vestido branco que Lónan vestira Anna estava cheio de lama, uma perfeita representação de como era sua alma.

– Parece que você conseguiu o que queria, Lónan. Trouxe um monstro de volta.

– Anna... – Lónan se abaixou, mas ela pulou contra ele e tentou mordê-lo, como um animal selvagem.

O medo paralisou Lónan. Petrus tirou um saco de veludo preto do bolso, avançou em Anna e esfregou uma erva na testa dela. Os olhos da garota permaneceram abertos, mas o seu corpo ficou imóvel e ela caiu no chão. Lónan podia sentir o olhar de Anna o queimando.

– Temos um problema...

– Você tem! Leve-a de São Cipriano, antes que eu me arrependa de deixá-la respirar mais uma vez.

Lónan carregou o corpo de Anna até a Céu de Estrelas, onde Natasha estava adormecida. Ele não deu a mínima para os cadáveres no parque. Em algumas horas, ele estaria bem longe dali. Mesmo sabendo que Anna não poderia se mover temporariamente, ele podia sentir a aura dela ficar cada vez mais escura, como as nuvens pesadas que encobriam a cidade.

– Eu te amo, Anna. Quando é que você vai se render? Que outra pessoa faria tudo isso por você? Nenhuma! Se não fosse por mim, você estaria apodrecendo – ele tirou o cabelo da testa dela e a beijou, sem se importar com o cheiro de terra e de carne podre.

Ele precisava dar um jeito de fazer Natasha esquecer tudo aquilo. Lónan já estava tão familiarizado com a magia negra, que não era nenhum esforço. Era sua própria irmã, mas agora tinha a oportunidade de reconstruir sua vida ao lado de Anna. Ele sabia que era só questão de tempo até Natasha seguir o próprio rumo. Eles sempre se afastavam e se reencontravam, como se estivessem destinados a lidar com as ondas de amor e ódio. Quando se está tão acostumado a mentir e a fazer coisas erradas, tudo o que se pode fazer é medir o mínimo do impacto no outro. Essa necessidade de ser guiado pela escuridão é mais forte do que eu.