CAPÍTULO 31

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Querido River,

Assisti a Garotos de programa ontem à noite. Assim como eu, você mudou. Não era mais o menino de Conta comigo. Você cresceu, e percebi que foi um processo. Você interpreta Mike, um narcoléptico que vive nas ruas como michê. O filme começa em uma estrada vazia. Você está parado ali, sozinho, esperando o sono chegar. As nuvens passam rápido pelo céu aberto.

Quando pega no sono na beira da estrada, você sonha com sua mãe passando a mão na sua cabeça, dizendo que tudo vai ficar bem. “Sei o que você sentiu”, ela diz. No filme, sua mãe o abandonou quando você era criança, e tudo que você mais quer é encontrá-la.

Minha mãe também foi embora. Sei como é sentir algo que não se pode dizer. Se você pudesse atravessar a tela, eu te abraçaria. Entendi perfeitamente quando você disse que a estrada nunca termina. Tenho uma estrada assim. A última estrada que percorri com May.

Ela passa pelas árvores que acompanham o rio, os trilhos e a ponte.

Passa por quando May e eu éramos crianças e fazíamos feitiços, passa por subir em árvores e colher maçãs, passa pela primeira vez em que a vi usando batom, pela expressão no rosto dela quando conheceu Paul, pelos filmes que nunca vimos. Vai a um lugar onde nada disso existiu, onde sempre existiu, onde o tempo não existe, só uma sensação que se prolonga eternamente. Uma sensação da qual não consigo escapar. Sinto muito. É culpa minha.

É a mesma sensação do medo de Sky ir embora, em algum momento. E é a sensação que estava comigo a noite toda quando Tristan e Kristen nos levaram a uma festa do último ano antes de irem viajar. Eles disseram que era um grande evento, que acontece sempre e que gostam de ir para ver os garotos straight-edgerelaxarem. Foi em uma casa enorme com uma árvore de Natal, sem pais, gemada com álcool e muitos garotos que eu nunca tinha visto antes, alguns deles de outra escola, acho. Kristen estava usando um colar com pequenas luzes de Natal piscando. Ela é o tipo de garota que pode fazer essas coisas de um jeito estiloso, com o longo cabelo emaranhado e a saia hippie.

Kristen tomou conta do iPod, e ela e Natalie estavam dançando juntas e cantando “Freedom’s just another word …” a plenos pulmões. Hannah levou Kasey, e os dois estavam sentados na sala de jantar, virando doses com outros garotos. Natalie ficava olhando por sobre o ombro para Hannah enquanto dançava.

Eu estava num canto, pensando em ligar para Sky. Ele disse que estava cansado e não queria sair à noite. Desejei estar com ele, em qualquer lugar.

Eu me sentia como um balão inflável, cujo cordão ele estava segurando e, caso soltasse, eu flutuaria até o espaço sideral.

Estava pensando nisso, na altura a que um balão chega antes de estourar e em como o mundo devia parecer lá de cima, quando, de canto de olho, vi Janey, minha amiga do ensino fundamental. Ela e o mesmo jogador que estava com ela na entrada do mercado. Procurei algum lugar onde me esconder, mas era tarde demais. Janey tinha soltado a mão dele e vinha em minha direção. As bochechas dela, já rosadas, estavam ainda mais vermelhas que de costume, e imaginei que tivesse bebido.

— Laurel! — ela gritou, me abraçando.

Olhei em volta para ver se alguém tinha notado, mas Natalie e Kristen estavam dançando “This Is What Makes Us Girls”, e Hannah estava lambendo sal do pulso de Kasey.

— Oi — eu disse e sorri de leve. — O que você está fazendo aqui?

— O mesmo que você, acho — ela respondeu, meio seca. E então continuou: — O irmão mais velho de Landon é amigo do cara que mora aqui.

— Landon é seu namorado? — perguntei, gesticulando para o garoto que vi com ela.

— É — ela respondeu.

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