Querida May

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Querida May,

Na noite passada, sonhei com você. Eu a vi andando pelos trilhos, seus braços iluminados pela lua, equilibrando-se com asas brancas. Vi você virar e olhar para mim. Senti seus olhos encontrarem os meus. Vi você cair.

E vi você pairar ali, no ar, flutuando. Implorei para mim mesma para me mover. Mas não consegui. Meus pés estavam presos. Pensei que você estava me esperando. Ainda havia uma chance. Se eu conseguisse andar, poderia pegar sua mão e puxar você de volta. Mas meu corpo estava paralisado. Tentei com toda a força, mas levantar o pé era tão impossível quanto arrastar uma montanha. Foi a pior sensação. Eu estava em pânico, tentando alcançar você.

Então ouvi você sussurrar quando virou de costas para mim.

— Laurel. Olha.

Foi quando vi. Vi você abrir as asas. Eu as vi, finas como papel, mas mais fortes do que tudo, brilhando como água. Não estavam quebradas.

Estavam levando você pelo céu. Você foi ficando menor, até se tornar um pequeno ponto de luz, como uma estrela. E eu sabia que você estava lá. E em toda parte.

Quando acordei, fui para o seu quarto. Com exceção das suas roupas que peguei emprestadas (mas que sempre devolvia) e do pôster do Nirvana que arranquei da parede (desculpa), tudo estava no mesmo lugar de quando fomos ao cinema. Sentei na cama por um momento. E peguei algumas das velas para acender em meu quarto, e sua coleção de conchas, que eu queria espalhar sobre a escrivaninha. Desta vez, eu não estava com medo de mexer nas coisas nem de encontrar novos lugares para elas. Meu quarto também continua praticamente igual, desde que você se mudou quando começou o ensino médio. Agora quero que fique mais parecido comigo.

Quero que tenha algumas coisas suas, junto com outras coisas, como o disco da Janis Joplin que Kristen me deu antes de ir para Nova York, o coração que Sky entalhou para mim no Natal e as estrelas que brilham no escuro que estão no quarto desde que éramos crianças.

Olhando para sua estante, encontrei um livro de E. E. Cummings. Havia uma marcação, que você fez no terceiro ano. Estava escrito MAY em cola com glitter azul. Li o poema que você marcou e, para ser sincera, era tão lindo que comecei a chorar. Amei tudo, mas o final é o melhor: “eu levo o seu coração (eu o levo no meu coração)”.

Levei o livro para o meu quarto. Li o poema várias vezes e, de alguma maneira, tive certeza de que você o deixou marcado para que eu visse. Eu sabia que devia encontrá-lo. May, eu levo você comigo.

Mas isso não muda como sinto sua falta. Toda vez que alguma coisa acontece, qualquer coisa, eu gostaria de contar a você. Sky e eu voltamos.

Às vezes minha mente dispara e fico preocupada com o que vai acontecer no ano que vem, quando ele for para a faculdade. Mas tento respirar fundo e pensar no agora. No verão, arrumei meu primeiro emprego, na lanchonete da piscina pública. Às vezes, minhas amigas Natalie e Hannah vão me ver no fim da tarde, quando saio. Hannah lê revistas, Natalie desenha, e nós bebemos refrigerante e comemos salgadinhos. Elas nunca entram na água, mas eu continuo amando nadar como sempre amei. Amo como empurro a água, mas ela sempre volta. Também encontro Janey às vezes. Você ficaria surpresa se a visse agora. Ela vai à piscina com o namorado e usa um biquíni rosa e branco de bolinhas. Foi estranho no começo, porque ela estava brava comigo por desaparecer depois que você morreu. Mas está melhorando. Às vezes ela senta comigo, com Natalie e Hannah. Hoje estávamos falando sobre aquela vez em que você nos ensinou a virar cambalhota do trampolim. Nós duas estávamos apavoradas, até você fazer parecer fácil.

Este ano, escrevi um monte de cartas, e elas me ajudaram muito. Quando finalmente entreguei tudo para minha professora (deixei no escaninho dela na escola), ela me chamou para dizer que estava orgulhosa de mim. Eu agradeci por ler as cartas. E então ela disse que eu precisava de ajuda para lidar com tudo. Mas eu disse a ela que a mamãe e o papai já me colocaram na terapia. A terapeuta é legal e conversa comigo como se eu fosse adulta.

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