Capítulo 16

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João acordou às seis da manhã. Combinou com Ana as oito horas no horto na Alameda. Ele queria ter podido dormir mais, a noite de sexta não fora nada do que não estava acostumado: boate, bebidas e mulheres.

Nessa sexta, ele conseguiu a proeza de ter duas ao mesmo tempo. O bom era que, não estava bêbedo igual a elas e as colocou num táxi as duas da manhã. Podia ter as escolhido para viajar, mas prometera ao seu pai que levaria Ana.

Ele sabia o que Antônio estava tentando fazer, mas encaixá-la no seu mundo e ao seu lado não era fácil. João tinha que provar isso ao pai. Quando seu pai colocava algo na cabeça, dificilmente voltava atrás. Conseguia sempre o que queria, mesmo que para isso, usasse a própria saúde.

Mas por outro lado, João estava ficando velho para baladas noturnas, terminando todas as noites com mulheres diferentes.

Ele havia namorado antes. Conhecia essa rotina de ser fiel, dar presentes, ouvir confissões, dormir junto. Porém depois de dois anos, o namoro ficou frio, quando pediu para que ela morasse com ele e ela recusou, alegando que não lavaria a roupa dele e nem cozinharia.

Coitada de Cleuza, se ela fosse morar com ele! Então, eles deixaram como estava, até acabar. Depois viu-a casando com um homem com a idade para ser seu pai, que tinha uma mansão em Itaipú, com empregados que faziam turnos. Homem esse que era amigo de Antônio nos negócios.

Ouvira falar que nem um copo ela levava para a pia, e não se surpreenderia, se fosse verdade a fofoca de que ela estava dormindo com o motorista. Que bom para ele, que ela recusou. Mesmo tendo Cleuza para cuidar da casa, ele era organizado. Tudo estava no seu lugar, senão ele se perderia em sua própria casa.

Tanto que ao arrumar a sua mala, antes de sair, sabia onde encontrar as camisas, bermudas e sungas, assim como os sapatos e meias. É claro que aquele lado dele, ninguém conhecia, nem seus amigos. Talvez o Nando, por ser o melhor e o mais próximo, mas nunca confirmara.

Agora, parecendo um zumbi, entrou no banho frio e pensou em Ana. Pensar nela foi bom, relembrar as conversas fazia-o entender porquê seu pai afeiçoara por ela. Um diamante bruto, ele dissera. Será que João estava disposto a lapidá-lo?

Saiu do banheiro da suíte, pegou a mala, que estava na sala e trancou ao apartamento. Nando tinha a chave e como sabia da viagem, usaria o apartamento para namorar. João não ligava, já que Nando era como um irmão desde que ele chegara ao Rio, mas não se esquecia de trocar os lençóis, quando isso acontecia.

Entrou no carro as sete e foi tomar café na padaria, tinha dispensado a Cleuza do sábado e não queria fazer o próprio café. Parou na padaria e pediu um café preto, enquanto se servia de pão e queijo branco e uma bomba de chocolate, na bancada do self-service.

"Estou a caminho", enviou para Ana as sete e meia e guardou o celular no bolso.

Quando foi pagar a conta do café, viu as atendentes se cutucando, enquanto ele se aproximava.

-Dezenove e noventa, senhor. - Disse uma delas, vendo sua comanda. Ele tirou a carteira do bolso, pegou o dinheiro e esperou a nota fiscal.

-Só um instante. - Falou ela, que pegou uma caneta e anotou um número de celular na nota. - Fazemos entrega a domicílio. - Ela riu. Ele também, sendo educado e saiu.

Fácil, pensou ele ao entrar no carro e amassar a nota, jogando-a de lado. Era assim, para ele apenas um sorriso bastava.

"Estou pronta. Saio já."

Viu a mensagem de Ana ao conferir o celular. Faltava apenas quinze minutos, então chegaria na hora marcada. O trânsito estava bom e como a pegaria no horto, já estariam no caminho.

Quando se aproximou do horto, a viu com um vestido azul claro de verão, curto e de alças. Via também o biquíni que lhe dera, com estampa de marinheiro. Cabelos soltos e molhados, óculos.

A bolsa marrom grande era única informação que dizia que ela iria viajar, de resto, parecia estar indo à praia. Parou o carro e ela para ela entrar. Em sua ignorância, não reconhera o carro, sabia apenas que era grande, preto e confortável.

Linda, pensou quando ela sentou e pôde ver as suas pernas assim que o vestido levantou um pouco.

-Oi. - ela cumprimentou.

-Oi - ele a olhou, viu a mala em seu colo e piscou, acordando. - Me dá aqui. Vou colocar no porta-malas.

-Ah, tudo bem. - Disse ela entregando a mala. Ele saiu do carro e guardou. Voltando ligou o carro e partiu.

-Acho que chegaremos na hora do almoço - ela concordou com a cabeça mas ficou em silêncio.

-Então gostou do biquíni?

-Sim. Amei. E ficou muito bonito, a minha cara. Obrigada.

-Eu sei. De nada. Sabia que gostaria de cores sóbrias. Se eu te desse um rosa choque de babado...

-Eu não usaria. - Ana riu, completando a frase dele. Ele assentiu e a olhou. Ficaram em silêncio mais uma vez.

-Qual o nome do seu filho?- Há algum tempo ele queria perguntar, mas não teve oportunidade.

-Matheus. - Falou ela olhando para a frente.

-Quantos anos ele tem?

-Oito. Um rapazinho já.

-E você tem 27. O teve muito nova não? - ele a olhou

-Com 18 anos.

-Nossa! Como sua família reagiu?

-Bem, eu acho. Não me expulsaram de casa, pelo menos. - Ela riu. - Exigiram que eu continuasse os estudos. Graças a Deus, por isso!

-Entendi. Mas, então você foi casada?

-Sim. Fui casada no civil apenas.

-Hum... teve casa e tudo o mais? - Ana suspirou, não entendia o porquê de sua curiosidade. - Tudo bem, se o assunto causa desconforto. Só estou curioso. Desculpa.

-Tudo bem. Só não falo muito disso, mas não me causa desconforto. - Ana assumiu uma expressão séria e continuou. - Eu amei o pai de Matheus, foi meu primeiro em tudo, namorado, amante e marido. Na época, pensei que fosse durar. Fui morar com ele e sim, tive uma casa. Mas era muito nova para aquilo, hoje eu sei. Estudava ainda e cuidava do filho, da casa e do marido. Passei para a faculdade e comecei a dar aulas. Aí começamos a brigar. Então, não deu mais. Com vinte anos me separei e voltei para casa dos meus pais. Nunca deixei de estudar e trabalhar, mas minha mágoa atrapalhou meus estudos, me formei com dificuldade. - Ana respirou fundo, mesmo que ela alegasse que o assunto não era desconfortável, falar daquilo parecia ser difícil. - Quando amadureci de verdade, quis voltar a estudar, mas o dinheiro nunca dava, porque Matheus sempre vem primeiro lugar. Então é isso, João. Sou mais velha que pareço, apesar de minha idade, passei por muita coisa. Hoje, não quero apenas o dinheiro do seu pai, mas oportunidades. Por exemplo, não conheço Búzios. - Ela riu dando de ombros.

-É sério? - Ele franziu a testa.

-Sim. Como tive filho cedo, nunca viajei com amigos. Eu antecipei o meu tempo e perdi muita coisa.- Falou ela olhando para ele.

O mundo. Ela merecia o mundo, pensou ele e quis dar a ela essa oportunidade, um sentimento que aflorou em seu peito, um que ele nunca sentira, inexplicável. Queria protegê-la e dar todas as oportunidades de ver, de sentir, e de experimentar coisas novas.

Já estavam na via Lagos, quando no rádio tocou um samba antigo e ela cantarolou junto. Ele riu de seu gosto musical.

Vamos conhecer a Ana.

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