Deformidade.

Cicatrizes. (1)

 Calor...

Fogo...
 
Dor...

  Essas coisas passavam pela mente do jovem rapaz, que se contorcia na cama, vítima de um pesadelo muito próximo da realidade, a dor de alguns meses anteriores ainda prevalecia dentro dele, aumentando a cada dia que tinha de conviver com a realidade trazida por um acidente. Atordoado e soando, Diego acordou apertando o cobertor com força, enquanto seu coração batia acelerado, ele respirou fundo, olhou em volta e viu as várias caixas de mudança ao redor da cama onde ele estava, no quarto de paredes cinza sem graça.

- Pelo visto não foi só um pesadelo...

  Suplicou com a voz ofegante, claramente decepcionado, ao se levantar colocou a mão no topo da cabeça, em seguida deslizou a mão indo em direção ao lado esquerdo, onde sentiu uma breve falta dos cabelos lisos e castanhos, ao descer mais a mão sentiu as cicatrizes no pescoço, que se espalhavam para o rosto e braço, rapidamente tirou a mão e olhou para o lado, onde viu um espelho e pode constatar que as cicatrizes das queimaduras do acidente ainda estavam lá, começando no canto da boca, seguindo pela bochecha, o pescoço e cobrindo todo o braço esquerdo.

  Diego olhou e em um ataque de raiva, jogou com força o quadro de um foto antiga, onde ele ainda tinha o rosto perfeito, a pele sem manchas ou imperfeições, que era enfeitada pelos olhos verde misteriosos, o nariz bem feito e os lábios carnudos e rosados, ao lançar o quadro quebrou todo o espelho e saiu correndo do quarto, direto para a cozinha, onde sua mãe dizia para uma empregada onde colocar as coisas.

- Que merda foi aquela?! -perguntou gritando, a empregada e a mãe tomaram um susto.

- O que foi filho?

- Quem foi que colocou um espelho no meu quarto? -Diego estava completamente descontrolado. - Vocês sabem que eu estou parecendo um monstro e querem me fazer ver esse rosto horroroso todo dia?! 

- Calma filho, fui eu quem coloquei o espelho, mas não pensei que isso fosse lhe irritar, me perdoe...

- Eu não quero ver um espelho nessa casa!!!

  Batendo as portas, Diego saiu, sua mãe, Angela, foi atrás dele, entrou no quarto atrás e o olhou enquanto o rapaz sentava na cama revoltado.

- Eu sinto muito, não tive a intenção, entenda que isso está sendo difícil para mim também, mas vai ficar tudo bem, o médico disse que com o tratamento correto, você vai ficar perfeito de novo em pouco tempo...

- Mãe, olha para mim! -pediu mostrando as cicatrizes no rosto, misturadas a expressão de desprezo. - Acha que isso tem jeito?

- Não está tão ruim... -afirmou na esperança de o ajudar.

- Não mente para mim, uma barra de ferro cortou minha boca e a minha bochecha, depois aquele maldito incêndio queimou parte do meu corpo, não está ruim, está péssimo! -Angela sentou ao lado dele e pegou em suas mãos.

- Tudo bem, você está com uma cicatriz enorme na cara, mas isso não significa que tudo está perdido, você ainda vai poder terminar seus estudos, se formar em uma boa faculdade, ter um ótimo emprego e com o tempo, essas marcas vão ir sumindo, só precisa ter força de vontade...

- Quem vai querer ficar perto de um monstro deformado? -perguntou tendo em sua mente, que ele mesmo não iria querer ficar perto de si. - Ninguém vai me aceitar desse jeito.

- Eu te aceito.

- Você é minha mãe, não conta e... -Diego se lembrou do dia em que sua mãe viu seu rosto machucado pela primeira vez, a reação dela não foi nada boa. - Até você se assustou ao ver meu rosto assim pela primeira vez, imagina os outros.

- Me perdoe, eu não queria aceitar que meu amado filho iria ter que conviver com essas cicatrizes.

- Não quero falar mais sobre isso! -Diego se levantou.

- Hoje é o primeiro dia de aula, você vai, certo?

- Claro que não, não vou sair de dentro dessa casa nunca mais!

- Filho, precisa viver!

- E se eu não quiser viver mais?

- Por favor, volte a ser aquele menino cheio de sonhos que era antes!

- Ele morreu, queimado por aquelas chamas... Sai do meu quarto, quero ficar sozinho.

  Angela respirou fundo e saiu, Diego trancou a porta, no meio das caixas começou a pegar todas as fotos que encontrava de seu antigo rosto, junto as que estavam no computador e celular, apagou todas e colocou em um saco de lixo as impressas, em seguida desativou todas as suas redes sociais, mas antes viu uma foto onde estava dando um tapa em um garoto negro, ele se lembrou daquele dia e todos os outros...

- Talvez eu mereça passar por isso...