PNF - Capítulo 04

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[Rodrigo Aguilar - São Paulo, 1998]

—Eai. – Pior jeito de chegar em alguém. Pior. Jeito. Deus me ajuda. —Tudo bem?

Ok. Lógico que se tinha como piorar, eu pioraria toda a situação. Só faltava agora aquela famosa frase: eai, o que tá fazendo de bom? Mas ele não pareceu perceber meu desespero interno e a vergonha alheia que eu estava sentindo de mim mesmo, pois me olhou surpreso e tentou esboçar um sorriso. Eu disse tentou. Mas parece que temos um progresso aqui.

—Oi. – Cumprimentou, me vendo abrir espaço entre as almofadas e me sentar ali do seu lado. – Você veio mesmo.

Comentou.

—Eu disse que viria, ué. – Respondi franzindo a testa em confusão, mas não sem deixar de perceber que era ele quem estava puxando assunto. Então deixei e tratei de estender o assunto. – Sua amiga me convidou.

—Geralmente, às vezes, as pessoas convidam por educação.

—Não sua amiga. Sinto que ela gosta de mim de verdade.

Disse, lançando um sorriso fraco a ele que só balançou a cabeça em resposta, de certo não tinha nada pra falar, pois sabia que era verdade. Pela amiga dele, eu já era um amigo deles também, só ele que insistia em toda aquela história de família.

Mas agora o silencio reinava entre nós, não literalmente, pois um rock baixo tocava e as pessoas já conversavam entre si na festa, mas nós dois estávamos ali em silencio há bastante tempo. Eu precisava falar algo pra não começar a ficar estranho. E o que a gente faz quando quer quebrar o silencio de qualquer jeito? Fala merda.

—Você sabia que a barata pode sobreviver vários dias sem a cabeça? Interessante, né.

—Que?

Quase em câmera lenta, e parecendo não estar acreditando naquilo que eu falei, ele se virou pra mim de boca aberta e com cara estranha. Apenas dei de ombros e continuei:

—Eu li em algum lugar, parece que é verdade.

—Você é muito aleatório. – Ele chiou, chacoalhando a cabeça e negando insistentemente. Eu queria poder enfiar minha cabeça na areia movediça e nunca mais tirar enquanto olhava pros seus olhos castanhos claros e a cabeleira tão loira quanto a da Carla Perez. – Olha só, e... eu vou no...no banhe... eu vou ali, tá.

Isso Rodrigo, perfeito, palmas pra você. Era só isso que eu pensava enquanto o via sair dali igual um cachorro assustado com medo de rojão. Observe-o ir, só pra ter a certeza de que ele estava mesmo fugindo de mim ao parar pra conversar – animadamente, devo acrescentar – com algumas pessoas no caminho.

Me levantei também, mas não pra ir atrás dele, pois eu não ia mais passar vergonha, e fiz o caminho contrário em direção ao quintal da casa. Encontrei a Raquel no caminho, junto com seus pais que se certificavam de que ninguém estava fazendo nenhuma loucura, e acenei lançando um sorriso pra ela. Esperava que ela entendesse que eu estava agradecendo pelo convite, mas que já era hora de ir embora.

A noite já tinha caído e lá fora, a lua refletia a luz nas águas da piscina e suas pequenas ondas. Estava tão bonito que eu mudei de ideia e caminhei até lá, saindo da frente das pessoas que eu encontrava pelo caminho e logo me sentando ali na borda da piscina pra olhar mais de perto a luminosidade. Tirei meu tênis, arregacei as barras da calça, colocando elas o mais alto possível, pra colocar minhas pernas dentro da água e ficar ali olhando pras pessoas ao longe se divertindo.

Eu não estava triste, não mesmo, de jeito nenhum, até porque não tinha motivos pra isso. Mas... sei lá! Bati em meus bolsos só pra ter a confirmação de que eu não trouxe meu maço de cigarros, e que eu mantinha escondido dos meus pais, pois agora eu queria mesmo poder fumar. Não que eu fosse viciado, mas aprendi que cada tragada trazia um certo alivio pras coisas e emoções que sentia. Na verdade mesmo, eu queria poder fumar meus sentimentos.

Por Nossos FilhosOnde histórias criam vida. Descubra agora