PNF - Capítulo 40

1.6K 221 73
                                    

[Rodrigo Aguilar]


Tá tudo bem, se com bem você quer dizer mal.

Ultimamente eu venho me sentindo como os músicos do Titanic: vendo que o barco está afundando, mas me mantendo pleno, enquanto toco meu violoncelo e finjo que nada está acontecendo.

Eu sou o barco... não, melhor ainda, minha vida é o barco, que se inclina todo afundando a parte traseira e depois ainda quebra ao meio e afunda a parte da frente. Trágico! Mas como se ainda não bastasse, ainda existe o romance água com açúcar central que acaba roubando toda a cena, mas que não vinga por causa deles próprios. Eu nem sei mais o que eu tô falando.

Fazia uma semana desde que fomos descobertos e tivemos aquela conversa com nossos filhos, onde as coisas não deram muito certo por assim dizer, e, fazia uma semana também que eu vinha tendo rasas notícias do Miguel. Vale constar que não foram por falta de tentativas minhas, aliás, o que eu mais tinha feito era tentar. Tentei reunir todos novamente para uma nova conversa, tentei falar com ele sozinho para que conversássemos a respeito disso, e por fim, tentei fazer com que não perdêssemos aquilo que já tínhamos conquistado, o chamando para fazer algo junto, ou apenas nos vermos como antes. Tudo em vão e isso me assustava ao mesmo tempo em que me deixava um tanto quanto deprimido. Será que ele tinha desistido? Desistido sem nem ao menos tentar ou sequer me dizer que desistiu? Isso era...

—Com qual- vo... você tá chorando, Chef?

Fui surpreendido pelo Vicente aparecendo por trás de mim, certamente vindo me perguntar algo da cozinha, e se surpreendendo com o líquido de aparência duvidosa escorrendo pelos meus olhos.

—Não, é só a cebola.

Eu não chorava. Nunca. O máximo que acontecia era um suor que saía dos meus olhos de vez em quando.

—Mas você tá cortando batata...

Parei imediatamente com os movimentos da faca, porque ninguém gosta de dedos cortados, e olhei pra cima, o encarando. Ele tinha cortado o cabelo? Ué.

—Batatas são mais propensas a choro do que cebolas. – Quem nunca cortou uma batata e chorou que atire a primeira pedra.

—Tá tudo bem, Rodrigo?

—Defina o estado de bem...

Tô respirando? Tô. Meus órgãos tão funcionando corretamente? Eu espero que sim. Saúde? Dr. Toninho disse que só preciso baixar o colesterol. Mas o resto...

—Se quiser conversar... Eu sei que a gente não tem mais nada, nem nunca tivemos na verdade, e eu fiquei um pouco chateado quando você simplesmente sumiu... Enfim, eu estarei aqui para conversar.

Maldito suor que se multiplicou nos meus olhos ao ouvi-lo oferecer ajuda.

—Obrigado Vicente.

Mesmo sabendo que eu não iria alugar ninguém com meus problemas, principalmente ele, agradeci humildemente e sincero, afinal, não é sempre que você sabe que tem pessoas com quem contar.

Trabalhei no restaurante naquele dia fazendo coisas que eu já nem era mais acostumado a fazer ou que já existiam pessoas delegadas àquela função, eu estava tomando trabalho dos outros sim, mas eu precisava ocupar a cabeça.

O fato de ver tudo desmoronando aos poucos, me fez desmoronar também, foi mais forte que eu e eu simplesmente não consegui evitar, e pior que eu nem era assim. Tudo que eu pensava estar sob controle, foi esvaindo de uma forma tão rápida que mal deu tempo de segurar ou tentar consertar. Foi tipo infiltração, quando você se da conta, já é tarde demais.

Por Nossos FilhosOnde histórias criam vida. Descubra agora