Bexi
O vazio me ocupava. A solidão me abastecia. O silêncio era ensurdecedor. Era como se a ausência de vida dentro de mim me mantivesse viva, da forma mais dolorosa possível. Eu quase desejava desistir, desistir de perpetuar essa tortura interior inevitável. A única coisa que me mantinha presa a minha existência, que para mim não possuía mais significado, era o fio de esperança ao qual todos nós agarrávamos com veemência.
Meus irmãos continuavam a me entreter, ou pelo menos tentavam. Davam o melhor de si. Quanto mais tempo eu passava com eles, menos eu pensava na ausência da Becca e da falta que ela fazia a todos, principalmente para mim. Entretanto, não demorava muito para meus pensamentos voltarem àquele lugar sombrio – eu me pegava desacelerando a corrida, focando meu olhar em uma gota de orvalho qualquer e me afundando em minha depressão. Eu queria lutar, precisava lutar, mas a cada dia que se passava eu percebia mais o quanto eu estava desconexa deste mundo. Eu não pertencia aqui, não sozinha. Eu era um espectro, um espírito, e esse motivo sozinho já deveria me convencer de que eu estava no lugar errado.
Só teria sentido, minha presença, quando – e se – mesclada com a minha parte humana.
Scarlet repetia, quase como uma prece para si mesma e para mim, que nossa solução estava próxima. Eu confiava nela, como Becca sempre confiaria, e o fato de agir como Becca agiria ajudava a me manter presa na dolorosa tortura que era viver pela metade, na falta dela.
Felizmente, parecia que Scarlet não era apenas otimista. Parecia que sua esperança foi frutífera. Robert conseguiu uma solução algum tempo depois do acidente e, assim que recebemos essa notícia, corremos em busca dela.
Eu estava deitada no meio do tapete, no corredor da aeronave, já que eu não conseguiria me deitar confortavelmente em nenhuma das poucas poltronas disponíveis. Robert estava na cabine do piloto, sendo o único que tinha o talento de pilotar um avião. Ele havia solicitado ao seu pai o uso do jato particular que sua alcateia dispunha. Eu não acreditava que o próprio Letum cederia seu jato com tanta facilidade, com tamanha boa vontade. Provavelmente deixaria o problema de locomoção por nossa própria conta. Meu Alfa que conseguisse os meios de resolver o problema, de esconder um espectro lupino em um avião comercial. Contudo, quem estava liderando a Alcateia do Maine e, portanto, todas as demais, eram Lucius e Alexander, dividindo as tarefas. Certamente nosso querido amigo deu um empurrãozinho e convenceu seu irmão mais velho a ter piedade de mim.
O corpo da Becca, porém, não poderia ser transportado. Ela já estava em estado frágil o suficiente, e seria imprudente tirá-lo de seu repouso. Com ela, em Columbus, ficaram alguns assistentes de Robert, lobos da Alcateia do Maine que estavam aperfeiçoando seus conhecimentos de medicina lupina com o grande médico. Ainda estavam tratando as cicatrizes de prata de Rebecca, por conta da rede de prata que usaram para mantê-la presa. Estava indo devagar, mas pareciam confiantes de que conseguiriam tratá-las ao ponto de que não ficariam marcas. Ademais, é claro, estavam incumbidos com a tarefa de manter o corpo dela funcionando como deveria até Robert poder voltar para supervisioná-la.
Olhei para todos ao meu redor, um por um.
Nem todos os lobos vieram conosco, como era de costume. Alguns sempre ficavam para trás para tomar conta do território, proteger e supervisionar as visitas e assumir o posto temporário de Alfa. Quem ficou com a grande honra era Connor, o Gamma da alcateia, pois Trevor, o Beta, havia pedido pessoalmente a Aidan para me acompanhar.
Não preciso dizer que fiquei um pouco surpresa e lisonjeada com a atitude do lobisomem. Nós não havíamos nos acertado quando nos conhecemos, com direito a mordidas no braço e cuspidas na cara. Porém, desde que eu havia voltado de Las Vegas, nós passamos mais tempo juntos, principalmente graças ao meu castigo pessoal, minha cruz a carregar nas costas: Maxwell Kentner.
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Valente
Werewolf"Eu era um espectro, um espírito, e esse motivo sozinho já deveria me convencer de que eu estava no lugar errado. Eu não pertencia aqui, não sozinha. Eu queria lutar, precisava lutar, mas a cada dia que se passava eu percebia mais o quanto eu estava...