III - [Revisado]

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Scarlet

Tudo havia começado nesse hotel. Àquela altura, eu não saberia dizer exatamente o que era tudo, mas havia certamente começado nesse hotel. Ou pelo menos eu nunca havia notado outros acontecimentos parecidos antes e em outros lugares.

Eram coisas pequenas, no início, que passariam despercebidas por qualquer pessoa um pouco mais agitada. Eu, porém, havia percebido e estava cada vez mais apreensiva. Quando chegamos ao hotel, eu acreditava, convicta, de que havia uma explicação racional para tudo que acontecia.

Por isso não mencionei a ninguém quando fui pegar um panfleto do balcão e ele caiu no chão bem quando fui pegá-lo, como se um vento tivesse o soprado, mesmo não havendo sequer uma janela aberta. Não mencionei quando fui ao banheiro do saguão e pensei ter visto, por meio segundo, um vulto no canto do banheiro pelo espelho. Não mencionei como, sozinha e indo em direção ao meu quarto, as luzes do corredor falhavam e ficavam piscando até eu chegar a minha porta, quando finalmente se estabilizavam de novo.

Portanto, eu não achei relevante mencionar como, ao sair da suíte de Aidan – onde George e Bexi estavam tendo uma sessão de terapia – eu caminhava pelos corredores do hotel com calafrios. Aidan me esperava na área das refeições do hotel, querendo fazer um lanchinho antes de partirmos para o centro da cidade. Assim que eu havia saído da suíte e começado a caminhar, parecia que algo estava me empurrando para frente, como um vento forte quase me carregando. Porém, tão repentinamente quanto veio, parou, e fiquei no meio do corredor, atônita por alguns minutos antes de conseguir voltar a andar.

Essas coisas pareciam só acontecer quando eu estava só e, apesar de terem começado cerca dois dias atrás, somente aconteciam quando eu já havia abaixado a guarda e não esperava tão cedo por outro incidente.

Eu ainda debatia comigo mesma se deveria discutir isso com alguém. Por um lado, eu tentava manter meus pensamentos longe disso, dispensando preocupações com a desculpa de que tinha de haver uma explicação plausível para todos os ocorridos e que eu iria parecer uma tola me preocupando com esse tipo de coisa. Imagine se eu revelasse ou demonstrasse qualquer medo dessas coisas, tão bobas? Esses lobisomens todos iriam voltar a me enxergar como a raposinha que acreditavam que eu era, mas não somente isso. Enxergar-me-iam como uma pequena raposa amedrontada. Ah, eu iria morrer antes de admitir medo a qualquer um deles, até mesmo a Riley. Poderia contar à Becca, se ela estivesse aqui, mas justamente por causa dela precisava ser forte para a ajudar.

Quando eu parava para refletir sobre a pequena parte de mim que se amedrontava com essas coisinhas, sentia-me mais frívola ainda. O que eu era, afinal, se não um ser sobrenatural? Desconhecida pelo mundo, pela ciência? Tanto eu, quanto os lobisomens que me cercavam e eu chamava de amigos, de amantes; O que éramos, do que éramos capazes? Minha própria melhor amiga, parte dela era literalmente um fantasma! Se fôssemos maus, podíamos realmente tornar a realidade de muitas pessoas em um filme de terror, grotesco e assustador.

Então por que passar tanto tempo remoendo essas coisas? Por que, de repente, ficar com o corpo todo tenso quando eu percebia que estava sem a companhia de alguém?

Sem a companhia de alguém visível, pelo menos...

Era irritante, em parte, não saber o que estava acontecendo comigo, ou se havia, de fato, algo acontecendo. Eu repetia em minha mente: Era inexplicável? Não, não era. Eu apenas não tinha as respostas, mas alguém teria.

Mesmo assim, mesmo com todas as minhas tentativas de me convencer de que tudo não se passava de imaginação fértil, problemas elétricos no prédio, a luz brincando com minha visão, eu ficava estalando meus dedos de forma nervosa e olhando por detrás do meu ombro enquanto caminhava.

ValenteOnde histórias criam vida. Descubra agora