IX - [Revisado]

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Becca


Acordei com a fraca luz da manhã, penetrando sorrateira pelas cortinas da janela. O lindo tecido branco das cortinas da casa do Alfa esvoaçava mansamente pela fresta que havia sido esquecida por nós na correria da noite anterior. Inspirei fundo, preparando-me para enfrentar minhas escolhas.

Demorei alguns minutos para ter coragem de me levantar. Eu não queria acordá-lo, portanto ponderei por bastante tempo simplesmente ficar imóvel e fingir que nada havia acontecido. Fingir que se eu apenas fechasse meus olhos conseguiria voltar no tempo e dar uma bronca em mim mesma.

Não havíamos... ido até o fim, na noite anterior. Mas o problema persistia. Eu acendi uma chama de possibilidade em Mathias, uma chama que não deveria estar acesa. Ao menos, em mim não estava, e era injusto fazê-lo achar que ela ainda existia.

Infelizmente, eu sabia que não podia desfazer o que eu havia decidido, totalmente lúcida, fazer na noite passada. Respirando fundo, levantei-me da cama devagar e com cuidado para não perturbar o sono profundo do lobo. Mathias estava deitado de barriga para baixo, sua cabeleira cobrindo quase que completamente seu rosto, deixando-me na dúvida se ele conseguia, de fato, respirar enquanto dormia.

Desisti de tomar um banho, pois tinha medo de acordá-lo. Faria isso depois. Apenas me arrumei e saí para o corredor, sempre muito quieta e sorrateira. Entretanto, assim que pisei para fora do quarto, fui atingida. Não por uma arma, não por um ataque, mas por uma lembrança. Um cheiro.

Eu havia sentido falta, percebi, do aroma de pinho e flores silvestres. Parecia que eu não sentia esse cheiro há anos. Eu não sabia como não o havia percebido no dia anterior, mas estava presente por toda a casa e logicamente estaria. Aidan morava aqui. Engraçado que, mesmo humana, conseguia captar o cheiro do meu Alfa. Tamanha intensidade parecia quase um perfume.

Havia uma concentração maior do aroma, que levava até o fim do corredor. Levava até uma porta que, recordei, era do quarto de Aidan. Olhei pelo corredor e espiei dentro dos outros quartos ao redor, certificando-me de que não havia ninguém por perto. Quando percebi que, no andar de cima ao menos, só tínhamos eu e Mathias, decidi saciar minha curiosidade e abrir a porta.

Sua suíte era grande, mas não era de tamanho muito maior do que os outros quartos de hóspedes. As paredes estavam vazias, sem quadros nem pinturas. Havia uma poltrona, um guarda-roupas e armário, uma mesa com um laptop e alguns livros. Sua cama estava impecável, com uma roupa de cama verde clara que era muito convidativa, parecia muito macia e aconchegante. Em cima das mesinhas de cabeceira havia porta-retratos dele com outras pessoas que eu não conhecia. Supus que fossem sua família e, ao ver de perto os porta-retratos, senti-me triste. Triste por ele.

Aidan, como a grande maioria dos lobisomens, teve de deixar a família para trás. Era muito complicado conseguir conciliar família e licantropia, principalmente porque o mundo não sabia da existência de lobisomens, pelo menos não ainda. Mas o fato de que ele mantinha aquelas fotos antigas ao lado de sua cama... demonstrava a importância que ele um dia havia dado para sua família. E, certamente, a falta que ele sentia deles.

Finalmente decidi que estava invadindo demais a privacidade do meu Alfa. Eu não deveria ter ido até lá, não havia sido convidada, mas a curiosidade "matou a loba". Bem, pelo menos a parte humana da loba, de qualquer forma.

Desci as escadas, grata, ao menos, por já sentir o cheiro de café da manhã invadindo a casa. Alguém tinha dormido aqui além de nós e estava fazendo a comida. Dei passos apressados até a cozinha. Depois de ter passado minha primeira noite consciente após vários meses com um cara, e na manhã seguinte eu ter invadido o quarto de mais outro cara, eu precisava de companhia externa. Qualquer companhia seria bem-vinda. Eu sentia que precisava conversar com alguém.

ValenteOnde histórias criam vida. Descubra agora