O adeus

2.9K 228 29
                                    

                               17:55

- Você me disse, um dia, que tinha uma irmã... - Chris desviou a atenção no volante para me olhar melhor. Sorriu sem mostrar os dentes e negou com a cabeça, voltando os olhos para a rua.
- Eu menti. - ri um pouco e contorci o lábio. - Eu não sei por quê. Mas...
- E ainda, se convidou para ir na minha casa depois!
- E você nem me beijou. - sorri e lembrei do seu jeito fuckboy. Ele não estava assim. Ele parecia/estava frágil, e eu tenho certeza que a cena anterior das declarações só aconteceu por causa do seu momento triste.

O mais engraçado: eu quero que ele volte a ser o fuckboy. Ps.: sem a parte de várias garotas em uma noite. Eu via a tristeza pelos seus olhos, via um coração chorando e a saudade implantada.

- Onde é essa merda de cemitério? - me assustou jogando o celular no meu colo - Vê aí. - agora ele parecia irritado e eu olhei para o garoto bipolar. - Por favor... - ele sorriu forçado e eu ri. Chris deu um grunhido e apertou minha coxa, tipo carinho raivoso.
- Aí! Tá louco? - dei um mesmo apertão na sua coxa. De repente ele freiou com tudo, fazendo eu dar um solavanco para a frente e meu sangue ser todo drenado do rosto, arregalar meus olhos e parar de respirar. - Meu deus! - voltei para o meu lugar inercial e olhei assustada para ele.
- As criancinhas queriam atravessar... - conteu um sorriso e apontou para frente. Olhei as 3 crianças atravessando e revirei os olhos.
- Você é um terrível motorista! - ele gargalhou e tentou passar a mão no meu rosto, mas eu afastei, irritada.
- Vê aí pra onde eu tenho que ir. - apontou para o celular no meu colo.
- Eu não sei a sua senha, "querido". - sorri irônica, imitando uma secretária.
- 7854. - pensei qualquer coisa, menos ele falando sua senha sem qualquer problema. Tentei não deixar o queixo cair, foi difícil.

Haviam poucas pessoas no recinto. Todos de preto, menos Chris, que estava com seu moletom branco. Andávamos lado a lado, devagar. Parecia que ele não queria chegar nunca. O barulho das britas pararam no meu lado, me fazendo olhar para ele.

- Eu não quero. Não estou pronto. - toda a tristeza contida estava transbordando agora.

Aproximei-me do seu corpo e procurei sua mão.

- Você tem que ir. Você vai se arrepender depois... - meus pés pareciam muito importantes para ele - Eu não fui no enterro do meu pai, eu nunca disse adeus para ele.
- Eu não vou aguentar Eva. Todos ali foram a plateia da minha vida. Eu era a notícia da família, o triângulo amoroso que resultou num divisor de águas em forma de menino. Minha vó foi a única a me entender, entender que eu não tinha culpa de nada.
- Por isso você deve ir lá. Pela sua vó, não pelas pessoas que estão ali. - fitou meu rosto, capturou todas as minhas rugas de preocupação e me beijou. Suspirou fundo. Se afastou. Pegou minha mão e me puxou com passos firmes.

Realmente, a entrada de Chris chamou todos os olhares. Amish olhou duro para nós enquanto Aaron segurava a mão pálida de sua mãe, seus olhos lacrimejados denunciavam seu perfil romântico.

Soltei Chris e deixei-o sozinho para se aproximar de sua vó. Me surpreendi quando Aaron agarrou Chris de lado e o abraçou. Todos pareciam estar surpresos. Típica família grande fofoqueira.

Me senti deslocada ali, e sem chamar atenção, voltei para o lado de fora. Sentei no banco de madeira embaixo de uma árvore.

- Então Christoffer está tentando namorar de novo? - olhei para a voz grossa atrás de mim. Amish deu a volta e se sentou ao meu lado. Me afastei um pouco com medo. - Sabe... Você sabe a história? - não sei qual, mas afirmei com a cabeça.
- A mãe dele destruiu a minha vida. Eu tinha tudo. Depois, - riu irônico - perdi ela, ele, e a minha mãe. Bem antes de hoje, da sua morte, eu perdi a minha mãe.
- Você só perdeu ele por que quis. - não me contive calada.
- Não, não! Você não suportaria olhar na cara de um garoto fruto do amor do seu irmão com sua noiva. Eu via os olhares deles dois naquele verão. Mas meu irmão não era o suficiente. Apenas porque ele não tinha dinheiro, o que me doeu mais é que ela só continuou comigo por causa do dinheiro. - sua voz embargou. Eu não sabia o por quê dele estar se abrindo para mim mas não o impedi. - Depois daquele verão, Aaron - falou com raiva - saiu pelo mundo; avisando que nunca voltaria para casa. Saiu pelo mundo gastando o dinheiro da nossa família enquanto eu fazia o meu próprio. 4 semanas após sua partida, Chris estava formado. E já estava me enganando. A felicidade falsa que eu tive... - riu irônico de novo e bebeu um pouco do seu wisky - Eu via muito do meu irmão nele, mas eu não queria abrir os olhos. Não queria admitir que meu irmão ganhasse alguma coisa de mim. Nunca.
- Por isso você não contou para o Aaron?
- Hã! Eu nem falo com ele. Aaron não sabe de nada, porque nunca esteve aqui para saber de alguma coisa. Eu não faço mais parte dessa história, eu não faço parte de nenhuma...
- Eva? Que merda... - olhamos para trás, para o Chris duvidoso. Amish se levantou e se aproximou de Chris.
- Parabéns. - lhe entregou um papel - Eu poderia não fazer isso, mas a verdade é que eu não preciso disso. É melhor estar com você do que com Aaron. - deu umas batidinhas no ombro de Chris e se foi. Bravo, ele olhou para mim.
- Acho que ele estava bêbado.
- Isso não é explicação para você conversar com o babaca! - Chris ficou na minha frente.
- Ele contou tudo e falou alguma coisa sobre não ter mais haver nada com isso. - Chris revirou os olhos e se sentou no meu lado. Respirou fundo e abriu o envelope branco. Pálido. Na hora.
- Ele não tem mais nada haver porque minha vó não deixou nada para ele.
- Hã?
- Minha vó, - balançou o papel - Está tudo no meu nome. - arregalei os olhos o fitando.

Chris não precisaria estudar para passar em uma faculdade renomada, não precisaria procurar emprego no subúrbio, não precisaria limpar o chão da própria casa ou sequer limpar um espelho sujo. Não precisaria guardar dinheiro para comprar uma casa, nem menos um carro.

E eu não sei porque, mas isso me irritava.

Fuck the Shame - SKAM (*CONCLUÍDA*)Onde histórias criam vida. Descubra agora