LVIII - O Encontro - Silena

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Silena seguiu a indicação de um mago que lhe apontou uma porta. A guardiã parou segurando a maçaneta temendo a situação que poderia encontrar. Havia ouvido falar que Tenebrisen Kalamo estava no centro de cuidados do Continente dos Dragões, então tentou encontrar seu tio o mais rápido possível. Porém, estando tão perto de vê-lo novamente após ter sido pego pelos nakoushiniders a fazia pensar em que condições ele estaria.

Inspirou profundamente. Seja o que for, não é nada que eu não possa curar.

Empurrou a porta, abrindo passagem para um quarto arejado onde um homem permanecia sentado encostado na cabeceira da cama. Assim que viu Silena, Tenebrisen abriu um grande sorriso de felicidade sem esconder a alegria.

— Como... — Falou a garota confusa. — Como você está aqui?

O tio soltou um riso ladino. Enquanto ela se sentava na beirada da cama após terem se abraçado.

— Bom, eles ainda não são páreos para mim.

Apesar de reconhecer a tentativa dele de amenizar o clima da situação, também notou que não tinha tanta certeza em sua própria afirmação. Mesmo assim, não podia negar que o tio parecia ótimo fisicamente.

— E você? — Questionou o mais velho, claramente tentando mudar de assunto. — Como chegou aqui?

— Eu e Borotraz fomos para a floresta, como você disse, encontramos Skinhago e... — Fez uma breve pausa apesar de saber que não havia muitas formas de dizer o que precisava, então apenas falou de uma vez: — Ele se foi, assim como a floresta...

— O que?! — Tanto a voz quanto a expressão de seu tio demonstravam o mesmo tanto de choque e tristeza.

— Eu lamento... — Silena tentou confortá-lo, mas após alguns segundos de silêncio prosseguiu: — Ele disse para irmos até os imimoyas yenkwen, pois eles me dariam respostas... Acho que ele acertou, afinal... Encontrei você.

Sorriu, ainda que Cor Bor tivesse dito que ele estava em outro lugar, um que era potencialmente o mais perigoso para seres mágicos em todo Grande Continente.

— Então é verdade? — Perguntou Tenebrisen tentando também se concentrar nas partes mais positivas das notícias de Silena. — Os outros seres mágicos também estão aqui? Todos eles?

— Acho que não todos... Acredito que não chamaram os magos, mas ainda assim há muitos no pé da montanha. Imimoyas, egüeses, nimases... E pelo que ouvi, planejam até ter uma festa para comemorar a união de todos...

Ele levantou as sobrancelhas em uma expressão de admiração.

— Pensei que nunca viria tanta gente assim aqui outra vez...

— Não sei se é exatamente uma coisa boa. — Rebateu Silena em tom irônico. — Afinal, estão se reunindo para lutar...

Tenebrisen lhe encarou de volta e, por uma das primeiras vezes, não conseguiu ler a expressão do tio.

— Você está realmente tentando convencer uma pessoa que acabou de fugir de uma prisão de que não devemos lutar contra os nakoushiniders? — O tom dele era neutro, deixando sua fala ainda mais pesada.

— Falando assim...

— Desculpa... — Em segundos, ele recuperou a expressão acolhedora usual. — É só que... Deixa para lá...

Não precisava de nenhuma análise de guardiã da cura para saber que seu tio não estava em seu melhor estado, então não iria forçar uma discussão política naquele momento.

— Você precisa de ajuda com a cicatrização desse corte? — Perguntou sentindo a ferida costurada na base do abdômen do homem.

Quanto mais convivia com outras pessoas, melhor ficava em detectar ferimentos ou outras complicações corporais.

Tenebrisen sorriu em agradecimento silencioso pelo novo tópico da conversa.

— Seria ótimo. — Afirmou ele. — Já deram ponto e colocaram um curativo, mas acredito que você consegue fazer melhor. — Deu um pequeno riso no final.

Silena riu em resposta enquanto se preparava para realizar os movimentos de cura. No entanto, antes que pudesse começar, ouviu a porta do quarto abrir e se virou a tempo de ver uma criança pequena se aproximar correndo para pular na cama, passar por cima de Tenebrisen e se sentar do outro lado do colchão, enquanto o homem escondia uma expressão de dor.

Por alguns segundos, a guardiã viu seu tio olhar de uma garota para a outra, sem saber como dizer o que estava prestes a falar, mas por fim declarando:

— Celina, essa é sua prima Silena. Silena... Minha filha, Celina.

Tentou não demonstrar o quão confusa ficou com a afirmação, já que jurava que se seu tio tivesse tido uma criança, havia sido antes da guardiã da cura nascer. Porém, ao olhar para o homem, percebeu por sua expressão que ele ou não queria dar mais detalhes sobre o assunto, ou sequer sabia mais algo.

— Nossos nomes são bem parecidos. — Apontou a criança com uma sobrancelha levantada.

— É um nome comum. — Respondeu Silena com um sorriso, enquanto se perguntava se seu pai e tio haviam combinado alguma coisa em relação ao nome de suas filhas...

— Você faz magia também? — Ela mudou a expressão de desconfiança para curiosidade.

— Sim, sim. Sou uma guardiã da cura.

— Uoooou... — A criança arregalou os olhos admirada. Em seguida uniu as sobrancelhas. — O que isso faz?

A mais velha soltou um leve riso antes de responder.

Isso... Faz isso...

Ajudou Tenebrisen a levantar um pouco sua blusa e retirar o curativo, deixando o machucado exposto e fazendo a criança franzir a cara numa expressão de nojo. Em seguida, realizou o movimento que correspondia a magia de curar. Aos poucos, o ferimento começou a cicatrizar e os pedaços de linha se soltaram da carne, deixando unicamente um trecho de pele mais clara no local antes ferido.

— Uou! — Gritou a menina em admiração com os olhos arregalados.

Silena sorriu enquanto Celina narrava que queria ser uma guardiã da cura a partir de então, porém não iria ver machucados feios e nojentos. Os três continuaram conversando em paz por mais longas horas, como se Tenebrisen nunca tivesse se separado de nenhuma das duas garotas.

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