Tamborilo os dedos em minha própria coxa, coberta pela calça skinny preta. Olho de um lado ao outro, malmente enxergando as árvores que se perdem de vista. Ouço o canto dos grilos, que já não me incomodam mais há anos. Olho para cima, saldando a lua em toda a sua magnificência. Seu brilho me conforta. De fato, ela é minha única companhia até então.
Apanho meu celular no bolso de trás. Checo as horas. 20:03. Sexta-Feira.
A semana passou como um raio. Tive de manter a mente ocupada durante todos esses dias, pois, somente deste modo, era capaz de me esquecer momentaneamente dos conflitos internos que vinham me atormentando noite e dia. Ainda assim, é impossível fugir dos problemas para sempre.
Escuto passos e não demora muito até que Mali-Koa se sente ao meu lado na soleira da porta. Encaro-a ao mesmo tempo em que ela também o faz. Observo seu rosto, tão parecido com o meu; os traços femininos marcantes se moldam em uma face banhada pela preocupação mal disfarçada.
— Quero que me diga — sua voz soa duramente bela. Mali-Koa não precisa especificar o quê para que eu saiba à que ela se refere.
Dou de ombros, o rosto voltado para a lua.
— Acho que te conheço o suficiente para saber que há algo de errado — ela toca em uma de minhas pernas e eu instintivamente recuo ao sentir a mão fria. — Deixe-me adivinhar... — sinto seus dedos caminhando por minha coxa de forma engraçada. Mali-Koa quer me fazer rir, então forço o canto dos lábios em um sorrisinho que enganaria a muitos, mas não a minha irmã mais velha. — Ashton.
Suspiro. Ela repete o ato, mas se cala por alguns segundos.
A verdade é que sinto a falta dele. Acho que havia me acostumado com a presença constante de um anjo em minha vida. Em duas semanas, Ashton passou a representar um papel de muita importância para mim: ele era meu melhor amigo. Reconciliei-me com Nia (que continua solteira), mas é totalmente diferente. Eu era capaz de falar com Ashton literalmente vinte e quatro horas por dia se quisesse, tendo plena certeza de que ele não se cansaria de mim.
Eu deveria ter percebido que havia algo de errado com ele. Não notei que Ashton estava passando por alguma dificuldade, pois estava muito focado em "conquistar" Michael. Mesmo assim, ele não se chateava — continuava a me ouvir falar e falar, proclamando meu amor aos quatro ventos em meio a árvores espaçadas. Acho que, quando eu reclamei, foi o estopim. Eu não tinha o direito, mas meu egoísmo decidiu falar mais alto, como sempre.
Sempre fui uma pessoa individualista, afinal, não tinha exatamente com quem me preocupar. Nunca tive amigos. Nunca tive pessoas pelas quais zelar além de minha família. Por isso nunca soube lidar muito bem com os dramas de Nia ou, agora, com as questões pessoais de Ashton. Não sou bom nessa coisa chamada amizade. Não fui preparado a vida toda para isso como a maioria das pessoas.
O problema, também, é que sinto demais. Não posso evitar. Já fui descrito como uma pessoa intensa e posso dizer que é muito provável que esta seja uma bela definição para a minha personalidade.
— Nós discutimos — digo a Mali-Koa, ainda sem encará-la. É como se estivesse confidenciando minhas desilusões à própria lua.
Por outro lado, não acho que exagerei àquele dia com Ashton no quarto. Agi por impulso, embasado pela raiva, e acabei falando coisas que não devia e é apenas disso que me arrependo: do modo como falei com ele. Contudo, Ashton também falou comigo de maneira dura e cruel. Sei que ele me conhece muito, muito bem e era extremamente capaz de prever minha reação. Não estou o culpando pelo modo como me expressei, estou dizendo que eu não me sinto culpado por ter ficado com raiva.
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white wings • au!cashton
FanfictionAshton morreu no exato dia em que Calum nasceu. Desde então, tornou-se seu anjo da guarda, destinado a protegê-lo até seu último dia de vida. Como todo bom anjo, Ashton precisava se manter nas sombras, apenas observando seu protegido e garantindo su...