Heaven's Jealousest Angel

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Eu nunca quis ser um anjo. Mesmo destinado, sou um caso raro, uma anomalia num sistema que nunca falha. Eu sou uma exceção à regra — e a regra é bem clara: estão destinadas à vida angelical crianças cuja morte precoce é resultado de causas naturais. Quanto às outras crianças, mortas por meio de assassinatos, acidentes ou desastres, estas tem o poder de escolher para que lado seguir. Mesmo me encaixando na segunda opção, este não foi o meu caso.

Isto sempre me foi motivo de muita revolta; saber que eu poderia ter tido a chance de ir para o outro lado do Céu, juntamente com as almas comuns — que eu poderia simplesmente ter tido escolha! Mas não. Eu estava fadado a tomar conta daquela criança estúpida. Calum que me perdoe, mas se ele estava sempre coberto de arranhões e machucados, a culpa era minha.

Passei pelo menos nove anos culpando Calum pela minha desgraça. Eu não suportava vê-lo correndo por aquelas árvores. Não suportava assisti-lo tão feliz ao lado de seus pais, tão cúmplice de sua irmã mais velha. Eu não sabia o que era aquilo. Eu culpava Calum por roubar os meus momentos, a minha infância, a minha família. Em minha mente, Calum tinha tanta culpa quanto a porcaria do Destino. A verdade é que meu coração estava mergulhado em um mar de inveja; o sentimento transbordava o bastante para que eu não me importasse ao vê-lo se machucando no bosque, principalmente quando a maldita casa na árvore foi construída, se parecendo exatamente como no dia em que morri.

Tudo mudou no momento em que apareci para Calum pela primeira vez. Ele estava caindo do degrau mais alto da escadinha que o levava até a casinha e eu simplesmente entrei em choque. O tempo desacelerou, como sempre acontecia quando eu tinha a chance de salvá-lo de algo, e eu, acostumado à apenas observar o desenrolar natural das coisas com um sorrisinho maléfico, me desesperei. Eu não tinha experiência alguma em ajudá-lo, mas, quando o vi cair, soube que tinha de fazer algo — então lá estava eu, materializado, segurando Calum Hood em meus braços. No momento em que fiz isso, soube que estava ferrado. Minhas pernas bambearam e eu fui ao chão, com aquele corpo magricela sobre o meu.

A situação me serviu de aprendizado, pois 1) eu descobri que quando eu clamava aos quatro cantos que gostaria muito de ter minhas asas cortadas, eu estava apenas blefando; 2) eu percebi que o que eu mais desejava era me sentir parte de algo quando, na verdade, eu já fazia parte de alguém; 3) eu cheguei a conclusão de que eu tinha que tomar conta de Calum da melhor forma possível antes que eu me arrependesse.

É claro que foram necessários alguns sermões e ameaças para que eu compreendesse tais coisas, além de alguns dias apenas apreciando o modo como Calum falava sobre mim para Mali-Koa, jurando por meio de todas as formas existentes que eu de fato existia. Os anciões queriam que eu voltasse lá e mudasse o que aconteceu, mas eu decidi arcar com as consequências. Passei a me importar mais com Calum e seu bem estar após o ocorrido, tornando-me mais empático e finalmente me livrando da inveja.

A verdade é que os anjos não são assim tão puros. Por conta do modo como observamos o mundo, é ainda mais fácil deixar que os pecados nos subam a mente e tomem conta de nossos corações. Por isso, é necessário ter extrema cautela. Eu poderia ter me tornado uma pessoa horrível se tivesse deixado o egoísmo, a inveja e a apatia me consumirem. Graças a Deus, consegui me libertar de tais sentimentos a tempo.

Mas é melhor que eu deixe os meus primeiros anos como um anjo para trás. Arrependo-me do modo como costumava agir, mas contanto que eu seja uma pessoa boa no presente, meu antigo comportamento tóxico não tem mais tanta importância. Não vou revirar esta parte do passado. Acho melhor que eu me concentre em proteger Calum no momento atual. Fisicamente, tem sido fácil; mas de que adianta proteger o corpo quando se deve zelar pelo coração?

Nada contra Michael, mas... Certo, eu tenho muito contra Michael. Não seria esforço algum produzir uma lista a partir do título "Por que Michael Clifford é tão detestável?". Espere aí, um livro seria bem melhor. Uma saga, quem sabe? O fato é que Michael é simplesmente insuportável. Não sei como Calum consegue endeusá-lo tanto (na verdade, sei sim, ele está cego)!

white wings • au!cashtonOnde histórias criam vida. Descubra agora