CAPÍTULO V

881 55 1
                                    

Mãe, irmã e amigo de Carlos estavam sentados no quarto à sua espera. Já tinham conversado de tudo. Estavam agora em silêncio, aguardando a chegada de Carlos. De repente, alguém bateu à porta. Sim, era ele! Finalmente! Os três pularam das cadeiras onde estavam sentados para recebê-lo.

- Meu filho! Que susto você nos fez passar! Que angústia, meu Deus! - disse a mãe.

Carlos não estava muito para conversa, continuou calado.

- Como você está se sentindo, meu filho? - continuou ela.

- Mãe, tenha calma, deixa ele quieto um pouco. - disse a irmã.

Carlos continuava em silêncio, pensativo, sem olhar para as pessoas do quarto. A irmã se aproximou e apertou sua mão. Ele, ao sentir o toque, apertou de volta a mão da irmã. Então, olhou para ela. Seus olhos estavam cheios de lágrimas. Ele continuou em silêncio.

- Bem vindo de volta, cara. - disse o amigo.

Carlos retribuiu as boas vindas com a cabeça. Inspirou todo o ar que pôde, fechou os olhos, expirou. Estava vivo, graças a Deus. Que ideia estúpida fora a dele de se meter naquele acidente. Sentia-se um idiota. Fazer pessoas queridas passarem por tanto sofrimento, que tolice a dele. Não parava de pensar em sua filha. Foi então que disse:

-Maria… cadê a Maria?

- Agora, está na escola. - disse a irmã.

- O que vocês disseram a ela sobre mim? - perguntou Carlos.

- A verdade. Dissemos que você se machucou, estava no hospital, mas que ia ficar bom logo. - disse a irmã.

- Ela está sendo bem assistida, não se preocupe. - disse o rapaz - Fique tranquilo, meu amigo, agora é aguardar a recuperação.

- Assim que você melhorar, traremos ela aqui. - disse a irmã.

Carlos estava mais calmo, mas ainda com uma grande raiva de si mesmo. Era culpa sua e somente sua todos estarem passando por aquilo. Queria se trancar num quarto escuro e não falar com ninguém. “Sou um idiota”, é tudo que conseguia pensar. Sentia-se estranho, a cabeça estava pesada, a garganta ainda incomodava. As pernas formigavam, não tinha forças para movê-las. Onde andava aquela médica? Cristina. Precisava da segurança que suas palavras traziam. Precisava saber exatamente qual era seu estado de saúde.

- A doutora já falou com você? - Perguntou a irmã a Carlos.

- Muito rapidamente. - respondeu ele.

- A enfermeira disse que ela deve vir aqui falar conosco - disse o amigo.

- Ah, meu filho! A doutora Cristina tem sido um anjo! Ela tem cuidado muito bem de você e também de nós! - contou mãe, com admiração em suas palavras.

- Falando nela… - disse a irmã - Olha ela aí.

Carlos olhou para a porta e lá vinha ela. Agora conseguia enxergá-la melhor. A vista não estava mais tão embaçada. Estava menos tonto. Era uma mulher de aparência comum. Cabelos e olhos escuros. Contudo, era uma pessoa que lhe parecia ser muito forte. Sua presença era difícil de não ser notada, pois preenchia todo o ambiente a sua volta. Cristina adentrou o quarto, cumprimentou os familiares com um sorriso e olhou para Carlos, ainda com um sorriso.

- Espero que esse seu sorriso esteja trazendo boas notícias a meu respeito. - disse Carlos.

- Eu sei que você já deve ter ouvido essa pergunta de seus familiares hoje, mas, de fato, preciso saber: Como você está se sentindo? - perguntou ela.

- Ainda estou meio grogue, meio tonto.

- Alguma dor? Cabeça? Coluna?

- O corpo está meio dolorido.  

- Vai melhorar com o tempo. Passou o incômodo na garganta?

-Passou. Mas minhas pernas…

- Sim? Como estão suas pernas?

- Estão formigando, sinto uma fraqueza… não sei… não tenho forças para movê-las…

- Muito bem, vou lhe explicar tudo o que aconteceu com você. - disse Cristina. - Você sofreu fraturas pelo corpo. Uma costela quebrada provocou um sangramento interno, mas foi contido rapidamente. Não houve traumatismo, mas houve um edema, um inchaço no cérebro. Por causa desse edema e dos ferimentos, você foi mantido por certo tempo, em um coma induzido, como eu já expliquei mais cedo.

- Tudo bem, mas… e as minhas pernas, doutora?

- Sua coluna cervical sofreu uma pequena fratura, na parte mais embaixo. Um fragmento de osso estava comprimindo a medula espinhal e foi retirado cirurgicamente. Aparentemente não houve lesão na medula, mas vamos ter que acompanhar a evolução do quadro. Pode-se desenvolver alguma paralisia temporária, formigamento nos membros, ou ainda uma fraqueza permanente nas pernas. Tudo vai depender de como seu corpo vai reagir.

- O que a senhora está me dizendo é que não corro o risco de ficar paraplégico, mas posso ter os movimentos prejudicados. É isso?

- Há uma possibilidade. Mas, ao que tudo indica, você deve se recuperar bem. Pacientes com esse quadro podem sentir dor na coluna, fraqueza e dormência nos membros inferiores. O que você está sentindo está absolutamente dentro do esperado. Vamos aguardar a evolução do seu quadro e do tratamento.

- Tratamento? Como será esse tratamento? - questionou ele.

- É necessário um processo de reabilitação. Demanda dedicação e paciência. O objetivo é reduzir a dor que porventura possa aparecer, recuperar a mobilidade do paciente, melhorar a força e equilíbrio. Enfim, buscar a recuperação completa da lesão.

- Paciência. É tudo o que eu não tenho, doutora. - disse Carlos com desânimo.

- Enquanto você esteve inconsciente ouvi muitas histórias a seu respeito. Sei que você é um homem destemido. Vai encarar esse desafio.

- Meu Deus, o que andaram dizendo por aí de mim?!

- Que você é um homem de garra. - disse Cristina, olhando dentro dos olhos de Carlos - Acredito neles.

Disse isso, deu uma piscadela, sorriu e se foi, deixando Carlos sem palavras e sem ação. Não havia escolha, a não ser encarar o que viria pela frente.

RecomeçoOnde histórias criam vida. Descubra agora