- Bom dia, Carlos, como passou a noite? - cumprimentou doutor Eduardo - pronto pra começar a reabilitação?- Sim, doutor, estou bastante ansioso até. Pra mim vai ser bom levantar dessa cama, botar o corpo para funcionar - respondeu ele.
Três dias haviam se passado desde a última visita de Eduardo informando sobre o início das sessões de fisioterapia. Desde então Carlos não via a hora de começar. Queria se recuperar o quanto antes. Tinha pressa em retomar sua vida. Aquele tempo ali confinado não tinha sido de todo ruim. Tinha refletido sobre sua vida até então, sobre o acidente em si e a vida que estava levando antes de tudo acontecer.
- Vai ser bom pra ele sair um pouco do quarto, mudar de ares - disse Isabel, que estava com Carlos naquela manhã.
- Bem, como você sabe, o acidente causou-lhe algumas fraturas. Mas o fato de você ter estado desacordado por umas três semanas poupou-lhe boa parte do incômodo, principalmente nas costelas. Costelas quebradas não são enfaixadas, nem imobilizadas, é complicado para o paciente que está consciente. Também ajudou bastante na sua recuperação o fato de ter estado completamente parado durante essas primeiras semanas - continuou ele. Os exames que você fez há uns dias mostraram bons resultados. Já pode tirar essa bota da perna e a tala do pulso. Daqui a pouco o enfermeiro virá buscá-lo. Vamos botar essas pernas pra funcionar de novo.
- Obrigado, doutor. Fico feliz em saber que o resultado dos exames foi positivo - respondeu Carlos.
- Sim, bastante. Você é um rapaz saudável. Daqui a pouco vai estar de pé novamente. Bem, eu vou indo. Mais tarde passo aqui novamente para saber como foi esse início de reabilitação - despediu-se Eduardo.
- Sim, obrigada doutor - agradeceu Isabel.
***
- Bom dia, meninas! Como estão! Olha aqui eu atrasada de novo! - disse Cristina chegando para o trabalho - Nossa! Tô sempre atrasada!
- Também, trabalhando feito louca, não sei até quando você aguenta. Daqui a pouco dá um piripaque e aí vai ter que dar um tempo do trabalho à força - respondeu Débora com uma bronca.
- Ela tá querendo virar paciente, Doutora Débora. Só pode - brincou Camila.
- Verdade! - riu Débora.
- Vocês viram que a Maria, filhinha do Carlos esteve aí de novo? - perguntou Camila - é uma fofa!
- Vi, é uma graça mesmo - respondeu Débora.
- Nunca vi a menina. Sempre vem em dias que não estou aqui. Mas já ouvi falar que é um amorzinho - disse Cristina.
- Quem será a mãe dela? - indagou Débora - Parece que mora com Carlos. A avó e a tia estão cuidando dela enquanto ele se recupera.
- Olha, não sei. Estranho, né... E ele deve ser solteiro. Tirando visitas de pessoas amigas, que geralmente vem em grupo, somente a mãe, a irmã e o amigo Augusto é que estão sempre com ele. - disse Camila.
- Realmente, não é comum ver o pai criando filhos sozinho - questionou-se Cristina.
- Além de lindo parece bom pai. Mais um ponto pra ele - Débora disse isso, olhou para Cristina com um olhar de indireta, abriu a porta e saiu.
***
Carlos saíra para a fisioterapia e Dona Guadalupe estava no quarto a sua espera. Arrumava os pertences de Carlos, roupas sujas para lavar em casa. Pensava na conversa inacabada com doutora Cristina sobre o estado emocional de Carlos. Sentia nele uma certa mudança, como se ele estivesse menos impulsivo.
Não tinha continuado a conversa com a doutora, mas, no fundo, sabia que ela se importava com Carlos. Sentia que essa mudança de Carlos tinha grande influência dela. O filho tinha mencionado algumas vezes sobre conversas entre ele e a doutora Cristina.
Engraçado... Riu Dona Guadalupe consigo mesma. A doutora havia dito que não era psicóloga, mas acabou se saindo bem. Carlos estava mais centrado, não via nele mais aquele rapaz perdido de antes. Nunca havia sequer pronunciado o nome daquela mulher dos infernos desde que tudo aconteceu. Apesar de Carlos nunca ter dito uma palavra a respeito, sabia que aquele acidente tinha o dedo dela.
- Estamos de volta, Dona Guadalupe! Trouxe seu filho são e salvo! - disse o enfermeiro trazendo Carlos na cadeira de rodas.
- Espero que tenha se comportado bem - brincou ela.
- Sim, comportou-se muito bem - respondeu ele - Bem, eu vou indo. A enfermeira deve vir daqui a pouco com a medicação dele.
- Muito obrigado pela carona - agradeceu Carlos.
- E então, meu filho, tudo certo? Como foi? - perguntou Dona Guadalupe.
- Tudo certo, mãe, mas é um caminho um pouco longo ainda... Eu estou pedindo muita paciência a Deus...
- Força, meu filho, força... vai dar tudo certo!
- Vai sim, mãe. Eu tenho bastante esperança que vai... - respondeu ele um pouco desanimado - Vou dar o melhor de mim sempre. Preciso ficar de pé novamente. Não quero ser um estorvo para ninguém. Pra começo de conversa, eu não tinha que ter me metido nessa fria. E metido a senhora, a Isabel, o Augusto e a Maria junto... - desabafou ele.
- Meu filho, não diga isso, vai ficar tudo bem. Olha aí você se recuperando bem! - respondeu Dona Guadalupe.
- Olá, bom dia - bateu a enfermeira à porta.
- Bom dia, entre Camila - disse Dona Guadalupe.
- Estou trazendo a medicação do Carlos.
- Obrigada - agradeceu Dona Guadalupe.
- Doutora Cristina está aí hoje, disse que vai passar aqui depois do almoço para saber como foi o primeiro dia de fisioterapia do Carlos - disse a enfermeira.
- Essa doutora Cristina não falha mesmo, né. Deve ser... como se diz? Workaholic? Acho que é assim.
- É assim mesmo que se diz. - respondeu Carlos, achando graça. - gostei do seu inglês.
- A senhora está certa, Dona Guadalupe, ela é workaholic sim. Não pára, não dá um tempo. Sempre trabalhando. Ela se desiludiu do amor, eu acho. Aí fica tentando compensar com trabalho. O fim de seu casamento a fez ficar pragmática demais. Desde que se separou, nunca mais ela se relacionou com ninguém. Ela diz que não quer mais saber de relacionamentos, só trabalho, trabalho e trabalho. Diz que não vale o aborrecimento. É como se estivesse se auto punindo por ter amado a pessoa errada. Sei lá. Espero que um dia ela abra o coração novamente. É uma moça jovem ainda.
- Sim, jovem ainda... e um encanto de pessoa... não é mesmo, Carlos? - elogiou Dona Guadalupe.
- Sim, é verdade... - disse Carlos pensativo.
Tudo a respeito de Cristina o intrigava. Era uma mulher com um grande poder de chamar a atenção alheia para si e ao mesmo tempo muito reservada. E isso aguçava seus questionamentos sobre a vida pessoal dela. Tem gente que você conhece na fila do banco e já vai dizendo tudo ao próprio respeito. Ela era o oposto. Quase nunca falava a respeito de si mesma. Mostrava-se sempre tão preocupada com o bem estar dos outros, ao passo que parecia sempre pensar muito pouco em si. E essa curiosidade que Carlos tinha a respeito de Cristina a cada dia aumentava mais. Não conseguia disfarçar às vezes.
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Recomeço
RomanceUm terrível acidente une os destinos de Cristina - uma médica dedicada, que ama o que faz - e Carlos - um homem impulsivo e cativante. Sua vida está agora nas mãos competentes de Cristina. Depois desse encontro de destinos suas vidas jamais serão as...