CAPÍTULO LXVIII

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Carlos vê aquela cena perturbadora, mas mantém o autocontrole. De qualquer forma, não havia nada que pudesse ser feito. Pra todos os efeitos, Cristina e ele haviam dado um tempo. Ele não estava entendendo nada. O que os dois faziam ali, a sós, de mãos dadas? Será que a Cristina enlouqueceu?!? O Eduardo?!? Pensou ele. Seria uma vingança por ela ter descoberto sobre Vivian? E o pior de tudo! Ele próprio estava ali na companhia de Vivian!!! Meu Deus do Céu, que falta de sorte! Ele puxa Vivian e vai sentar mais afastado, na esperança de não ser notado. Esforço sem resultado. Cristina havia visto os dois assim que chegaram na praça de alimentação.

Eduardo está de costas, não vê quando Carlos chega. Cristina vê o casal chegar e sentar bem longe. Também ela fica quieta e não comenta nada com Eduardo. Seria muito difícil tentar explicar aquela situação toda. Para a sorte de todos, nem Eduardo e nem Vivian percebem nada. Apenas Carlos e Cristina percebem a situação.

Cristina, como não podia deixar de ser, estava surpresa em ver os dois juntos. Qual seria o motivo? Seria somente a gravidez de Vivian? Ou haveria algo mais? Mas sabia que não estava em condições de cobrar nada de Carlos, já que ela estava na companhia de Eduardo.

– Está se sentindo melhor? – Carlos pergunta a Vivian, sem deixar transparecer o transtorno que está sentindo ao ver Eduardo e Cristina juntos.

– Estou sim, obrigada.

– Fique atenta, isso de pressão alta é muito perigoso.

– Sim, o médico me explicou – responde Vivian.

– Olha, a gravidez está na reta final, procura se cuidar. Por você e pelo bebê. Se você tiver algum mal estar, me avisa tá? No caso de emergência, faça uma ligação, às vezes eu demoro para ler mensagens.

– Tá... Tudo bem... Mas...

– Mas o quê? – pergunta Carlos.

– E a sua namorada?

– O que tem ela?

– Não vai ser legal você atender algum telefonema meu se você estiver com ela.

– Ela já sabe de toda história – diz Carlos.

– E ela não deu chilique?

– Ela é uma mulher discreta e polida. Ela não dá chiliques.

– Eu vi vocês juntos outro dia – confessa Vivian.

– E aonde você nos viu juntos, posso saber? – pergunta Carlos, curioso.

– Estava passando, por coincidência, vi vocês dois entrando no restaurante – diz ela, omitindo o fato de Ciro por vezes tê-lo seguido. – Deu pra perceber que sou muito mais jovem do que ela.

– De fato, ela é um pouco mais velha do que você. E também mais experiente, e mais sábia. É também uma mulher forte e determinada. E, pra ser bem sincero, eu é que sou velho pra namorar você. Eu não me enxergava.

– Admita. Você gostava de ser visto por aí na minha companhia. Gostava de ver os olhares de inveja. Sou também muito mais bonita que ela – provoca Vivian.

– Você é mais vaidosa, sem dúvida. Com toda certeza atrai olhares com as minissaias e decotes que você gosta de usar. Agora, ser mais bonita do que ela, veja bem, isso é você mesma quem está dizendo. A beleza está nos olhos de quem vê, é algo extremamente subjetivo.

– Por acaso, você está sugerindo que ela seja mais bonita do que eu? É isso? Ah... Fala sério...

– Vivian, você não é mais criança, mas está se comportando como tal. Isso não é nenhuma historinha de Madrasta e Branca de Neve perguntando ao espelho mágico quem é mais bonita. Isso é a vida real. O fato de você ou ela ser mais bonita é totalmente irrelevante – responde Carlos com impaciência. – Bom, com sua licença, preciso ir ao banheiro.
Carlos levantou-se e caminhou até um determinado local do shopping center aonde os banheiros estavam localizados. Qual não foi sua surpresa ao dar de cara com Cristina saindo do banheiro feminino. Ela passa direto, ignorando-o. Ele estica a mão e segura a mão de Cristina. Ela então para e olha para ele.

– Não precisa fingir que não me viu, Cristina – diz ele.

– Desculpe, não quero atrapalhar seu encontro. Finja que não estou aqui.

– Não é um encontro – afirma Carlos. – Você sabe da condição de Vivian, o que até me deixa aliviado. Não há mais segredos entre você e eu. Pelo menos da minha parte.

– Você não me deve explicações. Agora, se vocês dois resolverem discutir, vê se dessa vez não enfia o carro no muro – alfineta Cristina.

– Entendo seu aborrecimento, mas não tem a mínima necessidade de você dizer esse tipo de coisa, Cristina.

– Tem razão. Me perdoe – responde ela.

– Vivian sentiu-se mal essa manhã e me pediu ajuda. A pressão dela subiu bastante. Você sabe que a gravidez dela já está bem avançada, é preciso atenção. Resolvemos passar aqui para que ela possa se alimentar, tendo em vista o horário, depois vou levá-la para casa.

– Já disse que não precisa me dar satisfações.

– Eu sei. Quero lhe dar satisfações mesmo assim. De qualquer forma, mande minhas lembranças a Eduardo.

– Ele e eu só estamos conversando, mais nada.

– Só conversando, Cristina... Agora aonde vou dou de cara com vocês dois “só conversando”. O que está acontecendo entre você e só Eduardo pra vocês andarem conversando tanto?

Seria muito difícil Cristina explicar para Carlos o teor da conversa. Só iria gerar mais estresse ainda naquele momento. Certamente Carlos diria que Eduardo a estava enganando só para estar ao lado dela. Como explicar essa mudança repentina de comportamento de seu ex-marido, se até ela mesma custava a acreditar? Realmente era complicado... Aliás, Carlos sentia ciúmes até da expressão “ex-marido”, pois fazia-o lembrar que Cristina e Eduardo já haviam sido casados. Imagina agora se ela conta que estavam ali exatamente falando sobre o período em que foram casados...

– Sei que não é da minha conta, mas, depois do incidente no apartamento, e todas as coisas impronunciáveis que Eduardo te disse, a última coisa que eu iria imaginar na minha vida era ver vocês dois sentados de mãos dadas.

– Volto a afirmar, é apenas uma conversa, sem segundas intenções – insiste Cristina.

– Então avise isso a ele. Parece que ele não está sabendo disso.

– Carlos... Não quero ficar aqui defendendo o Eduardo, mas você está enganado.

– Deve ser porque o Eduardo é um anjo de candura, não é mesmo...

– Não, ele não é um anjo, é só um ser humano, como eu e você. Cheio de imperfeições, como eu e você.

– Ainda bem que você disse que não quer ficar defendendo o Eduardo.

– Carlos, por favor...
Cristina sabia que era muito difícil explicar toda aquela situação para Carlos.

– Essa paixão por você, Cristina, me devolveu a vida, me colocou de pé novamente. Eu adoraria ter esse sentimento retribuído, mas não posso mandar em você. Não posso dar ordens nem a você, nem ao seu coração. Eu só posso lhe ser profundamente grato e guardar esse sentimento por você aqui dentro. Prefiro sentir essa dor de amar e não ser correspondido do que não sentir nada. Se você e ele estiverem se entendendo de novo, a escolha é sua.

– Não é nada disso que você está imaginando, Carlos – insiste Cristina.

– Eu estou aqui seguindo a minha vida. Não vou tentar tirar você da minha cabeça porque você sabe que sou apaixonado por você. Mas não vou ficar insistindo. Você pediu um tempo e você tem esse tempo. Não tem que me dar explicações de nada. Já vivemos alguns anos de vida você e eu. Então não sou eu que vou te dar lições de nada. Você sabe como e onde me encontrar – diz Carlos.

– Olha, o momento é desfavorável para nós dois. Você está na companhia de Vivian e eu na companhia de Eduardo. Está tudo muito confuso – diz Cristina.

– Nós estamos momentaneamente separados, então, via de regra, não há problema em estarmos acompanhados de outras pessoas. A vida é assim – responde ele. – E  como você pode ver, preciso ir ao banheiro. Não tem como estendermos mais essa conversa. Estou apertado.

Carlos diz isso e sai em direção ao banheiro, deixando Cristina para trás.

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