Capítulo 7

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Eu estava olhando estupefata para ele. Thomas acenou com a cabeça para o sinal de trânsito. Coloquei o carro em marcha e, depois de uns cinco minutos supersilenciosos dentro do carro, consegui chegar à frente da minha casa. - Okay. Pode cortar a piada agora - falei e nem sequer fiz menção de descer do carro. - O que você veio fazer aqui? - Nosso projeto de Biologia. Mentira... O quê? Puta merda! Eu tinha me esquecido completamente do nosso projeto de Biologia. - O qu... espera... poderíamos ter feito isso na biblioteca, Thomas - argumentei, tentando evitar corar de vergonha. - Claro que sim, mas estaríamos obrigados a manter aquele silêncio fúnebre ao qual as bibliotecas nos obrigam. Como discutiríamos os temas? Bem pensado, se olhássemos por aquele ponto. - Você não deveria ter ao menos se dado ao trabalho de averiguar comigo se eu poderia fazer isso hoje? - perguntei melindrada.- Não. Porque sei que você daria alguma desculpa muito esfarrapada para isso. - Thomas olhou diretamente nos meus olhos. - Eu sei que você me evita constantemente. - Não! Eu não faço isso - menti descaradamente. - Você sabia que dois "nãos" seguidos anulam o primeiro, certo? Que porra de menino inteligente era aquele, hein? - Thomas. - Rainbow - ele repetiu meu tom de voz. - Eu apenas quero fazer o trabalho sossegado, okay? Aceitei a explicação e desci do carro. Fui caminhando para a porta da frente de casa, consciente da presença dele logo atrás de mim. Uma presença muito marcante e perturbadora. Eu nunca tinha tido muito tempo para curtir essa onda de garotos bonitos e tal. Acho que porque sempre fui centrada demais nos meus estudos e tudo mais. A onda hormonal de assanhamento, eu havia deixado para minha irmã. Claro que eu sabia que não seria uma tia solteirona com vinte gatos perambulando pela casa, mas também não estava interessada em acelerar o processo de conhecer e me encantar com garotos, porque eu sabia que teria muito tempo pela frente. Thomas Reynard chegou em minha vida para jogar por terra toda essa minha filosofia arduamente conquistada. Ao longo dos dias, desde que o conheci, fiquei muito consciente do meu corpo, dos meus anseios, até então completamente desconhecidos, do espaço pessoal que ele nunca deixava entre nós dois... Eu não sabia a razão, mas Thomas conseguia me fazer perder a fala, agir como uma adolescente deslumbrada. E, na contramão daqueles sentimentos conturbados e estranhos para mim, eu tentava demonstrar que era infalível, agindo de maneira mal-humorada, mais do que já agia normalmente. Quando entrei em casa, chamei pela minha mãe. - Mãe? Um papel colado na porta da cozinha chamou minha atenção. "Queridos, eu e seu pai fomos para um jantar da associação e vamos demorar um pouco a voltar. Deixei o jantar pronto em tupperwares separadas com os nomes de cada um. Basta que vocês esquentem no micro-ondas e sejam felizes. E comportem-se, claro. Amo vocês." Sorri, porque, por mais que meus pais odiassem as comodidades capitalistas da vida, ainda assim eles sabiam que a vida sem um micro-ondas não seria a mesma. - Então, estamos sozinhos aqui? - ele perguntou e quase dei um pulo, porque ele estava bem atrás de mim. - Ah... acho que sim. Até que Storm chegue ou Sunny. - Fiz questão de dar aquela informação para me sentir segura. Coloquei uma mecha de cabelo atrás da orelha e me afastei, nervosamente. - Você... ah... quer beber alguma coisa? - perguntei.- Não, obrigado. Eu não sabia o que fazer, então bebi um copo d'água para refrescar os ânimos. Ele apenas me observava. Peguei a mochila que havia largado de qualquer maneira e fiquei refletindo sobre o que fazer. Chamar para fazer o dever no meu quarto era inconcebível. Então a alternativa era a sala ou a cozinha. - Podemos fazer o dever aqui. - Okay.Thomas sentou-se na cadeira e retirou seu material da mochila. Em seguida, retirou o laptop. Enquanto ligava o computador e abria o programa, eu tentava achar no livro o tema que deveríamos explorar. Meus dedos estavam trêmulos. Minha mente havia dado um branco total e eu nem sequer lembrava sobre o que era o trabalho. Precisaria consultar minhas anotações. Eu era um estranho caso de confusão mental. Ouvi quando Thomas pigarreou.- Pronto - ele disse. Ergui a sobrancelha sem compreender o que ele estava falando. - Pronto o quê? - O nosso projeto está devidamente pronto. Abri a boca em questionamento e fiquei ali, parecendo um peixe. Abrindo e fechando a boca. Sem entender absolutamente nada. Thomas passou as mãos pelos cabelos, deixando-os numa confusão altamente sexy. Afastei o olhar para outro ponto. A tela do laptop. Cheguei mais perto e olhei por cima de seus ombros. O projeto estava realmente todo feito. Com mais de quinze páginas, gráficos e até mesmo a bibliografia. Fiquei espantada. - O... o quê? Thomas se virou para olhar para mim. Seus olhos tinham um brilho único. - Você sempre conclui os trabalhos e equações em sala, então, em retribuição a todo esse esforço, eu fiz o projeto sozinho e coloquei nossos nomes. Basta que você faça uma leitura para se ambientar no assunto. Eu ainda estava estupefata. - Mas por que isso? -perguntei, tentando entender minha irritação e inquietação. Por acaso já falei que quando fico inquieta com algo desconhecido eu tendo a ficar irritada? - Por que o quê? - perguntou e se levantou. - Por que fiz o trabalho sozinho? - Então, por que não me falou, - eu disse. - Daí não haveria necessidade de estarmos aqui. Ele se aproximou de mim e percebi que me afastava para trás. - Por que eu não te falei antes? - ele disse e passou a língua no lábio inferior. - Hummm... deixe-me ver, talvez porque eu quisesse estar aqui com você? -Por quê? Ai, meu Deus. Meu coração estava batendo acelerado e quase saltando do peito. Se vacilasse, era capaz de alguém perceber as oscilações dos batimentos cardíacos através da minha blusa. - Talvez para passar mais tempo com você? - ele perguntou e se aproximou mais ainda. Meu corpo encontrou a borda da pia atrás de mim, e parei. Thomas se aproximou o suficiente para que não houvesse espaço entre nossos corpos. Eu respirava agitadamente agora. Estava nervosa. Tipo... muito nervosa.Thomas. - Rainbow - ele disse, e afastou uma mecha do meu cabelo que havia escapado da trança. - Para uma garota esperta, você pode ser bastante desligada e meio cega. O insulto passou completamente despercebido porque logo em seguida Thomas baixou os lábios nos meus, grudando-os. Eu apenas tive um segundo para me acostumar com a calidez de sua boca, até que ouvi um gemido, que não sei até agora se havia sido meu ou dele, ou talvez de ambos, e o beijo se aprofundou. O que era brando tornou-se uma exploração selvagem, com sua língua varrendo a minha, em busca de uma parceira de dança. Foi o beijo mais sensual que eu já havia dado na minha vida. Okay. Eu só tinha dado dois ou três no ano anterior, mas, ainda assim, aquele ali era absolutamente incomparável. Não havia palavras para descrever. Talvez apenas nos romances que eu tanto amava. As mãos de Thomas seguraram minha cabeça, ajeitando-a num ângulo perfeito para aprofundar o beijo. Senti quando seu corpo ficou completamente aderido ao meu, senti sua respiração em conjunto com a minha, como se tivéssemos corrido uma maratona brutal. Senti os dedos longos acariciando meu rosto. Em todo o auge da minha nerdice extrema, aquele beijo perfeito ainda foi destrinchado na minha mente, quando percebi que a inclinação da minha cabeça para um lado e a dele para o outro criava um ângulo muito adequado de encaixe entre nossos lábios. O beijo acabou e senti a testa dele recostando-se à minha, bem como sua respiração enlouquecida, fazendo par com o meu estado de ânimo naquele momento. Seus olhos estavam fechados; os meus, abertos. Posso afirmar que o beijei com os olhos abertos, mas sem ver absolutamente nada, porque Thomas Reynard havia tirado a minha capacidade de pensar adequadamente. Que mico! Eu não fechei os olhos no beijo mais gostoso que já dei na vida! Fora que agora eu sentia a dúvida bater em mim de maneira sorrateira. Será que eu havia correspondido à altura? - Porra. - Foi o que ele disse. Nada romântico, nem nada. Mas mesmo assim uma simples palavra que continha muito mais sentimentos do que poderíamos expressar. Eu mesma não poderia falar nada melhor. Talvez... uau. Ele me segurava contra seu corpo, as mãos ainda encapsulando meu rosto. Quando ele abriu os olhos e me olhou intensamente, lá estava aquele brilho único que eu havia identificado momentos antes, ainda mais intenso. Eu reconheci. Era o brilho do desejo. Acho que os meus olhos deveriam estar refletindo os dele. - Essa foi a razão pela qual não falei nada antes - ele disse. - Ahhh... Suas mãos mantinham meu rosto devidamente acolhido, os lábios muito próximos. Repentinamente, uma música de rock invadiu o silêncio da cozinha e perdi o calor da mão direita de Thomas. Era o celular dele que interrompia aquele momento mágico. - Já estou saindo. Thomas disse apenas aquela única frase à pessoa do outro lado da linha, desligou e se afastou de mim meio a contragosto, começando a recolher suas coisas. O quê? Tipo... ele me beija e... vai embora? Que porra é essa? Ironicamente, pensei que a mesma palavra que ele havia proferido assim que encerrou nosso beijo agora perambulava pela minha mente, já que eu não conseguia entender sua fuga repentina. Ou, na verdade, eu precisava admitir, não conseguia entender nada. - Thomas? Ele arrumava suas coisas agitadamente. Vi quando respirou fundo antes de se virar para mim e falar rapidamente: - Eu preciso ir embora. Thomas ergueu a mochila, colocou no ombro e começou a ir em direção à porta, então parou de repente, ainda de costas para mim, respirando asperamente. - Eu não vou me desculpar, Rainbow. - Essa foi a sentença proferida em um tom firme de voz.- Te vejo na escola. E saiu. Simples assim. Ele me deixou ali, na cozinha, ardendo em chamas invisíveis, com os lábios inchados e sedentos, nem um pouco saciados do beijo marcante que me dera. Para quem nunca havia conhecido um grama sequer de paixão ou desejo antes, eu podia jurar que meu corpo estava formigando. Cheguei à janela a tempo de ver seu amigo Mike, com o carro dele, lhe entregando as chaves e entrando no banco do carona. Thomas deu um último olhar para minha casa, mas graças a Deus não me percebeu por trás do vidro fumê todo trabalhado que havia na lateral da porta. Subi para o meu quarto como um autômato. Um zumbi sem vontade própria. Sentei na cama, respirei profundamente várias vezes e resolvi que deveria tomar um banho relaxante. Meus dias de uma adolescente calma e pacata provavelmente estavam contados. Eu antes era apenas uma garota comum, com um nome estranho, um forte empenho em me superar nas matérias da escola e nenhum interesse em garotos. Agora eu era a revoltada, possível destruidora de namoros alheios e alvo crítico de um ódio fulminante por parte de garotas
invejosas. Eu estava ainda no centro da disputa entre dois garotos lindos e superpopulares na escola. E, definitivamente, definitivamente agora, estava altamente ligada em garotos. Não no plural. Garoto. Um apenas. Um punk com cara de roqueiro, pinta de rebelde, mas um atleta focado e aluno aplicado. Thomas Reynard havia acabado de quebrar inúmeros paradigmas na minha vida. Eu estava muito ferrada. Mas muito ferrada mesmo.

Thomas

Mike se manteve calado no carro. Por um tempo. Seria pedir demais que ele mantivesse aquele comportamento passivo todo o tempo. - E aí? - Despreocupadamente, mexeu no som do carro, fingindo que estava apenas sondando as estações. Eu sabia que ele estava sondando era o terreno da fofoca. - E aí o quê? - Fingir-me de desentendido era a melhor saída. Não que funcionasse sempre. - Qual é, Thomas? Abre logo essa boca aí e conta qual é a sua com a garota novata. - Ela tem um nome, Mike. - Um muito legal, por sinal. Inclusive a irmã mais nova também é uma graça. Porque vou te falar: as duas são gostosas pra caralho! Olhei enviesado para ele, fazendo uma carranca, mostrando claramente não ter gostado do comentário. Tentei manter silêncio, fazendo com que ele captasse a deixa. - Thomas. Conheço você desde o jardim de infância, bro. Nem adianta ficar calado, porra. Eu sei que está caidinho pela Rainbooooow. - O idiota fez questão de perturbar na fonética do nome dela. Dei um soco forte o suficiente para fazê-lo gemer de dor. - Me deixe em paz.- Ah, qual é, Thow... Revirei os olhos, porque somente Mike me chamava daquele jeito e continuava vivo. - Eu apenas... estou ficando amigo dela. Só isso. Quem eu queria enganar? Provavelmente o Mike. Eu mesmo é que não era. Eu não queria somente a amizade de Rainbow Walker. Queria tudo dela. Queria entender aquela mente complicada. Queria absorver aquele sorriso raro que ela dava para os irmãos quando ninguém percebia. Eu queria admirar sua inteligência e, obviamente, queria degustar aqueles lábios generosos e bem delineados, macios e perfeitos para serem beijados.Sacudi a cabeça, tentando afastar os pensamentos impuros dali. Mike poderia ser capaz de captar alguma vibração e eu seria zoado pelo resto dos meus dias. Uma coisa eu poderia afirmar com toda a certeza: aquela noite eu dormiria com um sorriso estúpido no rosto. E esperava que Rainbow também tivesse ficado tão mexida quanto eu, e sonhasse a noite inteira comigo e com as possibilidades que os trabalhos em duplas poderiam nos proporcionar de agora em diante.

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