Nos dois dias seguintes àquele beijo, não tive notícias de Thomas. Ou ele estava me evitando ou estava me evitando. O projeto de Biologia deveria ser entregue na sexta-feira, ou seja, no dia seguinte, e honestamente não vi nenhum sinal dele pela escola. Na tentativa de evitar apertar o F5 mental e acionar uma atualização das fofocas através de Becca, preferi me abster e ficar mais calada do que o usual. Nem mesmo as piadinhas da turma de Tiffany conseguiram mexer comigo naqueles dois dias. Thomas realmente não apareceu na escola, porque algumas matérias nós fazíamos juntos e simplesmente não era possível que a presença dele passasse despercebida na sala. Eu estava concentrada em morder meu canudo e não pensar em Thomas, ou na sua ausência, quando uma lufada de ar indicou que minha muito sutil amiga sentou-se no banco. - Acabei de saber de uma fofoca superquente - Rebecca falou enquanto ajeitava a bandeja do almoço ao meu lado no refeitório.- É mesmo? - eu disse enquanto sugava pelo canudinho um pouco do meu suco de laranja. - Thomas está com visita em casa. Uma prima de Nova York, que é modelo, resolveu passar alguns dias aqui. Quando ela falou aquilo, o suco que estava descendo por minha garganta tomou outro rumo que não o esôfago. O infeliz pegou o trajeto da minha traqueia, fazendo com que eu me engasgasse brutalmente e precisasse de Becca para dar uns tapas nas minhas costas. - Porra! De repente você ficou meio azul, Rain! - ela falou afobada enquanto ainda descia umas porradas em mim. Ergui os braços tentando mostrar que ela poderia interromper a sessão espancamento, pois eu já respirava sozinha, obrigada. - O que houve? - Engasguei. - Era o máximo de informação que eu lhe daria. Nunca admitiria que a informação transmitida por ela havia feito aquele estrago. - Uau. Você me assustou, garota. - Desculpa. - Certo. Então, onde eu estava mesmo? Senti a pontada da dor de cabeça iniciando seu desfile logo atrás dos meus olhos. - Thomas e a prima. - Foi difícil falar como se aquilo não me afetasse. Okay. Esclareçamos algumas coisas. Eu nunca fui ligada em garotos. Quero dizer, já disse isso, e não é porque eu me ligava em garotas, de jeito nenhum. Era mais pelo fato de que eu não tinha tido esse despertar hormonal. Ainda. Até Thomas Reynard. Ele havia me dado um beijo de queimar fusíveis e simplesmente vazou. Sumiu. Por dois dias inteiros nem sequer o vi. Meu coração palpitava loucamente quando a porta da sala se abria,ou quando meu celular apitava. Embora eu tenha me lembrado, tardiamente, de que nunca havia sequer fornecido meu número de celular ou pegado o dele. Mas claro que em meu peito ainda ardia aquela esperança de que, da mesma forma que ele soube onde eu morava, poderia escavar a informação e conseguir meu número. Se ele quisesse. O que, aparentemente, ele não quis. Fiquei aborrecida com essa onda de autocomiseração porque agora eu entendia o que as melosas canções de amor falavam. Minha vontade era me enfiar no meu quarto e ouvir Demi Lovato o dia inteiro. Talvez um pouco menos de drama pudesse fazer bem para o meu cérebro, mas enfim... aqueles dias estavam sendo difíceis. Logo em seguida, veio essa informação altamente desnecessária que simplesmente encheu minha cabeça com imagens, irritantemente gráficas, de uma megamodel, supergata, estilo Victoria's Secret, passando um tempo com ele, em casa. Sozinhos. Embora eu não soubesse se Thomas tinha família ou não. As imagens teimavam apenas em mostrar os dois juntos, suados... fazendo Deus sabe lá o quê. - Isso! Cybella. Este é o nome. E porra, ela é um espetáculo,Rainbow - Rebecca disse com total ignorância do meu estado calamitoso. - Uau! - Sim! Tipo... uau! Ela tem só dezoito anos e já fez fortuna no mundo da moda - Rebecca disse, agitando as mãos. - Dizem até que já namorou Justin Bieber. Torci o nariz porque, para mim, aquele ali não era um ponto a favor. - Ela costumava ser bem legal, mas depois... - Depois o quê? - Depois que ela e Thomas se separaram.Oi? Parem o mundo que eu quero descer porque esta porra está girando muito rápido. - Amiga, você está bem? Não vai engasgar de novo, não é? - ela perguntou preocupada. Okay. Vamos dar o benefício da dúvida para Rebecca por não compreender que está me destruindo por dentro, já que nunca contei absolutamente nada para ela. Mas também... contar o quê, precisamente? Foi tudo muito rápido. Paft. Puft. Oi, Becca. Eu e Thomas fizemos um trabalho juntos. Ah... ele me beijou também. E ah... eu meio que fiquei caída por ele... Não dava pra contar algo assim.- Não, não. Estou bem... foi apenas um resquício do suco que desceu para o lugar errado. Nós duas rimos da lembrança. - Então, ela e Thomas namoraram? - perguntei e quase me dei um Oscar pela atuação. - Namorar... namorar, nunca namoraram, mas estiveram juntos um tempo - Becca disse, quase sussurrando. - Thomas era louco por ela. Mas aparentemente ela era louca por ele e por vários outros também. Entendi a diretiva. A prima e modelo era uma puta. Opa. Aquele ali poderia ser meu lado cruel e invejoso falando. A prima era, então... voraz, se eu pudesse usar uma palavra branda. - Certo. Poxa, deve ser algo grande para que ele falte a dois dias de aulas. - Pois é. Todas as vezes que ela aparece aqui ela o monopoliza totalmente. A mãe de Thomas lambe o chão em que a garota anda. E até hoje acho que ela acalenta o sonho dela e Thomas se casarem e terem milhões de bebês lindos e famosos. - Becca continuava sua verborragia. - E famosos, eu digo por ela e por ele também, porque Thomas já recebeu uns cinco ou seis convites de várias universidades para que integre o time de futebol americano, com direito a bolsa integral e tudo mais. Uau! Thomas era especial assim. - Bem... - Pigarreei, tentando disfarçar meu mal-estar súbito. - Que... legal. - Ela foi estudante aqui. Então, quando aparece, é meio que uma celebridade, daí o diretor acaba liberando Thomas totalmente. Sem contar o fato de que o diretor é primo da mãe de Cybella. Fale em corporativismo e nepotismo estudantil. Se é que isso existia.Quando o sinal bateu para que voltássemos às duas últimas aulas do dia, eu estava em um estado lastimável de pura autocomiseração. O beijo, aquele que me despertara para a vida, tal como o do Príncipe azul faz à sua Branca de Neve, ou do Príncipe Phillip, à sua Bela Adormecida, havia sido totalmente esquecido. Na mente de Thomas, porque na minha ele estava bem vivo e com cores surreais. Era até uma imagem em 3D. Refletindo em meu cérebro sarcástico, eu poderia argumentar de imediato e me xingar mentalmente, alegando que estava agindo de maneira imbecil, tal qual as princesas referidas. Um beijo apenas e pluft! Caíam apaixonadas e já partiam para o felizes para sempre. Claro que, se formos observar os contos de fadas dessas donzelas, a felicidade só veio depois de muita merda e morte certa e, enfim, beijo narcoléptico em ambos os casos. Mas conto de fadas é conto de fadas e acabou a história. O importante é ter um final bem feliz. Encerrei as aulas do dia e segui para casa, com Sunny tagarelando algo sobre algum garoto que ela queria conhecer, que era do time, mas que Storm não queria apresentar de jeito nenhum.Em algum momento ouvi que era amigo do capitão do time, mas nem associei com o objeto dos meus pensamentos. Eu apenas ouvia, completamente absorta nas informações. - Rain? Não respondi de primeira porque achei que ela estava falando do tempo, tanto que olhei pelo para-brisa, em busca das gotas de chuva. - Rain! - Oi! - Saí do estupor e quase gritei. Se é que não gritei. - Em que planeta você está viajando? Estou falando há horas e você nem sequer prestou atenção em alguma palavra que eu disse. - Você não poderia estar falando há horas porque o trajeto da escola até em casa é de apenas dez minutos, Sunny - falei de maneira condescendente. - E se estivesse falando há horas, eu estaria completamente morta agora. Ela me deu um leve soco no braço. - Estou dizendo que vai haver uma festa amanhã à noite na casa do quarterback, aquele seu amigo ultragato - ela disse. Meu cérebro processou a informação, mas não emiti nenhuma opinião.- Parece que uma prima dele superfamosa está aí e quer rever algumas pessoas. Que interessante... Fiquei quieta, e quando chegamos em casa consegui fugir totalmente de Sunshine. Storm estava malhando os bíceps em desenvolvimento no meio da sala, enquanto assistia a alguma merda de seriado na TV. - Onde estão nossos pais? - perguntei. - Saíram. Ultimamente, esses dois estavam saindo demais. Alguma coisa estava estranha ali. Jantares, reuniões. Algo estava meio fora do lugar, mas eu não poderia afirmar o que era. Na verdade, esse não era o modus operandi deles quando estávamos em uma nova cidade. Normalmente, nossos pais ficavam em casa, curtindo a natureza, ou simplesmente buscavam um contato com o universo astral. Enfim... O Universo estava conspirando contra mim. Minha vida era supertranquila. Agora estava uma bagunça. Peguei alguma coisa para comer na cozinha e subi para o quarto. Eu já podia ouvir Sunshine cantando desafinadamente no banheiro e apenas sacudi a cabeça com suas escolhas musicais. Eu conseguia visualizar perfeitamente a louca tentando fazer a coreografia da música Toxic, de Britney Spears... e aquela era uma visão do inferno se você parasse pra pensar que Sunny devia estar completamente pelada e cheia de espuma. Iiiurc. Enquanto comia meu sanduíche, peguei alguns exercícios da escola para fazer. Ou para, ao menos, fazer algo e esquecer a confusão em que estava a minha cabeça. Meu celular vibrou naquele momento. Quando li a mensagem, o sanduíche, que estava a poucos centímetros da boca, parou completamente. Preciso falar com você. Thomas. Pensei no recado por um momento. Então, ele realmente dera um jeito de conseguir meu número. Eu não estava errada. O que significava que se ele quisesse ter falado comigo antes teria conseguido. Pensei no que responder. Não queria demonstrar meu lado cadela ciumenta e possessiva, então respirei fundo. Fiquei indecisa por dois segundos, roí um pequeno pedaço da unha e digitei: Sobre o trabalho de amanhã? Dois segundos se passaram e vi o cursor no whatsapp mostrar que ele estava digitando. Também. Olhei para o teto pensando em algo espirituoso. Pode falar então. Não por celular. Então, nos vemos amanhã antes da aula.Preciso falar com você hoje. Meu lado cadela estava entrando em ação. Eu queria perguntar: por que não ontem, ou anteontem? Esteve muito ocupado com sua prima famosa? Okay. Okay, posso ir aí? Tem certeza de que não pode ser por telefone? É só me ligar ou vice-versa... Não. Preciso que seja pessoalmente. Mordi o lábio inferior porque não sabia o que dizer. Eu não estava contando com um encontro repentino. Posso te pegar para comer um sanduíche? Oi? Já passava das seis da tarde. Okay. Estarei aí em cinco minutos. Que merda era essa? Ele morava perto ou já estava nas imediações? Tirei a roupa do dia inteiro da escola e percebi que não teria tempo para uma ducha rápida, já que Sunny ainda se esgoelava no banheiro. Droga. Coloquei um suéter bege comprido, que cobria bem minha derriére apertada em uma calça jeans gasta. Larguei meus tênis e calcei uma sapatilha confortável. Os cabelos estavam uma zona,então o máximo que eu poderia fazer era desmanchar a trança e prendê-los em um coque no alto da cabeça. Nenhum batom e nada de perfume porque eu não queria dar a impressão de que tinha me esmerado para isso. A buzina soou do lado de fora e desci correndo antes que Sunny quisesse saber quem era. Mesmo no banheiro, aqueles ouvidos eram capazes de captar tudo. Storm continuava seu treino intenso, embora eu tivesse certeza de que ele estava mais então o máximo que eu poderia fazer era desmanchar a trança e prendê-los em um coque no alto da cabeça. Nenhum batom e nada de perfume porque eu não queria dar a impressão de que tinha me esmerado para isso. A buzina soou do lado de fora e desci correndo antes que Sunny quisesse saber quem era. Mesmo no banheiro, aqueles ouvidos eram capazes de captar tudo. Storm continuava seu treino intenso, embora eu tivesse certeza de que ele estava mais focado nos seios das mulheres que estavam na TV. - Vou dar uma saída e já volto. - Fez o dever? - ele perguntou sem nem tirar a cara da TV. - Vá à merda, Storm - disse e saí rindo. Quando cheguei ao carro de Thomas, ele já me esperava com a porta aberta. Como um gentil cavalheiro. Ele deu a volta e entrou do seu lado, colocando o carro em marcha. Nenhum de nós dois falou por alguns minutos. Ou assim pareceu. - Você está bonita. Senti meu rosto esquentar. - Obrigada. Eu podia ver que ele apertava as mãos no volante e estava um pouco tenso. - Ahhh... Rain? Sim. Agora eu estava atenta e sabia que ele não estava falando sobre a possibilidade de uma chuva por ali. - Sim? Ele passou uma das mãos pelos cabelos, desalinhando-os de uma maneira que só ele conseguia fazer e ainda assim parecer sexy. Como o carro estava silencioso, sem ao menos uma canção para quebrar o clima, senti a tensão e poderia jurar que, se tivesse uma faca, eu poderia cortá-la ali. - Preciso de um favor seu. Uau. Eu nem podia imaginar o que ele queria comigo, mas um favor não era algo que eu realmente pensasse que ele precisasse. - Sério? - Cruzei os braços e ergui minhas sobrancelhas indagativamente. - Sim. - Thomas olhou de lado para mim. Uns segundos a mais de silêncio tenso. - Veja bem, minha prima Cybella está na cidade... Oh... e lá temos a Cybella estreando na minha passarela mental de novo. - Hum? - Fiz-me de desentendida. Ele não precisava saber que eu já havia recebido o boletim informativo de quem era a garota. - Uma prima minha, de NY, está aqui na cidade por alguns dias e... - Ele estava procurando uma alternativa para falar. - Preciso muito que você me ajude com uma coisa. - Uma coisa? O carro parou na frente de um TGI Fridays. Thomas abriu a porta e desceu. Em seguida veio abrir a minha porta, estendendo a mão para me ajudar a sair do carro. Ele continuou segurando minha mão, por mais que eu tenha feito um esforço para soltá-la de seu agarre, e entramos na lanchonete. Acabamos atraindo alguns olhares dos frequentadores que estavam ali, mas resolvi ignorar e seguir para o lugar aonde ele me levava. Thomas escolheu um canto e nos sentamos ali, ainda em um silêncio estranho. Ele queria um favor. Tinha algo a ver com a prima dele. E eu não poderia supor o que poderia fazer naquela equação estranha. A garçonete chegou e nos estendeu o cardápio. Thomas o olhou. Ele pediu automaticamente um sanduíche qualquer e me perguntou o que eu queria. - Eu já comi, obrigada. - Mas pelo menos beba alguma coisa - ele implorou. - Okay. Poderia ser uma limonada, por favor? - pedi educadamente à garçonete. Quando ela saiu de perto, Thomas aproximou o corpo do meu e olhou no fundo dos meus olhos. Aqueles olhos verdes eram hipnotizantes. Pisquei várias vezes para quebrar a magia que eles pareciam lançar. - Preciso da sua ajuda. - Isso eu já entendi. - Cruzei as mãos sobre a mesa. - Só não consigo entender como poderia te ajudar. Vi quando ele engoliu em seco e passou as mãos de novo pelos cabelos. - Minha prim... - Eu também já entendi essa parte, Thomas - falei, e dessa vez foi difícil disfarçar o tom irritado. - Okay. Vou falar de uma vez. - Fale. - Estou tentando, porra. - Com a boca suja você não vai conseguir nada. Thomas me deu um olhar sujo e eu apenas ri.
- Preciso que você seja minha namorada. Ele disse e, graças ao bom Deus, a garçonete ainda não havia trazido nossos pedidos, especialmente a bebida maldita que eu havia pedido. Porque penso que, se ele me pegasse desprevenida, tal qual Rebecca me pegara mais cedo na escola, o resultado do trajeto do líquido seria vergonhoso. - O... o... quê? - perguntei e ri sem graça. - Preciso que finja ser minha namorada enquanto Cybella estiver aqui - ele disse aquilo e me olhou intensamente.
Eu não sabia o que dizer. A garçonete chegou e agora eu estava grata por sua presença, já que poderia ganhar tempo em colocar os pensamentos em ordem novamente. - Olha, sei que isso é meio louco e sem noção, mas eu ficaria imensamente grato se me ajudasse. Bebi um gole da limonada, com bastante concentração para não engasgar. - Thomas, eu só não consigo entender a razão. Ele suspirou e mordeu seu sanduíche. Enquanto mastigava,pude ver que ele estava pensando sobre o que dizer. - Cybella e eu somos primos muito... chegados. Hummm, novo conceito de pegação entre primos. Primos chegados. - Sei. - Já tivemos algo há alguns anos. - Quantos anos você tem? - perguntei chocada. Porque se ele disse há alguns anos, eu estava imaginando jardim de infância e tal. Opa. Eu era a garota estranha. - Dezessete, quase dezoito. Por quê? - ele perguntou e deu um sorriso enviesado e consciente da razão da minha pergunta. - É que você disse há alguns anos. Minha cabeça foi mais longe. Desculpa. Mas a referência desses anos que ficaram para trás querem dizer o quê, mais precisamente? - Digo quando eu tinha quinze e perdemos a virgindade juntos. Pense na porra da limonada que estava descendo pelo buraco errado agora! Engasguei! Se eu tivesse mais um episódio daquele teria um sufocamento! Thomas bateu a mão suavemente nas minhas costas.- Muita informação, Thomas. Muita informação! Ele riu. - Você perguntou. - Eu não perguntei isso! - Meu tom era indignado. - Você estava especulando. Certo. Eu estava especulando. - Então... você e sua prima tiveram um lance, e daí? - E daí que Cybella sempre que vem aqui resolve que quer reavivar esse lance e eu não quero. Era fácil entender por que ela queria reavivar o tal lance. Thomas era meio que... lindo.- Você não pode simplesmente dizer não? - Você não entende, Rainbow. Ninguém diz não à Cybella. Oh! Fale de alguém que alcançou o nível máster de vaca no meu conceito. - Thomas, eu acho meio estranho que, no século em que estamos, você não consiga fugir de uma investida ou que uma garota não entenda um "não" como resposta. Thomas respirou fundo. - Você não entende. - Seu tom de voz era pesaroso.- Não. Não entendo, mas você poderia me explicar. Ainda mais porque eu sou a garota nova na cidade e não entendo realmente a dinâmica da comunidade de vocês. A cidade de Westwood, em Nova Jersey, fazia parte de um condado e agia muito como uma comunidade fechada. Era até meio assustador. Mais até do que as comunidades hippies dos meus pais. Ele recostou no seu próprio assento. - Cybella tem uma espécie de transtorno mental que a deixa altamente fora de si. Meus pais sempre cuidaram dela porque a mãe faleceu muito cedo e o pai a abandonou. Ela é um caso muito estranho de pessoa que conseguiu superar as próprias desgraças e subiu na vida. Eu não iria corrigir Thomas, alegando que aparentemente a garota não tinha superado suas desgraças, já que carregava um transtorno que estava muito associado à dificuldade de receber um "não" como resposta. - Ela é uma modelo famosa e sempre está em busca de algo diferente para fazer - ele disse. - Quando saiu da cidade, há três anos, Cy foi em busca dos sonhos que sempre teve e tal. Nós nem sequer tínhamos tido alguma coisa. Fomos meio que criados juntos. Eu prestava atenção à narrativa dele, tentando evitar as imagens dos dois nus brincando calmamente. Senti um refluxo com a mais remota visão mental da cena. Já sentiu um refluxo com limonada? É muito ácido e horrível. - Ela retornou um dia e ficamos juntos. Aquilo foi a glória para minha mãe, que sempre me quis casado com ela. Uau! Que mãe superprecoce.- Cybella surtou quando eu disse que não queria nada mais sério e foi embora. Somente duas semanas depois ficamos sabendo que ela havia tido um ataque de pânico e tal. O médico dela conversou com meus pais e ficou definido que todas as vezes que ela quisesse vir aqui deveríamos meio que... ficar ao dispor dela. Oi? Espera... volta a fita que não entendi. - Opa. Espera, inclusive sexualmente? - perguntei chocada. - Não assim explicitamente. A ideia original era que eu estivesse à disposição da minha prima para fazer absolutamente tudo o que ela quisesse. Ficou subentendido que eu deveria "agradar" minha prima e fazê-la feliz. - Isso não te faz uma espécie de... - Prostituto? - Eu ia dizer gigolô, mas você não recebe dinheiro por isso. Ele respirou e pude ver o brilho em seu olhar. Ele estava puto. - Eu nunca aceitei cumprir essa exigência, Rainbow. Mesmo que meus pais nunca verbalizassem isso. Exatamente porque não sou isso e nunca quis ser. Um objeto a ser usado ao bel-prazer da minha prima, só porque ela é uma famosa que não "pode" surtar colocando sua carreira em risco. Eu o admirei por assumir aquilo. - Falei para minha mãe que eu estava namorando uma garota e que não iria fazer nenhuma merda estúpida por conta de Cybella - ele disse e seu tom era esperançoso. - Da outra vez que ela esteve aqui, consegui dar um sumiço e passei alguns dias na casa de campo do Mike. Uau. Era estranho. Ele tinha de fugir de uma mulher desejada no mundo inteiro. - Por isso você sumiu por dois dias? - Quase bati na boca por ter deixado sair aquela pergunta. Ele deu um sorriso de puro conhecimento e me olhou com os olhos semicerrados. - Você sentiu minha falta, Rain? Quase dei-lhe um murro na boca. E, se eu pudesse, daria um murro em mim também. Como pude deixar escapar aquilo? - hhh... não, eu estava pensando no trabalho. - Aquele trabalho que já está feito? - Ele riu. - Confesse, Rain. Você sentiu minha falta loucamente... Eu tive de rir porque ele pareceu extremamente fofo naquele momento. E totalmente nada a ver, já que usou uma palavra muito sem noção para definir a intensidade dos meus sentimentos de saudade. Que pode ter sido até um pouco dolorida. - Você poderia ter ligado - eu disse em um sussurro. Ele pegou uma das minhas mãos e segurou de maneira suave. Seu olhar, porém, era intenso. - Sinto muito. - Thomas beijou meus dedos. - Eu não sabia o que fazer ou como reagir e, logo em seguida, Cybella chegou.Resolvi que era uma explicação plausível. E até mesmo porque ele não me devia satisfações. Fora apenas um beijo trocado. Não havia nenhuma espécie de acordo ou acerto sobre o que estávamos vivendo ou não. Tudo era muito recente. Meu Deus, fora apenas um beijo. Nem sequer me deixei abalar pela admissão de ele também ter sido afetado pelo acontecido. E eu também estava em um terreno completamente desconhecido, então não sabia o que os casais que trocavam afagos quentes, como os que trocamos, faziam logo em seguida.- Quis te ver no dia seguinte, Rain. Em cada minuto que passou. Tudo em que eu conseguia pensar era no sabor dos seus lábios nos meus. Uau. Aquilo foi inesperado. E tão quente que senti meu rosto queimar. Engoli em seco e afastei o copo de limonada de perto de mim enquanto pensava no que dizer, porque estava completamente sem fala naquele momento. Nossos olhares ficaram travados em um duelo silencioso, e ele sabia que o pouco que falou havia calado fundo no meu coração. E eu, honestamente? Não fazia a mínima ideia de como lidar com aquela situação nova para mim. Meu coração retumbava no peito como um tropel de cavalos selvagens. O que falar em uma situação desconhecida como aquela?
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Rainbow
أدب المراهقينRainbow" Walker sempre se sentiu diferente das garotas da sua idade. Com um nome peculiar e uma família estranha, ela nunca conseguiu estabelecer vínculos ou manter muitas amizades. Agora, em uma nova cidade, ela terá de se adaptar a uma nova escola...