Capítulo 6

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Quando cheguei em casa, muito mais tarde do que eu desejaria, depois da festa fatídica, subi diretamente ao meu quarto, ignorando o tagarelar constante de Sunny ao enaltecer as belezas dos jogadores da equipe de futebol e as performances fantásticas que Thomas Reynard apresentava quando jogava. Já era difícil ter de lidar com os sentimentos conturbados que eu estava começando a ter. Veja bem, sempre fui muito reclusa. Nunca gostei de festejar, sair para compras, participar de eventos com amigos e afins. Eu deixava esse comportamento socialmente aberto para Sunshine. Minha irmã poderia passar um dia inteiro no shopping e ainda voltar feliz e sorridente, como se aquele tivesse sido o melhor dia de sua vida. Sempre que dava, Sunny fazia companhia às amigas em momentos "garotas" e, todas as vezes, ela voltava tagarelando sobre as aventuras do dia. Sunny era boa nessas coisas. Conseguia fazer amizades rapidamente, se enturmar e ser convidada a todos os lugares do mundo. Resumindo, ela poderia ser considerada uma garota popular em seu ano escolar. Popular não como as malditas Abelhas Rainhas do Ensino Médio, as líderes de torcida adoravelmente requisitadas da escola. Popular mais de um jeito fofo e meigo, alguém que as pessoas gostavam de ter ao seu redor. Em alguns momentos eu invejava essa facilidade de se entregar às novas amizades. Para Sunny, era tão fácil quanto passar pasta de amendoim no pão. Para mim, era tipo um martírio, um momento de dor profunda e agrura mental. Buscar palavras para me comunicar socialmente com uma pessoa desconhecida era um trabalho hercúleo. Então, eu preferia me manter muito calada.Daí minha razão em estar sempre quietinha, no meu canto, tentando me misturar às paredes, fazendo-me passar por algo simples e comum, sem atrair atenção alguma. Eu odiava atrair atenção. Já disse isso? Odiava. Com todas as forças do meu ser. E, honestamente, nem sei dizer por que estou me referindo ao fato no verbo passado. Odiava. Eu deveria estar falando ODEIO. Porém, sinto que alguma coisa mudou dentro de mim, mas não consigo classificar bem a razão. Nestes últimos dias, percebi que minhas ações estão diferentes do meu modus operandi. Cedi à aproximação de Rebecca, e acho até que poderia considerá-la minha mais nova melhor amiga. Consegui até mesmo manter uma conversa com Thomas Reynard durante uma dança! E ainda com nossos corpos meio que grudados um no outro. Eu poderia jurar que uma moeda não conseguiria passar entre nós dois. A lembrança daquele momento fez meu rosto arder de embaraço. Joguei água fria, tentando acalmar meus nervos, e escovei os dentes, me preparando para dormir. Quando estava saindo do banheiro, Sunshine me aguardava no meu quarto, deitada refestelada na minha cama. Fechei a cara. Ela sabia que eu
odiava que deitasse e colocasse os pés na minha cama limpa, ainda mais se tivesse andado descalça. O que significava levar toda a sujeira do chão para os lençóis limpos. - Por que demorou no banheiro, Rain? Estava desenhando corações no vapor do espelho? - Sunshine sacudiu as sobrancelhas sugestivamente. Revirei os olhos revoltada com a ideia ridícula que ela plantou na minha mente. Como se eu fosse capaz de fazer aquilo. O fato de ter pensado rapidamente em Thomas não me levaria nunca a desenhar corações no espelho ou em qualquer outra superfície.- Vaza para o teu quarto, Sunny. - Amanhã é sábado, podemos dormir até mais tarde. - Amanhã é sábado, o último do mês. Lembra o que a mãe nos obriga a fazer? - perguntei, e ri quando ela enfiou o travesseiro no rosto abafando um grito. - Ah, nãããoooo... - Anda. Você vai precisar de suas forças para capinar o jardim e arejar a casa - ralhei. - Pelo menos não sou eu que vou ter que esfolar os dedos separando os incensos por essências... - ela falou e saltou da cama. - Vem cá... Sunny parou no batente da porta e olhou indagativamente da minha para a de Storm. - Por que Storm sempre fica com a parte boa? - E desde quando saudar o sol é algo bom? Fizemos um cumprimento de mãos, sabendo que Storm teria que levantar às cinco da manhã e ficar na posição de lótus até que o pai o mandasse sair. Se eu fosse dizer que bunda estaria mais privilegiada, eu diria que era a minha e de Sunny. Deitei na cama e resolvi refletir um pouco sobre a minha vida antes de sentir o sono me abater.Eu poderia ser considerada por muitos como uma pessoa chata. Entendo isso. Plenamente. E nem tiro a razão delas por essa primeira impressão. Embora eu não esteja muito ligada ao que as pessoas pensam ou deixam de pensar de mim. Nossos pais nos criaram de uma maneira alternativa e cheia de nuances que poderiam ser consideradas esquisitas para grande parte das pessoas. Se fôssemos comparar, então, com a vida dos adolescentes em geral, aí é que as diferenças seriam gritantes. Eu e meus irmãos fomos ensinados a detestar todo tipo de comida enlatada ou comercializada, e só fomos conhecer um McDonald's quando estávamos com treze anos e fomos a uma festinha de amigos. Eles quase surtaram quando descobriram que comemos um Big Mac. Se dependesse deles, seríamos vegetarianos ou veganos, mas, como eles mesmos dizem, a vida lhes foi "injusta" dando filhos rebeldes que nunca respeitaram os animais ou a natureza. Para algumas pessoas, a cultura e filosofia hippie era algo inexistente ou imaginário, tendo acontecido somente nos anos 1970. Para nós, os Walker, era algo bastante sólido e real. Meus pais viviam aquilo diariamente e acreditavam mesmo em cada pequena coisa de liberdade emocional e amor livre que eles apregoavam. Nessa onda, acabei ficando muito mais retraída do que eles poderiam supor. Até imagino que o sonho deles era que eu andasse com flores nos cabelos longos, saias arrastando no chão, chinelos ou sandálias rasteiras e um eterno ar de paz e amor no rosto. Eu não poderia ser mais diferente. E talvez fosse do jeito que eu sou exatamente por conta da expectativa que eles sempre depositaram em mim. Não por rebeldia ou algo assim. Mas mais por conta de querer ser alguém com uma identidade própria e forjada por mim mesma, e não pela imposição do que eles queriam. Eu não queria ser um espírito livre. Queria apenas ser eu. *** Na semana que se seguiu, tentei imprimir um ritmo diferente à minha vida. Eu acordava todas as manhãs, tomava um banho demorado e me arrumava como se o dia fosse ser belo e aprazível. Descia e tomava meu café da manhã na companhia dos meus pais e meus irmãos, e seguia com Sunshine para a escola. Storm sempre ia de bicicleta, dizendo que aquela era uma alternativa para malhar seus músculos das coxas e ficar sarado. Eu estava tentando desfazer a imagem de garota revoltada que Thomas fizera questão de esfregar na minha cara. Ou ao menos estava tentando mostrar que aquela era uma impressão errada. Não sei por quê, mas aquela afirmativa mexeu com meus brios. Eu gostava muito de ser sarcástica e irônica. Gostava de pensar que era bastante esperta para os quesitos da vida. Mas, a partir do momento que alguém apontava o dedo para mim e me classificava como uma vaca de marca maior, eu realmente ficava mexida.Rebecca estava me esperando na porta da sala de História e, pela sua cara, eu sabia que ela tinha algo para me contar. - Okay... Acho que você vai surtar, mas preciso que não surte - ela disse, agitando aquelas unhas negras enormes para mim. - Ceeeeerto. Por que eu surtaria, mas, devido ao seu pedido tão eloquente, não posso mais surtar? Estávamos nos sentando no fundo da classe, quando uma bolinha de papel acertou minha cabeça. Ouvi as risadinhas e, quando me virei para ver de onde tinha saído o ataque, encontrei o olhar de Tiffany e de sua gangue de macacas albinas. - Que merda é essa? - perguntei mais para mim mesma do que para as infratoras. - Era sobre isso que eu ia te falar - Rebecca disse. - Eu estava no refeitório mais cedo e ouvi o trio pateta falar que começariam uma campanha de difamação contra você. - Hummm... adoro bullying - ironizei. - Sempre me emociona como essas pessoas realmente não conseguem manter os olhares longe de mim, ou as línguas ferinas. - Então... o problema todo é por conta de línguas. Virei rapidamente para ela com cara de espanto. Rebecca me pegava muitas vezes de surpresa porque eu achava que ela conversava em códigos russos. - Oi? - Jason andou espalhando aos quatro cantos que quer pegar você de qualquer maneira e... hummm... enfiar a língua dele pela sua goela abaixo. Eu estava em choque. - O quê? - Que porra era aquela? Uma realidade alternativa do caralho? Se minha mãe estivesse ali, ela sentiria orgulho da minha liberdade de expressão... - Ele parece estar caidinho por você e aparentemente Tiffany ouviu isso do próprio, quando ele não quis mais enfiar a língua dentro da boca dela - Rebecca falava atropeladamente. - Cara! Para com essa imagem mental de línguas sendo enfiadas dentro de bocas, por favor! Rebecca teve o descaramento de rir. - Eu não tenho culpa se eles querem enf... Cobri a boca dela com minha mão livre. Aquilo estava se tornando um hábito. E mesmo a mordida que Rebecca sempre dava depois, me fazendo soltar sua matraca. - Iuurggg... que nojo! - Limpei a baba dela dos meus dedos. - Não cubra minha boca, irmã. Embora não seja na minha boca que a língua dele queira entrar, não aguento a sensação de tê-la obstruída. Rimos da imagem que Rebecca mesmo projetou. - Becca, que história é essa, pelo amor de Deus? - Eu estava em pânico. Ali estava eu, tentando ser uma pessoa melhor, e de repente aquilo. - Nem suporto esse Jason ou sou amiga dele. Ela esfregou as unhas em seu suéter. - Pois é, mas para o que ele quer fazer com você, querida, não há a necessidade de serem grandes amigos. Embora a imagem que Rebecca projetou em minha mente tenha me dado calafrios, ainda assim fiz questão de argumentar. - Para mim, há, sim! - Ah, para, Rainbow! - ela disse e fez uma bolinha de papel com uma folha rasgada. - Este colégio não via emoções assim há muito tempo! Que mal há em dar pão e circo aos pobres mortais? Eu ri porque Rebecca era louca assim. Ela arremessou a bolinha na cabeça de Tiffany, que se virou enfurecida. Quando mostrou o dedo médio à patricinha da sala, escondi meu riso atrás da mão. Naquele momento de comoção, Jason entrou na sala, e logo em seguida entrou Thomas. O segundo fez questão de dirigir-se ao mesmo local onde eu e Rebecca nos enfiamos e se sentou ao meu lado. Senti aquele arrepio desconhecido de excitação que sentia sempre que o via. Rebecca falou do lado oposto.- Há rumores de que não é apenas ele querendo enfiar... você sabe... - Ela gesticulou com a língua enquanto Thomas não olhava. - Língua, boca, mãos bobas e tudo o mais. Thomas ergueu a cabeça e olhou de uma para outra com especulação no olhar. - Do que vocês estão falando, senhoritas? - Nada. Senti o sangue gelar. Sacudi o rosto para Rebecca, fazendo o sinal universal para que não falasse nada. - Tudo, Thomas. Nossa garota novata aqui está arrebanhando corações e causando discórdias entre as meninas - ela falou e apontou com o lápis na direção das garotas encrenqueiras. Aparentemente, Rebecca não era dada a entender os sinais universais. Mas senti vontade de mostrar meu dedo médio. Esse sinal eu tenho certeza de que ela compreenderia. - O quê? - Ele olhou desconfiado para mim. - O que você anda aprontando? Senti meu rosto adquirir uma coloração esquisita. Eu poderia jurar que estava vermelho, mas, devido ao fato de eu estar sem ar, acredito que um tom de roxo estaria sobressaindo.- Ei... respire, garota! - Thomas disse e passou as mãos pelas minhas costas. Mesmo que eu tivesse voltado a respirar normalmente, ainda assim sua mão continuou fazendo círculos e enviando ondas de calor pelo resto do meu corpo. Por mais que eu tentasse evitar contato físico com as pessoas, constantemente, Thomas parecia não aceitar aquele limite. É claro que eu nunca havia externado claramente, mas minha linguagem corporal indicava isso às vezes. Quando as pessoas chegavam muito perto, eu tendia a me inclinar para os lados. Quando cotovelos se tocavam, eu me afastava. Quando as pessoas se sentavam muito próximo, eu puxava minha cadeira para mais distante. Porém, ao longo dos dias, desde aquela dança em que estivemos mais agarrados que duas peças de lego, por mais que eu evitasse um contato com Thomas, ele sempre fazia questão de "frequentar" meu espaço pessoal. Sempre que podia, colocava o braço sobre o encosto da minha cadeira e seus dedos resvalavam em meus ombros, furtivamente. Sua cadeira era sempre muito próxima da minha, então nossas pernas quase sempre estavam em contato, e várias vezes nossos -joelhos se conectavam em choques dolorosos. Nem assim Thomas se afastava. Quando minha trança ficava para trás, nas costas, eu podia sentir os dedos de Thomas brincando com a ponta dos meus cabelos. Ou seja, ele sempre encontrava uma maneira ou outra de vencer a barreira do "toque" espontâneo comigo. - Não sei o que está acontecendo - falei, sussurrando quando a professora entrou na sala. A Sra. Fortman gostava muito dos meus trabalhos. E ergueu o olhar exatamente para onde eu estava sentada.Oh, não, não, não. - Rainbow Walker? - ela chamou. Engoli uma golfada de ar antes de responder. - Sim, Sra. Fortman? Sabe aquele momento em que toda a sala fica em silêncio e você pode até mesmo ouvir o farfalhar dos tecidos? - Eu gostaria que você viesse aqui à frente da sala e lesse o trabalho simplesmente magnífico que escreveu sobre a Guerra Civil e a Batalha de Antietam. Oh, meu Deus. Eu ia vomitar. Ali. Na frente de todo mundo. Na frente dos meus algozes, da minha amiga louca, do garoto que estava me fazendo sentir borboletas selvagens no estômago desde o dia em que dançamos juntos. Vi pontos pretos dançando à frente dos meus olhos. - Ah, professora Fortman? - Thomas a chamou. - Sim, jovem Reynard? - ela falou com um sorriso. Aparentemente, ela também havia sido professora do pai de Thomas, pelo que Rebecca me contara em algum momento. Ela era tão antiga assim...- Rainbow está com uma infecção de garganta e não consegue ler o texto, posso ler por ela? Meu Deus. Agora, sim, era oficial. As borboletas eram mutantes e se transformaram em morcegos voadores dentro do meu estômago, com aquela oferta tão cavalheiresca de Thomas. Onde eu imaginaria que ele seria gentil assim? - Claro, meu querido. Venha aqui e leia para a turma - ela disse e, quando Thomas chegou até a frente, a Sra. Fortman entregou minha redação. - Eu gostaria tanto que meus outros alunos também fossem empenhados em pesquisar e elaborar textos tão lindos e bem escritos como Rainbow fez. Aqui não houve preguiça ou sequer o enfado que muitos de vocês sentem quando precisam fazer um trabalho de casa. Eu não tinha onde enfiar meu rosto, de tamanha vergonha. Era bom ser reconhecida como uma boa aluna? Claro. Mas não assim em público e em uma situação tão delicada quanto a que eu estava vivendo com alguns membros da turma. Cobri o rosto com as mãos na tentativa inglória de esconder a vergonha. Thomas estava lendo meu texto e eu podia sentir os olhares de outros colegas da turma. Alguns assovios podiam ser ouvidos, além do som de escárnio vindo das garotas maldosas da sala. Se eu tentava passar despercebida, a fofoca a respeito de Jason não permitiria; e agora com essa exibição pública da minha nerdice em nível hard, minha chance de ser apenas uma estudante qualquer naquela escola estava aniquilada. Fora o fato de que o quarterback badalado era o leitor do texto. Porra. Eu preferia mil vezes ser uma pária na sociedade do que receber aquele nível de exposição. Thomas terminou a leitura e recebeu aplausos. Quando se sentou ao meu lado novamente, bateu a mão suavemente na minha coxa e disse: - Você escreve bem pra caralho, Rain.- Obrigada, Thomas - agradeci, mas evitei seu olhar. Enquanto a aula prosseguia, eu apenas tentava sobreviver a mais aquele tormento. O padrão de infantilidade de Rebecca e Tiffany era elevado. As duas passaram a aula inteira trocando pequenos insultos e bolinhas de papel. Acredito que em um determinado momento cheguei a ver uma borracha voando na direção da cabeça loira de Tiffany. - Pare com isso, Becca! - pedi, tentando não surtar. - Ela vai acabar achando que fui eu! - Claro que ela é burra, mas não tanto a ponto de não enxergar que eu estou trabalhando como franca atiradora aqui, Rainbow. Por favor, me dê um crédito. - Deixe de criancice. Quanto mais fizer isso, mais ela vai nos infernizar. - A mim, não. A você - Rebecca disse e riu. - Eu nunca vou permitir que Tiffany me tire um segundo de pensamento sobre ela ou sei lá o quê. Thomas se virou na minha direção e piscou um olho. - Aprenda com ela, Rain - ele disse. - Becca é especialista em desprezar todos os insultos de Tiffany desde o jardim de infância.Oh. Uau. Então eles, tipo, estudavam juntos há séculos. Maravilhoso. Eu me perguntava por que Becca achava Jason o garoto mais cobiçado da escola, quando, na verdade, o alvo deveria ser Thomas, pelo posto que ocupava no time. Além do fato de ele ser lindo de doer as vistas. Pelas fofocas e atualizações da escola que ouvi, Jason sentia uma inveja doentia de Thomas, exatamente por ocupar o cargo que ele almejava no time. Desde sempre. A disputa era acirrada. Jason fez de seu objetivo de vida tentar se sobressair em relação a Thomas. Inclusive no quesito pegador. Eu me perguntava se Thomas também já havia tido alguma coisa com Tiffany. Eu precisava apertar aquela tecla F5 urgentemente. O período chegou ao fim e tentei sair rapidamente da sala de aula. Thomas segurou minha mão, pedindo que eu o esperasse. Ele estava conversando com outro cara, mas tudo o que eu pensava era em fugir. Tentei sutilmente sair do seu agarre, mas sua mão era de ferro. - Vou pegar uma carona com você hoje - falou simplesmente. - Hã? - Não entendi o que ele quis dizer com "carona". Não que eu fosse burra, nem nada. Mas minhas sinapses cerebrais estavam custando a funcionar devido ao choque momentâneo. - Preciso ir para o bairro em que você mora e pensei em pegar uma carona. Duas informações precisavam ser atualizadas imediatamente. Primeira: ele tinha carro, certo? Inclusive um muito bonito e vistoso Porsche. Segunda informação: como ele sabia em qual bairro eu morava? - Thomas? Ele me puxou, evitando que eu levasse um esbarrão de alguém no corredor e nossos corpos se grudaram mais ainda.Meu estômago se revirou em voltas olímpicas. Evitei olhá-lo nos olhos, tamanho o meu embaraço. - Hum? - Sua mão continuava segurando a minha, fazendo com que o rumo dos meus pensamentos ficasse um pouco perdido. - Como assim uma carona? - Ah, emprestei meu carro ao Mike. - Eu sabia que Mike era o melhor amigo de Thomas. - Certo. E... - Eu estava sentindo gotas de suor na testa. - Como você sabe em que bairro eu moro? Ele olhou para mim com cara de espanto. - Quando você vai aprender que certas informações são muito fáceis de serem obtidas, Rain? Eu detestava meu apelido. Mas ouvi-lo saindo da boca de Thomas parecia incrível. Achava até carinhoso e simpático. Segurei a vontade de revirar os olhos com minha estupidez em achar aquilo. - Okay. Saímos para o estacionamento e consegui evitar qualquer encontro desagradável com outras cobras peçonhentas da escola. Sunny vinha correndo em minha direção e, quando viu quem estava ao meu lado, praticamente estacou,derrapando na grama. - Ahhh... Rain... ahh... Acho que minha irmã havia perdido a habilidade da fala. Talvez ela tenha ficado chocada com o fato de que Thomas ainda mantinha a mão firmemente colada à minha. Era como se uma Superbonder estivesse nos mantendo grudados. Por mais que eu tentasse me desvencilhar, Thomas fazia questão de reforçar a pegada. - Sunny, você vem? Olhei indagativamente para Thomas, mostrando claramente que eu precisava do meu braço para buscar as chaves do carro na mochila. Somente assim ele me largou, e fiquei livre, saindo um pouco de seu alcance. - Ahhh, eu liguei pra mãe e tenho um trabalho de Ciências. Combinamos de fazer, eu e Tayllie, na biblioteca da escola. - Ela não conseguia desviar os olhos de Thomas, que estava entretido, mexendo no celular. - O que ele está fazendo aqui com você? - ela perguntou e, graças a Deus, em linguagem de códigos, assim eu não morri de vergonha pensando que ele poderia ter entendido. - Vou dar uma carona para ele - respondi do mesmo jeito.- Vocês sabem que consigo ler a língua de sinais, certo? - ele falou, rindo. O quê? Pooooorra... Seria pedir demais que o chão se abrisse naquele momento e me engolisse inteira? - É feio prestar atenção na conversa dos outros, Thomas - caçoei com o máximo de dignidade que consegui. - E é feio ficar fuxicando sobre uma pessoa que está exatamente aqui. Revirei os olhos e Sunny apenas riu. Despedimo-nos e Thomas entrou no meu pequeno possante. Para - Vocês sabem que consigo ler a língua de sinais, certo? - ele falou, rindo. O quê? Pooooorra... Seria pedir demais que o chão se abrisse naquele momento e me engolisse inteira? - É feio prestar atenção na conversa dos outros, Thomas - caçoei com o máximo de dignidade que consegui. - E é feio ficar fuxicando sobre uma pessoa que está exatamente aqui. Revirei os olhos e Sunny apenas riu. Despedimo-nos e Thomas entrou no meu pequeno possante. Para não dizer outra coisa, claro. - Então... - ele começou e passou a língua por dentro da bochecha. Como eu consegui ver, não me pergunte. Estava tensa e consciente da presença dele, só isso. - Quer dizer que você anda partindo corações na escola? Ainda bem que o sinal que estava ali à nossa frente era vermelho gritante, porque freei o carro com intensidade. - O quê? - Ah, qual é, Rain... Até parece que eu não saberia algo assim - ele disse e se remexeu no banco. - Jason Carson é um idiota, só para constar. - Eu já saquei isso, Thomas.- Ótimo. Assim ficamos combinados que você não pode cair na rede dele. - Como se fosse a coisa mais lógica do mundo, Thomas simplesmente soltou aquela frase. Levei uma buzinada porque o sinal abriu, mas meu choque me impediu de pisar no acelerador. - Thomas. - Eu estava buscando palavras brandas para aquele momento. - Gostaria de te informar que, mesmo que eu não seja burra e não vá cair na rede dele, como você mesmo afirmou, também não recebo ordens de ninguém e isso não é da sua conta.- Rain, só estou falando para o seu bem. - Eu sei disso, mas é um problema que é meu, não seu. Eu sabia que estava sendo teimosa, mas era difícil aguentar, calada, coisas daquele tipo. - É meu também. - Claro que não, você está louco? Eu podia ver que Thomas estava buscando explicações em algum lugar de sua mente. - Estamos no final do campeonato estadual. Qualquer coisa que tire o foco de algum jogador do meu time é, sim, da minha conta - ele afirmou categoricamente. Fiquei mais do que pasma. - Meu Deus! Quanta arrogância - falei baixinho. - Okay, Thomas. Onde você vai ficar mesmo? - Na sua casa. Graças a Deus, o sinal ficou vermelho novamente, compatibilizando com minha freada brusca. Acho que não estava mais apta a dirigir um veículo automotivo.

Thomas

Quando entrei na escola mais cedo naquele dia, fiquei perturbado com a onda de fofocas que rondavam o nome da Rainbow. Eu sabia de algumas que ouvi nos vestiários masculinos. No treino do dia anterior, escutei alguns dos amigos de Jason comentando que ele faria um movimento em relação à garota novata, e rolou até mesmo um bolão de apostas de quanto tempo ele levaria para agarrá-la atrás das arquibancadas no próximo jogo. Era senso comum que Jason deveria fazer algo público e embaraçoso, para que todos vissem e não tivessem dúvidas de que ele ganhara a aposta. Dizer que fiquei puto foi um eufemismo, já que quase esfreguei o chão do vestiário com o rosto de Donkie, um dos caras da defesa, quando ele se referiu a Rainbow em tons pejorativos. Garotos falam merdas quando estão juntos. Isso é fato. E falamos de mulheres. Isso é mais fato ainda. Comentamos sobre os atributos femininos e as possibilidades que cada garota pode oferecer para um acesso livre às segundas e terceiras bases. Eu só não entendia por que, quando falaram de Rainbow da forma que haviam falado, da mesma maneira que eu mesmo já havia feito tantas outras vezes com tantas outras garotas aleatórias, fiquei mais do que irritado. Jason não se aproximaria de
Rainbow se dependesse de mim. Estava me sentindo um pouco possessivo? Claro. Eu me asseguraria de que aquele merdinha não faria seu jogo cretino com aquela garota.Antes, precisava entender o que estava acontecendo com a minha própria cabeça, mas podia garantir de antemão: Rainbow Walker me atingiu como um trem desgovernado. Então, eu realmente precisava admitir que estava um pouco nervoso, sentado confinado naquele espaço minúsculo e compacto que ela chamava de carro.

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