Cap.34/ Casa Abandonada [Lara]

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Eu corri.
Droga, eu corri tanto...
Eu só não podia ficar lá.
Eu só não conseguia ficar lá!
Ouvi meu irmão me chamando.
Ignorei.
Eu não podia voltar atrás.
Ele ficaria tão decepcionado comigo...
Ele já estava.
Me escondi numa casa abandonada, mesmo tendo muito medo só de pensar em entrar nela.
Foi impulsivo.
Eu entrei e corri até o primeiro comodo que vi. Por acaso, era um quarto, me escondi atrás de um guarda-roupas velho e fiquei.
Chorei ali mesmo.
As lágrimas desciam quentes nas minhas bochechas e minha respiração estava muito acelerada.
E para completar, agora eu também estava com medo.
E eu quebrei o skate do meu irmão.
Ele deve estar muito triste.
Ah! Me sinto tão culpada!
Sou uma idiota.
Ele disse "Ei, Lara, cuida para mim, tá?" e foi beber água.
Ele confiou em mim!
E eu o decepcionei.
Sou uma péssima irmã.
Se desse para trocar com alguém, com certeza ele me trocaria.
Se bem que ninguém iria me querer, já que faço tudo errado.

Ouço um barulho.
Meu coração dispara.
Por que fui entrar nessa casa..., me lamento.
Aaaaa eu vou morrer!

Ouço outro barulho.
Dessa vez, ainda mais perto.
E têm alguém se aproximando.
Quero fechar os olhos, como se isso fosse me proteger.
Mas continuo com os olhos bem abertos.
Limpo as lágrimas do meu rosto, para parecer mais corajosa.
Não importa quem é, ou o quê, quero parecer corajosa. Talvez assim, vá embora.

- Lara? - meu irmão diz, me olhando. Não consigo dizer nada, apenas abaixo a cabeça. A coragem era só de mentira - Oh, Lara... Eu te procurei por todo canto... Você não tinha medo de entrar aqui? - continuo em silêncio - Por que você correu? Está tudo bem, eu não fiquei bravo com você...
- Ficou sim - murmuro
- Tá, eu fiquei, mas você é minha irmãzinha caçula, claro que você é mais importante. - ele diz, eu continuo quieta - Vem, sai daí, deve estar cheio de aranhas e coisas do tipo - nego com a cabeça. Não tenho medo de aranhas - Lara, vem, vamos sair dessa casa... Você não tem medo?

Continuo quieta.

- O quê quer para sair daí? - ele pergunta - Vai, me responde.
- Nada - murmuro novamente
- Eu sei por quê está aqui. Sei que acha que vou brigar com você e tal, mas eu não vou.
- Não é por isso
- É por quê, então?
- Você confiou em mim - fiz uma pausa curta - E eu decepcionei você
- Que isso, Lara... Era só um skate...
- Era o seu skate, você gostava dele!
- Está tudo bem, posso comprar um novo...

Fico o encarando, hesitante.
Ele estende a mão na minha direção. Hesito. Pego na mão dele e então estou em pé, ao lado dele.

Ele me abraça, meio agachado.

- Seu coração está todo acelerado... Não precisa ficar assim... - ele disse, ainda me abraçando. - E olha o seu rosto, todo vermelho de chorar... Poxa, Lara, por que têm que levar tudo tão a sério?
- Porque eu me importo - respondo baixinho
- Mas não precisa dar tanta importância à coisas assim, está tudo bem...

Não respondo.

Quando entramos na nossa casa, fui direto para meu quarto e deitei na cama.
Eu não queria lidar com o mundo, não naquele momento, não depois daquilo.
Eu ainda me sentia uma pessoa horrível.
E uma irmã horrível.
Aposto que ele me trocaria, se pudesse.

Fiquei lembrando do skate dele, descendo a rua sem mim e entrando embaixo do pneu daquele ônibus. Dobrando com o peso e então se quebrando ao meio. Me senti tão culpada com aquilo que nem tive vontade de chorar na hora, mesmo que estivesse jogada no chão, com meu joelho doendo e eu sabendo que estava machucado. Uma garota da minha rua, que gostava do meu irmão na época, foi correndo contar para ele. E, quando ele apareceu na porta de casa, eu só queria me desculpar mil vezes, mas minha única reação foi sair correndo.

À noite ele bateu na porta e entrou no meu quarto. Se aproximou. Eu já estava deitada, mesmo que ainda fosse muito cedo para logo eu dormir. Ele me olhou de um jeito mais paternal, do que nosso próprio pai geralmente se preocupa em fazer.

- Eu liguei para o pai, ele vai mandar dinheiro para eu comprar um skate novo. Legal, né? - meu irmão conta, com um sorrisinho leve, ainda me olhando. Me sinto ainda mais culpada por, agora, ele precisar comprar um skate novo
- Não se preocupa, não vou nem tocar nele - falo, decidida
- Mas eu só vou ganhar um skate novo por sua causa, Lara - ele diz, reconhecendo (?) - Claro que quero que você ande nele, também.
- Por que? Você já queria comprar um skate novo?
- Ah, eu estava esperando aquele quebrar, para pedir um novo. Mas... É, eu queria comprar um skate novo. Aquele já estava bem velho, você não acha?

Discordo com a cabeça, porque não acho que ele estava velho, só um pouco gasto e com alguns arranhões.
Meu irmão ri baixinho, mas para de sorrir logo.

- Ainda bem que o skate desceu sozinho, já pensou se você tivesse ido junto com ele? - o mano diz, levando em conta. Dou de ombros, porque eu nem tinha pensado nisso. - Você teria se machucado feio, Lara... - ele fala e se aproxima mais, me dá um beijo na franja torta que eu cortei no banheiro da escola. - Boa noite... - quase sussurrou

Então meu irmão sai do quarto e estou me sentindo um pouco menos culpada, porque pelo menos ele vai ganhar um skate novo, como ele disse que queria. Mas sei que ele gostava daquele e sei que ele vai sentir falta do skate antigo que, por minha causa, ele perdeu.

"Sinto muito, mano", penso sozinha e fecho meus olhos, tentando dormir.

No dia seguinte, meu irmão ainda percebendo minha apatia, na mesa da cozinha, disse:

- Lara, quando a Mandy me contou sobre o skate e o ônibus, fiquei mais preocupado com você do que com raiva por meu skate ter quebrado. - ele contou - Acredite, eu não dei a mínima para o skate. E sei que você machucou o joelho.

Continuei sem dizer nada por um instante.

- O pai vai mandar o dinheiro amanhã, que tal você me ajudar a escolher um skate com desenho legal? - ele sugere.
- Você não precisa de mim -murmuro, pensando que faço tudo errado
- Se estou te chamando para ir junto comigo... Então, vamos? Preciso de uma segunda opinião.

Demorei para aceitar, mas no dia seguinte nós fomos. Meu irmão acabou comprando um skate que tinha o desenho de um urso com olhos faiscantes que também andava de skate. Ele me deixou colar um dos adesivos do meu caderno, mesmo que fosse caderno de menina e adesivos de menina. E, com o canivete dele, ele escreveu o meu nome e o dele.

- Pronto, este skate é nosso, agora - ele disse, me olhando. Estamos sentados no chão, ele está com o skate no colo, com o desenho virado para cima - Mas você precisa me avisar quando for pegá-lo para andar, porque temos que tomar cuidado para ele não descer a rua, sozinho, de novo. Assinto com um sorrisinho, quase não acreditando.

Depois desse dia, só andei no skate do meu irmão quando ele estava por perto, o que acabou sendo ainda mais divertido do que andar sozinha. Mandy continuou por perto, sempre!, porque ela tinha uma queda por meu irmão; mas eu não tinha ciúmes dela, porque sabia que ele não gostava dela daquele jeito. Ela tinha a mesma idade que eu, era muito nova para ele, digamos assim. Então eu sabia que não tinha o risco de perdê-lo.

Mas, acontece, que não tinha o risco de eu perdê-lo para ela. De qualquer forma, acabei perdendo ele para outra garota. Da mesma idade do meu irmão e muito mais bonita que a Mandy e muito mais legal que eu. Daí ele foi embora e fiquei morando sozinha com minha irmã. E desde então...estou nessa, tentando não perder a cabeça e nem me esquecer das memórias boas que tive com ele.

As Negações De ChristopherOnde histórias criam vida. Descubra agora