Cap.52/ Quero que ela se toque, que perceba.

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Minha mãe passa o polegar sobre os próprios olhos, para remover as lágrimas dali. Percebo que ela também está um pouco abalada e encaro como se isso fosse novidade, porque é. Ainda estou imóvel, louco para sair correndo dali, mas sentindo-me quase que apavorado, paralisado no mesmo lugar, de frente para ela.

- Desculpa, de novo - ela diz com a voz meio rouca - Eu surtei. Culpa do seu pai, ou culpa minha, sei lá... - seu olhar fixo nos próprios sapatos enfim olharam para mim
- Tá - foi tudo o que eu disse, então tive um impulso de ir para o meu quarto. Ela segura na manga da minha camiseta, me fazendo ficar. Ela encara a estampa descascada da mesma, e então recomeça:

- Christopher... - faz uma pausa, ainda sem olhar diretamente para mim - Me desculpa. Sério. - a voz parecendo quase forçada
- Eu já sei - interrompo -, você vai me dizer que esta  é você agora, certo? - eu falo num tom amargo, porque embora eu não admita que me importo, ainda quero que ela saiba disso. Quero que ela se toque, que perceba.

Então os olhos dela se encontram com os meus, percebo as lágrimas a ponto de escorrer e a boca dela levemente aberta. Cerro meu maxilar.

- Larga minha camiseta - peço, sem olhar para ela. A mão deixa de segurar o tecido, é a minha deixa. Dou as costas e entro no meu quarto. Encosto a porta e reviro meu guarda-roupas, sem ter ideia do que usar para sair de casa, quando eu não quero sair de casa.

Quando termino de me arrumar, escovo meus dentes rápido e saio do banheiro, ignorando completamente meu cabelo despenteado.

Suspiro pesado, sentindo-me obrigado à sair de casa com o Paul, agora. Merda. Digamos que estou levemente irritado, não só por isso.

Enfio meu celular no bolso e saio do quarto, dando passos largos em direção à porta principal da casa.

- O que eu digo ao seu pai, quando ele chegar? - ela pergunta, nervosa. Ignoro.

Eu saio pela porta e me dirijo à entrada da casa do Paul. Toco a campainha e espero, levando ar até os meus pulmões, lentamente, e tentando aliviar a ansiedade que me pegou de jeito.

Minha garganta está fechada e por mais que eu tente, não consigo normalizar minha respiração. Sigo tentando.
Paul abre a porta e me olha com expectativa.

- Oi - ele diz. Dou um sorriso fraco, sem nem mostrar os dentes. - Vou pegar minha blusa - ele avisa e dá um passo para entrar, de novo, mas então se vira e olha para mim - Você deveria levar uma blusa, também - sugere, apontando para mim. Dou de ombros e desvio o olhar, dizendo a mim mesmo que não preciso voltar lá em casa, quando não suporto nem pensar nisso.

Paul entra na própria casa, deixando a porta da rua aberta, e volta em um segundo, trazendo sua blusa de moletom na mão.

- E então, vamos? - ele pergunta, sorrindo.
- Vamos... - murmuro

Caminhamos um pouco, então Paul parou próximo de uma parede com alguns buracos estratégicos e pichações. Ele foi colocando a ponta dos pés primeiro, para escalar o muro, então subiu no mesmo. Sentou-se em cima e sorriu.

- Lembra do lugar alto que eu tinha falado para você, naquele dia do hospital? - ele perguntou. Assenti. - Então, é por aqui.

Ele pulou para o outro lado e eu fiz o mesmo que ele, usando os buracos na parede para escalar o muro. Aterrissei em pé e o Paul ficou me olhando com uma mão na cintura.

- É, você conseguiu. - ele disse - Eu já esperava isso de você. Agora vamos - Paul girou nos tornozelos e seguimos.

Passamos por uma pista de skate quase vazia, com excessão de dois caras sentados em cima de uma rampa de 45°, bebendo uma garrafa de vinho barato. Paul acenou para eles, mas só um deles viu, o outro estava com a cabeça abaixada, mexendo no celular. Então o cara com o vinho acenou de volta e cutucou o outro, que levantou a cabeça para olhar. Reconheci de imediato. Stevie. Quase paro de andar e desisto da ideia. Fecho a cara, só conseguindo pensar que quero ir para casa e que não quero lidar com isso. Mal cheguei e já me arrependo de ter vindo.

As Negações De ChristopherOnde histórias criam vida. Descubra agora