— Tome um pouco de água, vai se sentir melhor — Verônica colocou em minhas mãos o copo e se sentou ao meu lado.
Havia voltado para minha mesinha. O ar era mais gelado desse lado do prédio, ao menos aliviaria o calor da vergonha e as manchas vermelhas que se formaram no meu rosto.
— Acho... — Limpei a garganta — ... que cortei a garganta.
Estava em uma manhã bem difícil. O gostosão, digo, o Senhor Marcelo associado com o vexame no supermercado, depois se engasgar com a droga de um pênis bem na frente de todos em seguida cuspir no sapato dele.
— Sempre tenho um anti-inflamatório na bolsa. Buscarei para você.
Ela saiu rápido.
Depois da vergonha, sai do refeitório tão vermelha quanto a calcinha que coloquei hoje para trabalhar. Longe dos olhos curiosos e do olhar dele, fiquei mais calma. Respirei fundo. Endireitei os ombros. Liguei o computador para começar o meu dia de trabalho.
Vamos lá, garota, não pense em mais nada além...
— Aqui o remédio. — Veronica me tirou do mantra, deixando na minha mesinha o remédio. Quando tomei, o telefone vibrou na bolsa. Olhei o que significava, então percebi ser Frank mandando mais uma mensagem.
"Duda, eu sei que ainda está muito chateada, mereço todas as palavras duras. Mas, por favor, vamos conversar. "
— É Frank?
— É. — A garganta ardeu um pouco.
— Às vezes, só conversar é bom.
Olhei para Verônica.
— Acabou. — Desliguei o celular pessoal e joguei na bolsa. — Frank é um vacilão.
Talita apareceu com o Senhor Marcelo. Limpei a garganta e ela coçou, então apertei. Quando eles se aproximaram, senti as paredes se fecharem e com a garganta se apertando o ar ao meu redor não entrou em meus pulmões.
Verônica se despediu rápido e sumiu.
— Eduarda — cantarolou Talita, com um humor que nunca vi ela esbanjar.
A cretina é o cão chupando jaca, mas perto do alto escalão da empresa, o chefe, ela fica uma coelhinha carinhosa.
— Lembra como encontrar a pasta que contém a lista das empresas que patrocinam a revista?
Não olhei para Marcelo, mas senti aquele calor que vem do olhar de alguém que te encara, analisa.
— Sim, claro. — Fiquei atenta, profissionalmente, atenta a Talita.
— Então, por gentileza...
Ela conhece o conceito da palavra gentileza? Pisquei totalmente sem acreditar. Não imaginava que ela conhecia gentileza!
— Você poderia abri-lo e realizar algumas atualizações? — Continuou ela, estendendo uma lista. — Aqui estão os dados para que coloque no sistema.
— Certo. — Peguei a lista. O senhor Marcelo? Caladão. Só observando. — Farei agora. — Me virei para sentar e começar o serviço, mas eis que...
A Sorte e eu não combinavam. Somos como água e óleo.
O meu copo, que ainda tinha água, caiu da mesa, quicou no chão e derramou toda a água no CPU do computador. Todos olhamos aquela desgraça acontecer em câmera lenta. Em um segundo, o computador desligou e uma fumaça cinza subiu colocando um cheiro horrível no ambiente.
— Meu Deus! — Resmungou Talita, colocando a mão na testa.
— Desculpa, gente. — Tentei limpar a bagunça, ressuscitar meu computador, reverter o desastre por conta do nervosismo. O mais importante: NÃO SER DEMITIDA!
— Eduarda. — Ele disse meu nome.
Senti uma coisa estranha se formar no meu estômago e expandir como calor por todo corpo. Meio que ignorei. Não dar para ficar fazendo fantasias e alimentar a carência com belezas e gentileza de um homem que deve pegar geral, ainda mais quando ele é seu chefe do trabalho em que você é colaborador e estar por um fio de ser desligada.
— Eu pago — disse rapidamente — Eu só... — Consegui papel, me ajoelhei para enxugar o chão também.
— Eduarda. — Escutei meu nome saindo da boca dele mais uma vez, depois uma mão grande estender-se ao meu lado.
Encarei aqueles dedos longos. Ele estava querendo ser gentil, mais uma vez em poucas horas do dia. Finalmente o segurei. Era tão quente, firme e para minha surpresa havia calos nela. Me ergui, ajustando a saia. Vermelha de vergonha e com muito calor, que estava associado ao homem do meu lado e todo o desastre ambulante que sou, fiquei ereta sobre meus saltos trêmulos.
Fica calma Eduarda. Fica calma! Por favor!
Ele estava me olhando de um jeito intimidador. Sei lá, como se gostasse de me olhar, ou, apenas, gostasse de olhar qualquer mulher que esteja vulnerável do seu lado.
— Chame um técnico do TI, Talita — ele ordenou com educação, mas sem deixar de me avaliar. Por fim, ele soltou a minha mão e continuou: — Alguém que realmente entenda analisara se não danificou tudo e o que pode ser salvo. — Sugeriu. Se virou para Talita. — Na sala de Ricardo ainda tem aquela mesinha extra?
— Sim, eu fico lá.
— Ótimo! Preciso que continue o trabalho de recolhimento de dados atualizados do custo de todos os setores da revista. Enquanto isso, Eduarda usa o computador da sua mesinha.
Depois das trapalhadas sequenciais, a última coisa que queria era ficar sozinha com Senhor Marcelo.
— Ah! Não se preocupe. — Talita sorriu. — Eduarda, chame o TI e passe em cada setor da revista recolhendo os organogramas, dados financeiros e tudo que for necessário para Marcelo para o detalhamento orçamentário e financeiro da revista — disse como se não aceitasse a ordem inicial recebida. — Cuido dos patrocinadores.
— Quero que você conduza isso Talita. — Marcelo foi bem categórico quando a ordem dada inicialmente.
Olhei para Talita e pude sentir cheiro de revolta com camadas grossas de pura mente vingativa. Ela vai me pegar de jeito depois, sei disso, conheço a peçonhenta com quem trabalho.
— Sim, me desculpe, resolverei isso agora mesmo.
Talita saiu sem muita pressa, deixando um olhar: Vou te comer viva sua garota amarela e gorda!
Marcelo se afastou, abriu a sala e entrou.
— Eduarda! — Chamou e eu fui.