DUDA
— É difícil acreditar que você tenha realmente me comparado com ela.
— Não lhe comparei com ela, por favor, Eduarda, não...
— Ah, não comparou? — Indaguei com ironia. — Mas tem um dossiê meu lá em cima que diz o contrário. — Apontei para o andar d suíte, sentindo-me uma idiota.
— Escute-me. — Tentou pegar minha mão, mas não deixei.
— Que você tem lá seus motivos de não querer nada sério com ninguém, tudo bem, é respeitável, mas ficar fuçando a minha vida! O que acha que sou? Uma caçadora de fortuna? Essas mulheres vazias que querem só uma oportunidade para se darem bem à custa dos outros?
— Eduarda, eu errei em procurar fazer o dossiê. — Tentou controlar a situação. Marcelo segurou em meus ombros e disse: — Me perdoe pelo tanto que lhe ofendi. Você tem uma família maravilhosa, você é maravilhosa.
— Mas...?
— Mas tem coisas que me deixaram assim... Não dei importância em tratar, mas também é a forma mais segura que encontrei de me defender. Quero pedir perdão por trazer esse lado meu até você. Fiz esse dossiê quando meu irmão disse que você tinha um namorado de dia e de noite você disse que não tinha. Acabei jogando-o por engano no meio dos documentos dessa casa.
Ele suspirou um pouco cansado. E nós estávamos bastante cansados. A empresa estava a todo o vapor com a chegada de Marcelo, a semana tinha sito exaustiva, embora a viagem tivesse sido empolgante, naquela hora sentíamos o cansaço em nossos ossos.
Eu estava cansada sentimentalmente. Tinha que admitir isso. E quando Marcelo apareceu, um homem inteligente, bonito e cheio de sedução, meu corpo não resistiu, isso era fato, cada parte de mim respondeu irresponsavelmente a esse homem. E ao observá-lo mais com cuidado, ele também estava no mesmo nível de tesão.
— Tenho problemas em confiar nas pessoas — explicou.
— Você acha que eu também não tenho? — Senti a garganta coçar. — Frank foi muito baixo comigo. Ele me traiu. — Vi a mandíbula dele se apertar. — Nosso namoro terminou recentemente me deixando algumas sequelas que abriram quando notei certos abusos levando relacionamento para um campo nada saudável. Foi meu primeiro namoro longo. — Minha voz ficou embargada. — Tenho apenas pouco mais de vinte e um anos e boa parte desse tempo passei estudando e me comportando para meus pais não ficarem decepcionados comigo. Deveria estar me preservando, mas eu não consigo... ficar longe de você.
— Não consigo parar de pensar em você também, de sentir meu corpo reagindo a você. — Ele encarou o mar. — Tive uma família de merda, pulei de lar em lar, muitos deles nada recomendáveis para uma criança. Tornei-me uma pessoa incrédula, mecânica e prática demais, incapaz de acreditar em matrimônio, em querer filhos... Sua família é perfeita, seus pais são ótimos... você é maravilhosa.
— Foi por isso que você me evitou esses últimos dias? — Senti a boca seca. — Por causa da minha família?
Era um absurdo escutar da minha boca, mas quando Marcelo assentiu, eu fiquei tonta. Eu o abracei, olhando nos olhos dele. Assim como todo mundo, ele tinha seus defeitos e qualidades, assim como eu, ele também dava suas mancadas, não era muito pontual – que verdades sejam ditas. Mas Marcelo, diante do último homem que me envolvi, merecia um voto de confiança, ainda que ele tivesse dificuldades.
— Eu vi minha mãe indo embora. — Marcelo parecia envergonhado. — Ouvi quando deu a entender que odiava seus filhos por deixarem ela presa dentro de casa, cansada e infeliz.
— Sinto muito. — Fiquei com ele colado em meu corpo. — Estive tão envolvida com você essas últimas semanas — expliquei. — Quando você ficou diferente eu pensei que...
— Que eu seria um canalha?
Meu coração disparou.
— Contei sobre minha família — ele continuou pegando minhas mãos novamente. Dessa vez eu deixei que seu calor passasse para mim. — Sobre minha última experiência amorosa. Resumi esclarecendo meus medos, a falta de sorte que tive na vida. — Profundamente ele me olhou, me apertou em seus braços e disse: — Mas, apesar de tudo, eu quero você. — Senti seu coração bater forte contra o meu. Seu olhar era baixo, cheio de medo e angústia. — E estou com medo desse querer. — Seus lábios tocaram os meus de um jeito tão doce. — Não sou um homem perfeito e você vai ver ainda tantos defeitos em mim — admitiu com compaixão. — Mas eu te quero tanto que a única coisa que preciso é acertar com você. — Ele beijou meus lábios, trazendo à tona todo aquele sentimento de euforia que eu adquiri na primeira vez que o vi. — Fugir um pouco da agitação da cidade grande, te levar para ser só minha em um lugar bacana, esquecer de todos enquanto lembramos apenas de nós.
— Você me coloca em cada montanha russa — reclamei. — Meu coração não aguenta tantas voltas. Primeiro sua frieza, depois seu silêncio, em seguida suas desconfianças, para logo depois suas histórias. — Comecei a sorrir de nervoso. — Eu quase tive uma parada cardíaca sentada nessa areia procurando uma passagem de volta sem ter um trocado para pagar.
— Eu vi na tela de seu celular pesquisa de passagens para o Brasil.
Envergonhada, eu me afastei dele sorrindo, peguei o celular e soprei a areia que estava na tela.
— Claro que primeiro eu estava com planos diabólicos de levar você para a cama — expliquei meu lado mal.
— Me levar para a cama? — Fez cara de indignado. — Que descarada.
— Sim — admiti com naturalidade —, depois de lhe dar uma canseira enorme, eu faria um bilhete de despedida, alegando que infelizmente precisaria partir sem retorno.
Ele avançou para me agarrar, tentei me desviar para esquerda, mas ele foi rápido e me agarrou de volta.
— Sobre a foda eu deixo — ele disse, olhando para minha boca. — Mas não quebra meu coração — olhou profundamente em meus olhos —, não faz isso comigo.
— Não vou fazer. Se não fizer comigo.
Depois que aleguei, ele me tomou um beijo que quebrou muitas das minhas barreiras sobre relacionamentos tão cedo com alguém, retomou parte da confiança e fez meu desejo aumentar.