Capítulo 20

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— Onde você mora Zoe?

Acho conveniente questionar quando já deixamos minha cunhada em sua casa, que não se localiza longe de onde estivemos.

— Precinct 41 no Bronx.

— É sério? — Pergunto preocupada.

— Sim. — É monossilábica em suas respostas.

— Você sabe que é um dos bairros mais perigosos de Nova York, certo? — Não que a big apple seja perigosa. Ela não é, mais esse bairro registra os maiores índices de furtos e outras coisas ilícitas.

— Eu já fui assaltada três vezes, então sim. Eu sei disso.

— Pelo amor de Deus garota! — Exclamo horrorizada. — Onde estão seus pais mesmo? — Indago.

— Filipinas. Eu vim de lá há dois anos para estudar e desde então não voltei.

— Está esse tempo todo sozinha? Fez amigos? — Questiono com o coração apertado.

— Eu não tenho ninguém aqui, a única pessoa que se importou de verdade comigo até agora foi você.

— E na faculdade, amigos? — tento outra vez.

— Só querem papo comigo quando precisam de ajuda, quando não, eles não se importam, ninguém se importa de verdade.

— Eu me importo e a partir de hoje você não vai mais estar sozinha.

Pego sua mão e aperto em um gesto reconfortante, seus olhos estão brilhantes e sei que pode voltar a chorar à qualquer momento.
Quando chegamos ao seu bairro ela me indica o restante do caminho e paro de frente à um prédio de três andares caindo aos pedaços ela desce e eu a sigo, travando o carro em seguida.

— Não vai embora agora? Pergunta quando me percebe em sua cola.

— Não, quero ver uma coisa e preciso usar o banheiro.

— Ok.

Ela sai na frente e eu vou seguindo a de perto um tanto horrorizada, a situação do edifício está muito pior por dentro do quê por fora.

Subimos dois lances de escada e paramos na primeira porta à esquerda, quando ela abre a porta e me da passagem eu entro ficando momentaneamente paralisada. Em sua sala as paredes estão mofadas e com a tinta descascada, não há nada além de um sofá velho e aparentemente desconfortável no meio do cômodo, saio andando sem sua permissão e paro em sua cozinha, onde há apenas uma pequena geladeira, um fogão de duas bocas e dois pequenos armários na parede, também à um tanque de lavar roupa e deduzo que nem mesmo lavanderia tem.

Quando volto-me encontro-a me encarando envergonhada, ela rapidamente baixa a cabeça.

— Você poderia por favor levantar a cabeça. — Eu peço extremamente exasperada. — Meu pai sempre disse-me para andar de cabeça erguida e que jamais a abaixasse, pois se eu não me impusesse, ninguém jamais me levaria à sério ou me respeitaria. — Seus olhos estão vidrados aos meus. — Você não é pior que ninguém, então não deixe alguém pensar isso de você, não se submeta a nada que venha lhe denegrir e humilhar, afinal de contas você será uma advogada, portanto tem o dever de deixar essa submissão de lado. Estamos entendidas?

— Sim. — Responde com os olhos brilhando.

— Como consegue viver assim? — Pergunto curiosa.

— É melhor que não ter onde viver, não tenho condições de me preocupar com conforto, então tendo um lugar para onde voltar depois de um dia de trabalho está ótimo.

— Do que seus pais vivem nas Filipinas?

— Meu pai é pescador e minha mãe dona de casa, tenho dois irmãos menores de 12 e 14 anos, eu mando dinheiro para eles, meu sonho era trazê-los para cá, mas meu pai jamais aceitaria sair de lá, por isso estou juntando dinheiro para comprar uma casa melhor para eles, eles não sabem é claro. — Diz e passa por mim. — Você aceita um café, chá, água ou qualquer outra coisa? — Indaga.

— Na verdade eu desejo levá-la comigo para casa comigo.

— Que casa? — Questiona com olhos assustados.

— A minha é claro.

— Você não pode querer levar uma estranha para sua casa. — rebate.

— Você por um acaso é assassina em série?

— NÃOO!!

Sua negação foi automática.

— É usuária de drogas, se prostitui, é traficante de coisas ilícitas?

— É claro que não. — Responde e se encolhe, cruzando os braços.

— Então não vejo motivos. Alguma coisa te prende à este lugar?

— Não,  é só que eu não me sentiria confortável. O que sua família iria pensar?

— Eu moro sozinha e minha mãe e meu pai provavelmente irão se orgulhar da educação que me deram, eles não iriam me julgar e nem te julgar, se é isso que lhe aflige.

— O que seus vizinhos irão dizer? Vão achar que temos um caso.

Eu fico em choque por alguns segundos e então explodo em uma gargalhada inevitável. Passo alguns minutos tentando me controlar enquanto lágrimas insistentes molham minhas bochechas, e as risadas insistem em não cessar, minha barriga dói e a respiração fica entrecortada.

Não acredito que ela pensa que sou lésbica! (Nada contra quem é).

— Eu não sou lésbica, se é isso que a incomoda. — Falo secando os olhos e tentando me recompor, mas quando lembro de sua fisionomia constrangida durante meu arroubo, fica um pouco difícil.

— E-e-eu n-não p-p-pensei i-isso de v-você.

Fala envergonhada e gaguejando.

— É claro que pensou. — Falo de maneira divertida, não querendo deixa-la mais embaraçada. — Não se preocupe, que não senti-me ofendida. — Vamos, junte suas coisas para sairmos desse lugar logo, eu quero, posso e vou ajudá-la menina.

Me aproximo alguns passos e surpreendendo a mesma, a puxo para meus braços onde a mantenho por algum tempo e sussurro em seu ouvido: não se preocupe, você não está mais sozinha.

Suas emoções são instantâneas as minhas palavras e ela cai em um choro convulsivo. Eu tento não chorar junto com ela, enquanto faço carinho em seus cabelos e em suas costas, um vaivém ritmado.

O que ela ainda não entende é que colocando-a ao meu lado, também estarei ne livrando de sentimentos conflitantes e inopoturnos que andam me assombrando.

Marcelo (Spin-off Tudo Culpa dos Croquis)Onde histórias criam vida. Descubra agora